Parecia uma terça-feira qualquer no Jardim Europa, um dos bairros mais caros de São Paulo, quando três homens partiram em disparada de um amplo sobrado da rua Alemanha, onde uma mansão chega a custar R$ 19 milhões.
Assim que pularam o muro nos fundos do terreno, deixaram para trás uma casa com pé direito alto, piscina e jardim. Atrás deles também ficaram 79 armas, incluindo espingardas e rifles, munição e três carros roubados. A cena acima é descrita por policiais militares que checaram a veracidade de um denúncia anônima no local.
Dois dos suspeitos conseguiram fugir. O terceiro, porém, acabou sendo preso.
Dentro da casa, além do arsenal e de uma espécie de oficina com carros roubados, estava José Rubens de Cordeiro Leite, um senhor de 69 anos.
Engenheiro civil formado pela Poli-USP, Leite assumiu ser o dono do arsenal –cuja notícia se espalhou rapidamente pela vizinhança.
“Ninguém imaginava que tinha isso lá dentro. O bairro é calmo, mas ficamos sabendo que alguns bandidos fugiram pelo telhado, então virou o assunto aqui”, disse Camila Cristini, 22, publicitária. A agência onde ela trabalha faz fundos com a casa.
Rodrigo Dozzi Calza, advogado de Leite, diz que os carros nada têm a ver com o engenheiro. Um Corolla, um Picasso e um Livina roubados encontrados pela polícia, afirma Calza, eram de responsabilidade de Guilherme Cordeiro Leite, 34, filho do engenheiro.
No quarto do rapaz foram encontradas porções de maconha e cocaína. Segundo a polícia, ele era um fugitivo.
Na “oficina” também foram encontradas diversas ferramentas usadas para adulterar a identificação de veículos, além de peças.
O engenheiro foi levado à delegacia e acabou autuado por posse ilegal de armas e é investigado por receptação.
“Ele diz ser colecionador, mas os documentos estão vencidos há dez anos”, diz o delegado do Valter Sérgio de Abreu, do 15º DP (Itaim Bibi).
Segundo a defesa, o engenheiro é aposentado e tem problemas de saúde que dificultam sua mobilidade, por isso guardava as armas em um cofre e não renovou as licenças.
“Ele apresentou as armas espontaneamente, junto com as notas fiscais e registros. Ele até declara no Imposto de Renda”, afirma o advogado.
O engenheiro passou uma noite na delegacia e outra na carceragem do 31º DP (Carrão), de onde saiu ontem à tarde. A Justiça concedeu sua liberdade após o pagamento de uma fiança de R$ 4.068.
O delegado diz que vai investigar se as armas foram usadas para roubar os carros.
Eurivandes Pereira, autuado por receptação qualificada, também vai responder ao processo em liberdade.
A polícia ainda procura Guilherme para esclarecer o caso. Ele chegou a ser preso em 2002, após a polícia encontrar um carro roubado na oficina que tinha junto com o irmão mais velho. Na Justiça, eles foram absolvidos no ano passado por falta de provas.
João Maradei, diretor executivo da Ame Jardins (associação dos moradores), diz que o caso “é de assustar”.
“As armas por si só já causam espanto, mas o fato do crime estar acontecendo lá dentro é muito grave.”
Ele diz acreditar que a denúncia tenha partido de vizinhos, já que a entidade incentiva os moradores e prestarem atenção em atitudes suspeitas. Desse modo, conta, foi descoberta uma rede ilegal de bingos na rua Atlântica