O Tribunal de Justiça de São Paulo reduziu a pena de dois homens acusado de latrocínio (roubo seguido de morte) Eles mataram uma outra pessoa por desentendimento por pagamento de programa sexual.
Em 1ª instância, a Justiça de Votuporanga, que julgou parcialmente procedente a ação penal e condenou o réu Adenildo Torres da Silva a cumprir, em regime inicial fechado, 27 anos de reclusão e ao pagamento de 116 diasmulta, no piso legal; e o corréu Regivan Francisco dos Santos também a cumprir, em regime inicial fechado, 22 anos e 06 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 97 (noventa e sete) dias-multa, no piso legal.
Os acusados Adenildo Torres da Silva e Regivan Francisco dos Santos foram denunciados, porque, no dia 16 de setembro de 2012, por volta de 05 horas, no cruzamento da Avenida Sete com a Avenida José Martins Miravette, no 1º Distrito Industrial, na cidade e Comarca de Votuporanga, previamente ajustados, subtraíram, para si, os pertences relacionados a fls. 147, de propriedade da vítima Marcos Gustavo da Silva Costa, conhecido como “Vitória”. É dos autos, ainda, que durante a execução do roubo acima indicado, munidos de animus necandi, os acusados Regivan e Adenildo (este último agindo com emprego de meio cruel), desfiram diversos golpes de canivete contra o ofendido Marcos, causando-lhe a morte.
Na fase policial, o acusado Regivan mencionou que, juntamente com Adenildo (que é seu padrasto), convidou a vítima para um programa sexual. Assim, o ofendido ingressou no veículo conduzido por Adenildo e indicou o local para o qual deveriam seguir.
Durante o trajeto, contudo, se desentenderam em virtude do valor cobrado pelo programa – R$ 100,00 -, razão pela qual a vítima pegou um canivete da sua bolsa e começou a ameaçar Adenildo.
Por acreditar que o padrasto seria agredido, segurou o ofendido por trás, ocasião em que Adenildo apertou o pescoço até que ele desmaiasse. Em seguida, Adenildo jogou a vítima no chão e lhe desferiu golpes com o canivete, quando ela ainda estava deitada e desacordada. Feito isso, o padrasto retornou ao veículo, em poder da bolsa, canivete e peruca do ofendido, bem como de uma de suas orelhas. Conforme contou, permaneceram em poder de um telefone móvel, e também gastaram o pouco de dinheiro que havia no interior dessa bolsa.
Já em juízo afiançou que somente mais tarde notou que os pertences haviam caído no interior do carro. Entretanto, acrescentou que o canivete ainda estava fechado, quando Adenildo o retirou das mãos da vítima (cf. interrogatório de fls. 496/503). Adenildo, por sua vez, asseverou que realmente considerou alto o valor de R$ 100,00 solicitado pelo programa.
Esclareceu, ainda, que não possuía qualquer quantia naquela ocasião. Desse modo, Regivan seria o responsável pelo pagamento, mas não sabia quanto dinheiro ele tinha. Durante o desentendimento, empurrou o ofendido “com as mãos para fora do carro, ainda com a porta fechada” [sic], momento em que ele pegou um canivete do interior da bolsa. Por isso, Regivan segurou a mão em que a vítima empunhava a arma. Porém, no meio da confusão, foi atingido com dois chutes na barriga, enquanto Regivan levou um soco no rosto. Posteriormente, o ofendido caiu desacordado no interior do veículo, oportunidade em que desferiu golpes com canivete em sua garganta, pênis e orelha. De acordo com ele, a bolsa e demais pertences caíram no carro durante o desentendimento. Assim, deixou o aparelho de telefone celular em sua residência e dispensou a bolsa e a peruca depois. Também permaneceu com uma das orelhas da vítima, tendo-a colocado no interior de um litro com um pouco de vodka. Em juízo, aduziu que apenas pediu para que a vítima descesse do automóvel, já que discordaram sobre o valor cobrado pelo programa. Todavia, ela pegou um canivete e o atingiu no peito e na costela. Nesse momento, o coacusado Regivan a segurou pelas costas, oportunidade em que agarrou e cortou seu pescoço. Segundo falou, somente posteriormente notou que a bolsa e a peruca da vítima haviam caído no assoalho de seu veículo. Assim, procurou livrar-se desses bens “Sucede, no entanto, que a prova dos autos apurou a responsabilidade dos apelantes pelo crime a eles irrogados na denúncia. Com efeito, a testemunha Lucas Sérgio contou que a vítima costumava cobrar o valor de R$ 100,00 (cem reais) por um programa sexual e também usava um canivete para se defender.
Asseverou que o ofendido já havia feito outros programas naquele dia, inclusive com um cliente que possuía um automóvel picape. De acordo com essa testemunha, a vítima estava com a quantia de aproximadamente R$ 350,00 segurou esse numerário para usar cocaína. Feito isso, o ofendido guardou o dinheiro na bolsa, onde também havia “pinos” desse mesmo entorpecente. Esclareceu, ademais, que a vítima costumava trabalhar no período das 22 horas até 24 horas. Em seguida, frequentava o “forrozão” (provavelmente para usar drogas), e depois retornava para fazer outros programas, de modo que nunca foi embora sem dinheiro No mesmo sentido foi o testemunho de Paulo Sérgio, que confirmou que a vítima havia feito outros programas e estava com dinheiro por ocasião dos fatos. Outras testemunhas mencionaram que o ofendido não brigava com os clientes e também não era agressivo . Já o policial Eder Luís corroborou a ocorrência do crime, bem como o fato de que os colegas do ofendido mencionaram que ele havia ingressado em um veículo Del Rey, verde, para fazer um programa sexual com dois homens. Dessa maneira, após o monitoramento das câmeras de segurança existentes nas proximidades, conseguiu identificar o automóvel e os acusados. Conforme relatou, na residência dos réus foi apreendido o celular da vítima, tendo eles admitido que usaram o dinheiro que estava na bolsa do ofendido.
Adenildo falou, além disso, que no instante em que a vítima já se encontrava desmaiada, desferiu golpes na garganta, coxa, pênis, e depois cortou a sua orelha, que foi colocada no interior de uma garrafa de vodca De outra parte, nenhuma prova foi produzida pela Defesa de forma a demonstrar que a vítima iniciou a agressão naquele dia, tal como relatado pelos réus em juízo, não se podendo falar na excludente da legítima defesa (principalmente diante da evidente atrocidade com que agiram os apelantes), devendo ser ressaltado que não ficou comprovada a ocorrência de agressão injusta e anterior sofrida por eles, a fim de elidir a responsabilidade criminal deles. Ao contrário, restou bem evidenciado que o acusado Adenildo iniciou as agressões que se seguiram, já que esse próprio réu mencionou na fase investigativa que empurrou o ofendido “com as mãos para fora do carro, ainda com a porta fechada” [sic], ocasião em que ele pegou um canivete. Em seguida, o segurou pelo pescoço e, quando já estava desacordado, desferiu golpes com essa arma em sua garganta, pênis e orelha. Percebe-se, assim, que a prova dos autos apurou, de maneira segura, que os réus efetivamente foram os autores do grave crime que lhes foi irrogado na denúncia, de sorte que pretendiam praticar a subtração dos pertences do ofendido, o qual resultou no crime mais grave, já que munidos de animus necandi, executaram Marcos Gustavo da Silva Costa. As diversas circunstâncias deixam claro e confirmam bem que houve um crime de latrocínio consumado, na medida em que, além de os réus, ora apelantes, terem alegado que foi a primeira vez que realizariam programa sexual com um “travesti”, eles também possuem relação de parentesco (padrasto e enteado), o que, como bem argumentado pelo Magistrado de origem, afasta essa versão, já que é da experiência comum que padrasto e enteado não fazem programas juntos, muito menos com um “travesti”. Ademais, Adenildo sequer tinha qualquer quantia em seu poder naquela oportunidade, e também desconhecia a importância que Regivan trazia consigo, o que já não se mostra crível essa alegação. Além do mais, não seria plausível que a morte de alguém derive de mero desentendimento de programa sexual, em relação ao preço cobrado, e que, coincidentemente, os bens da vítima tenham desparecido após a prática do suposto homicídio, no qual o dolo é o de ceifar a vida alheia – e não o de também subtrair pertences de valor patrimonial. “De mais a mais, as contradições havidas entre as versões dos imputados que, em juízo, negaram o conhecimento de que a bolsa do ofendido havia caído no interior do automóvel, diversamente do aduzido por Regivan no distrito policial, quando asseverou que seu padrasto Adenildo retornou ao veículo em poder da bolsa do ofendido, que, segundo as testemunhas Lucas Sérgio e Paulo Sérgio, continha o valor de aproximadamente R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), comprovam o animus rem sibi habendi dos acusados e o vínculo existente entre eles para a prática da subtração violenta. Resta evidente, portanto, que os apelantes se reuniram para o fim de roubar e, assim, conseguir dinheiro de maneira fácil e inescrupulosa, e não apenas tirar a vida do ofendido Marcos – a quem, aliás, sequer conheciam -, para depois subtrair seus pertences, de modo que não há que se cogitar em desclassificação da conduta deles para homicídio seguido de furto. Finalmente, insta salientar, que, ainda que somente um dos agentes tenha produzido o resultado morte, todos respondem pelo delito previsto no artigo 157, § 3º, parte final, do Código Penal, porquanto vigente no ordenamento jurídico brasileiro a teoria unitária ou monista (artigo 29, caput, do Código Penal). A esse respeito já se pronunciou este Tribunal de Justiça: “De outra banda, nunca é demais lembrar, que, no caso de latrocínio, em concurso de agentes, ampla e majoritária jurisprudência assenta a responsabilidade de todos os corréus em face do resultado mais gravoso, independente do grau e natureza da atuação de cada um no evento” As penas dos réus merecem pequeno reparo.
Na primeira fase, as bases foram estabelecidas acima no mínimo, na fração de 1/8 (um oitavo), considerando-se a periculosidade e ousadia dos agentes, que se aproveitaram do fato de que a vítima trabalhava com prostituição, para então para atraí-la à local ermo para a prática da subtração, resultando numa pena para eles de 22 (vinte e dois) anos de reclusão e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, no piso legal (e não 97 diárias mínimas tal como calculado na origem), já que o aumento da pena pecuniária deve seguir a mesma proporção de aumento da pena corporal. Na segunda etapa, pela agravante prevista no artigo 61, inciso III, alínea “d” (meio cruel), do Código Penal, a pena do réu Adenildo foi aumentada em mais 1/5 (um quinto), eis que as fotos de fls. 164/204 revelam a atrocidade da ação desse corréu, que seguramente ocasionou, desnecessariamente, maior sofrimento à vítima, na medida em que esta foi degolada, teve a orelha esquerda cortada, e também apresentava ferimentos em seu órgão genital, ficando a pena, em definitivo, para ele, em 27 (vinte e sete) anos de reclusão e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, no piso legal. Já a pena do coacusado Regivan deve retornar ao patamar mínimo, na segunda fase, ante a sua menoridade relativa (cf. fls. 62 e artigo 65, inciso I, do Código Penal), resultando numa pena final para ele de 20 (vinte) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no piso legal, à míngua de outras modificadoras.
O regime prisional inicial fechado deve ser mantido, único cabível ao caso concreto, em razão do quantum das penas aplicadas. Ante o exposto, dá-se parcial provimento aos recursos a fim de reduzir a pena do réu Regivan para 20 (vinte) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no piso legal, e a pena pecuniária do coacusado Adenildo para 13 (treze) dias-multa, no patamar raso, mantida, quanto ao mais, asentença recorrida”, escreveu o acórdão.
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