O Supremo Tribunal Federal (STF) alcançou maioria para declarar inconstitucional uma lei de Votorantim (SP) que proíbe o uso da linguagem neutra em escolas do município. A decisão gera precedentes importantes em relação à autonomia municipal para legislar sobre práticas pedagógicas.
O decano Gilmar Mendes, relator do caso, votou pela inconstitucionalidade da lei e foi seguido por ministros como Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Flávio Dino, Dias Toffoli e Edson Fachin. Segundo o entendimento da maioria, a legislação municipal interfere em aspectos educacionais que são de competência da União, como estabelecido pela Constituição Federal.
Por outro lado, o ministro Cristiano Zanin divergiu parcialmente, reconhecendo a nulidade do artigo 2º, mas considerando constitucionais os artigos 1º, 4º e 5º. Sua posição indica que, embora restrições quanto ao uso de linguagem neutra possam ser questionadas, a promoção da norma culta do português deve ser preservada.
A decisão decorre de uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) movida pela Aliança Nacional LGBTI+ e pela Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH). Ambas as entidades questionaram a Lei N.º 2.972, aprovada em Votorantim, que estabelece medidas para garantir que o ensino se baseie na norma culta, sem uso de novas flexões de gênero ou número.
A lei, de autoria do vereador Cirineu Barbosa (PL) e do ex-vereador Thiago Schiming (PSDB), foi promulgada em maio de 2023 e determinava que apenas as flexões de gênero masculino e feminino poderiam ser ensinadas. A proibição se estendia tanto a escolas públicas quanto a privadas, além de concursos públicos locais.
Essa não é a primeira vez que o STF suspende leis sobre linguagem neutra em municípios. Em junho, a Corte anulou leis similares em Águas Lindas de Goiás (GO) e Ibirité (MG). A posição dos ministros reflete um entendimento consolidado de que questões pedagógicas são de âmbito federal.
A linguagem neutra visa incluir expressões que não se restrinjam ao gênero masculino ou feminino. O linguista Luiz Carlos Schwindt, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, explica que a linguagem reflete crenças e estruturas sociais, e a neutralidade de gênero é uma tentativa de torná-la inclusiva.
Entre as estratégias estão o uso de símbolos como “x” ou “@” em vez de vogais nas palavras, aplicados principalmente na escrita. Segundo Schwindt, esses recursos visam atender a identidades não-binárias, mas são alvo de debates por seu impacto nas normas gramaticais.