“Ou comida na mesa, ou estudar. É complicado. É muito complicado”, diz a estudante Wydny Rayssa Silva Santos, de 17 anos. A estudante do 3º ano do Ensino Médio em uma escola da rede estadual de São Paulo não consegue mais assistir às aulas.
Durante o ano, ela conseguiu acompanhar as aulas online. Mas, desde a última quarta-feira (3), o retorno presencial é obrigatório. Como ela teve que começar a trabalhar para ajudar os pais, que ficaram desempregados durante a pandemia, não consegue voltar a frequentar a escola.
“Meu pai era autônomo. Ele era pessoa que trabalhava na rua, vendia bebida. Minha mãe vendia lingerie, só que ela parou porque o dinheiro não dava mais pra comprar e vender”, explica Rayssa.
Ela trabalha como garçonete em um restaurante na Zona Sul da capital paulista. Para iniciar o trajeto de dois ônibus mais uma curta caminhada até o trabalho, ela sai de casa às 10h30.
“Nesse horário eu estaria na escola, provavelmente teria acabado de terminar o intervalo e estaria indo pra minha quinta aula”, lembra a estudante.
Segundo a Secretaria Estadual de Educação, 85% dos alunos compareceram às aulas nesta primeira semana de retorno de todas as escolas estaduais sem a necessidade de distanciamento social — portanto, sem rodízio de alunos. O retorno presencial era obrigatório desde o dia 18 de outubro, mas como o distanciamento de 1 metro entre as carteiras ainda era necessário, apenas 24% das escolas tinha conseguido retornar sem o rodízio.
O estudante Pedro Henrique Gavioli, de 18 anos, também precisou trocar a escola por um trabalho em período integral. O estudante do 3º ano do Ensino Médio trabalha como vendedor em uma loja que vende açaí. Ele sai de casa às 9h e só chega de volta às 21h. “Com certeza se eu pudesse escolher voltar para a escola, eu realmente gostaria de voltar e acabar meus estudos do jeito de qualquer aluno normal”, diz ele.
O jovem é responsável por 70% da renda da família. Ele é o mais velho de três irmãos, e a mãe — que atuava como cabeleireira e sempre foi a única fonte de renda da casa — ficou desempregada durante a pandemia. “A gente hoje em dia não tem muita opção. Tem que ver o que é necessidade, o que é prioridade. E eu vejo hoje que o meu serviço é uma prioridade”, afirma Pedro.
Quando as aulas aconteciam de forma remota, tanto Pedro quanto Rayssa afirmam que conseguiam acompanhá-las em seus momentos de intervalo. “Nunca deixei de entregar um trabalho”, diz Pedro. Apesar de não conseguirem assistir às aulas presenciais, os dois estudantes se informam com colegas de classe e seguem entregando, de casa, as atividades propostas pelos professores, na esperança de conseguir concluir o ano letivo e terminarem o Ensino Médio ainda neste ano.
Apenas em alguns casos os alunos ainda estão liberados para continuar no ensino remoto: gestantes e puérperas, pessoas com comorbidades que não tenham completado o ciclo vacinal, e menores de 12 anos que pertencem a grupos de risco para a covid-19.
Pedro afirma que tentou conseguir o auxílio do programa Bolsa do Povo Educação, do Governo de São Paulo, mas que, nas três vezes em que entrou na plataforma, um aviso aparece informando que ele não se encontra no grupo preferencial para receber o auxílio.
“Mesmo que eu conseguisse e ficasse com a bolsa, eu ia optar por continuar no meu trabalho. O valor mensal da bolsa não é nem 20% do meu salário”, explica o estudante. O programa oferece até R$1 mil por ano letivo para estudantes da rede estadual inscritos no Cadastro Único (CadÚnico), nas linhas de pobreza e de extrema pobreza.
A Secretaria de Educação afirma que a rede estadual está fazendo o máximo possível para evitar a evasão escolar. Entre as ações, estão aulas de reforço presenciais que foram oferecidas em janeiro e em julho, e também o lançamento do programa Bolsa do Povo Educação.
A pasta também afirma que ainda não é possível relacionar os 15% de faltosos nesta semana, necessariamente, com evasão escolar. A frequência nos alunos na próxima semana deve dar uma medida mais exata da quantidade de estudantes que abandonaram as escolas.