O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) vai apurar uma denúncia de que o vereador Igor Elson (PL), da Serra, na Grande Vitória, chamou LGBTs de “anormais” durante um discurso em um evento com apoiadores do Partido Liberal (PL) neste sábado (4), em um centro de eventos do município. Grupos defensores dos direitos LGBTs e consideraram a fala LGBTfóbica. O Conselho Estadual LGBT+ disse que estuda providências a serem tomadas sobre as falas do parlamentar. O vereador disse que foi mal interpretado.
“O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), informa que recebeu manifestação anônima em relação ao caso e a encaminhou para a Comissão de Direito à Diversidade Sexual e à Identidade de Gênero (CDDS) da instituição, para análise e adoção de providências”, disse em nota.
Em um vídeo registrado por um participante do “Café com o PL”, o vereador Igor Elson aparece dizendo que “[…] faz uma semana de evento favorecendo LGBTQIA+. Você não ouve se falar nada sobre família, sobre casamento, sobre criança, sobre nada. Querem empregar a trocar de valores. Querem empregar o que é normal, colocar como é anormal, e pegar o anormal e colocar como normal”.
Após aplausos dos participantes, o parlamentar continua:
“Mas enquanto nós estivermos vivos, nós estaremos firmes combatendo isso. Nós respeitamos a postura e o direito de cada um, agora potencializar aquilo que é anormal, infame, e que nós entendemos que traz prejuízo para a sociedade, o PL vai estar firme junto com vocês para combater essa ridicularidade [sic]”.
Ao g1, o parlamentar disse que a fala foi mal interpretada.
“100% nada contra os LGBTQIA+. Isso foi interpretado por uma máfia da oposição. Pessoas LGBTQIA+ já trabalharam comigo. Já tive familiares que são. Se eu concordo, é outra coisa. A fala foi voltada para a falta de equidade do prefeito em atender algumas entidades e outras não”, disse.
A reportagem questionou ainda que o trecho no qual o vereador diz “Querem empregar o que é normal, colocar como é anormal, e pegar o anormal e colocar como normal”, e o vereador disse tratava-se apenas à gestão do prefeito.
Nas imagens é possível ver ainda o senador Magno Malta (PL) .
Em nota, Magno Malta, que também é presidente do PL no Espírito Santo, disse que “o Partido Liberal (PL-ES) não é homofóbico, pois não apregoamos ódio a nenhum segmento, incluindo o LGBTQIA+”.
Com pronomes masculinos, o senador ainda cita uma já falecida correligionária do PL, uma mulher trans, que segundo Magno Malta era querida e respeitada.
“Mas destaco que o partido é conservador e defende valores cristãos. Em contrapartida, a opção sexual das pessoas é um problema delas. Existe uma regra para isso, a da boa convivência. Nós respeitamos e queremos ser respeitados, ninguém é criminoso por não aceitar a opção sexual de alguém. Ninguém pode colocar isso goela abaixo de um cristão. Agora, recentemente, nas minhas visitas à Penitenciária da Colmeia, em Brasília, vi alguns casais homossexuais e tratei todas com o mesmo respeito e com o mesmo carinho. Levei uma palavra de consolo sem qualquer tipo de discriminação. Por fim, quem está tentando tachar o vereador de homofóbico é para polemizar”, completou o senador.
Procurada, a Câmara da Serra não respondeu até a publicação desta reportagem.
Conselho LGBT estuda providências
O presidente do Conselho LGBT do Espírito Santo João Lucas Côrtes disse que a instituição estuda providências a serem tomadas em relação a fala do vereador.
“É uma fala LGBTfóbica, a partir do momento que há um ataque e uma agressão. Não é uma opinião chamar LGBT de anormais. Você imputar a gente como sendo transgressores ou como quem não vive o conceito de família, é uma agressão a nossa vida. É uma fala LGBTfóbica e que a gente está estudando as providências a tomar”, disse.
Cortês disse ainda que, nos últimos anos, cresceu o número de uniões estáveis entre pessoas LGBTQIA+.
“É triste ver que as representações sociais sobre gênero e sexualidade continuam a partir de um olhar totalmente preconceitusoso. É importante lembrar que pessoas gays, lésbicas, trans, casam, formam família, e estão em busca de ocupar lugares na sociedade independentes desta posição dele”, disse.
O g1 procurou o Ministério Público do Espirito Santo (MPES), mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Vereador teve fala criminosa, diz advogada
Para a advogada Roberta Goronsio, membra Conselho estadual LGBT+ do Espírito Santo e coordenadora da Aliança Nacional LGBT no estado, o parlamentar transgrediu a lei, já que a imunidade parlamentar é considerada apenas quando o posicionamento for dito na tribuna da Câmara de Vereadores, o que não foi o caso em questão.
“Trata-se então de uma fala criminosa e que, por se tratar de figura pública e representante do povo, vereador deveria considerar todo cidadão e cidadã independente da sua orientação sexual e identidade de gênero, pois constitucionalmente todes [sic] são aptos aos atos da vida civil e detentores dos direitos fornecidos pelo está e pelo município”, disse a advogada.
Goronsio explicou ainda que o Igor Elson produziu discurso de ódio e que o parlamentar pode responder por homofobia caso a denúncia seja aceita pelo Ministério Público.
“A homofobia pode ser conceituada como a aversão a grupos LGBTQIA+, compreendendo a não aceitação de certas pessoas a relação que vá ao contrário da cisheteronormatividade. Em 2019, o STF decidiu que a homofobia é um crime imprescritível e inafiançável”, explicou Roberta.
“Na decisão, o STF entendeu que se aplicava aos casos de homofobia e transfobia a lei do Racismo (Lei n 7.716/1989). O artigo 20 da lei em questão prevê pena de um a três anos de reclusão e multa para quem incorrer nessa conduta, qual seja praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito contra as pessoas LGBTQIA +”, detalhou a advogada.
A advogada lembrou ainda que a união de pessoas do mesmo sexo é um direito previsto na legislação civil.
“É garantido o casamento e união estável às pessoas LGBTQIA+, além de também estar prevista em resolução do Conselho Nacional de Justiça a retificação de nome e gênero no registro civil de pessoas que possuem identidade de gênero diversa àquela lhe dada no momento do nascimento”, disse.