O Supremo Tribunal Federal (STF) reiterou nesta quinta-feira (23) entendimento de que é constitucional a veiculação da remuneração de servidores públicos na internet. De maneira unânime, os ministros da corte consideraram ser legítimo o registro de nomes dos contratados pela administração pública e dos valores de salários, gratificações e demais benefícios por eles percebidos, inclusive com publicação nos sites dos respectivos órgãos.
A decisão servirá de jurisprudência para casos semelhantes e será imediatamente aplicada a 334 processos pendentes de julgamento no STF desde 2011. A decisão dos ministros acata recurso da Procuradoria do Estado de São Paulo contra liminar da Justiça paulista em favor de uma servidora pública. Ela queria impedir que viesse a público o valor de seus vencimentos e conseguiu, momentaneamente, excluir os dados do site De Olhos nas Contas, mantido pela Prefeitura de São Paulo.
Mesmo definida na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), a transparência em relação é constantemente fustigada por decisões judiciais em âmbito municipal, em que liminares são concedidas caso a caso para servidores que não aceitam a revelação de seus vencimentos. Foi este site que, na legislatura anterior (2011-2014), fez uma radiografia sobre excessos na remuneração de servidores e revelou que não só o Congresso, mas o Judiciário e outros setores da administração pública escondiam centenas de casos de pessoas recebendo muito acima do teto salarial do funcionalismo.
Nessa série de reportagens, o Congresso em Foco revelou, por exemplo, a lista de todos os supersalários do Senado, da Câmara, da magistratura nacional, e viu reações como a da Câmara, que se antecipou à divulgação dos dados e recorreu à Justiça para impedi-la. A repercussão das reportagens levou o Sindilegis, o sindicato dos servidores do Congresso e do Tribunal de Contas da União (TCU), a ameaçar o site com dezenas de ações judiciais – ofensiva em massa que, em caso de condenação, poderia significar a bancarrota: foram 50 ações individuais idênticas que totalizaram quase R$ 1 milhão em pedidos de indenização. A tentativa naufragou: a Justiça já rejeitou 48 desses processos e, com a decisão do STF, deve rejeitar os demais.
Os desdobramentos da série de reportagens levaram a uma verdadeira revolução de procedimentos acerca da remuneração no funcionalismo. A Câmara, por exemplo, e seus cerca de dois mil supersalários decidiu que passaria a divulgá-los a partir de 31 de julho de 2012. Mas a aparente observância à transparência no uso do dinheiro público foi relativizada: como o site também mostrou em outubro daquele ano, tanto aquela Casa quanto o Senado passaram a exigir a revelação de CPF para quem quisesse ter acesso às informações sobre os vencimentos dos seus servidores. A exigência afronta a própria Lei de Acesso à Informação, que garante a preservação da identidade dos que a ela recorram.
Amparado pela Constituição e pela legislação sobre transparência, este site também revelou que a Câmara pagou, indevidamente, R$ 2,58 bilhões a servidores entre 2006 e 2011, segundo levantamento do TCU. E viu que, com a devida publicidade dos fatos, instituições públicas se veem obrigadas a observar as regras de uso do bem público – o Senado, por exemplo, em novembro de 2013 anunciou o corte nos supersalários e, com isso, uma economia inicial de R$ 1,3 milhão.
Há cerca de três anos a questão da transparência sobre salários do funcionalismo começava a se resolver no Supremo. Em novembro de 2012, o então ex-presidente da corte, ministro Ayres Britto, baseou-se na Lei de Acesso para acatar pedido da Advocacia-Geral da União e determinar a divulgação dos contracheques no serviço público.