sábado, 16 de novembro de 2024
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PSDB perde e deixa de governar SP pela 1ª vez em quase 30 anos

Pela primeira vez em 28 anos, o PSDB não governará São Paulo. Com o governador tucano Rodrigo Garcia fora da disputa pelo Palácio dos Bandeirantes no segundo turno, o partido…

Pela primeira vez em 28 anos, o PSDB não governará São Paulo. Com o governador tucano Rodrigo Garcia fora da disputa pelo Palácio dos Bandeirantes no segundo turno, o partido perde seu maior palanque eleitoral, reduz a projeção nacional e vislumbra um futuro incerto.

Rodrigo ficou em terceiro na eleição paulista, ficando atrás dos candidatos Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Fernando Haddad (PT), que continuam na disputa, a ser decidida no próximo dia 30.

“O PSDB acabou. Uma pena, viu? Porque eu fui uma das pessoas que estava lá desde o começo”, lamenta Pedro Tobias, um dos fundadores do PSDB, ex-deputado estadual por São Paulo (1999-2019) e ex-presidente estadual do partido, entre 2011 e 2013, e 2015 e 2019.

Hoje, Tobias é filiado ao PSB e afirma ter votado em Haddad: “A única chance do partido era o Rodrigo [Garcia], mas ele nunca foi do PSDB de verdade”, lamenta.

Neotucano. Durante a campanha, Rodrigo não fez palanque público com nenhum cacique histórico do PSDB. Ele, que era do Democratas, filiou-se ao partido em maio deste ano. A troca foi articulada pelo ex-governador João Doria (PSDB), de quem Rodrigo foi vice, e que ainda vislumbrava a chance de se candidatar à Presidência.

O apoio à reeleição de Rodrigo foi fator de peso para que um dos quadros mais antigos da sigla, Geraldo Alckmin, deixasse o partido e se juntasse ao PSB, onde acabou por ser vice na chapa presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu antigo adversário político.

A saída de Alckmin foi também o que levou Tobias a trocar de partido.

“Esse histórico de contestação ao Rodrigo dentro do PSDB e a aliança com o Doria, que é cheio de rixas dentro do partido, faz com que ele fique afastado dos quadros históricos”, observa Henrique Curi, cientista político que estuda o PSDB em seu doutorado.

Rodrigo chegou a crescer nas pesquisas após o início oficial da campanha, na segunda quinzena de agosto, mas foi deixado de lado em debates. Haddad e Tarcísio preferiram nacionalizar a disputa: os dois são apadrinhados por Lula e Jair Bolsonaro (PL), respectivamente.

“Não tem lugar para terceira via”, avalia Tobias. “Desde a última eleição, está tudo muito polarizado. Não adianta alguém tentar furar essa polarização entre PT e Bolsonaro.”

Voo solo. Rodrigo alegou diversas vezes que fazia campanha sozinho e que não contava com padrinhos políticos. A cutucada aos adversários foi rebatida: Haddad, mais de uma vez, mencionou as alianças de Rodrigo com Celso Pitta, Gilberto Kassab (PSD) e o próprio Doria.

Pitta é apontado como o pior prefeito de São Paulo. Doria foi rifado do PSDB. Kassab, que já fez dobradinhas com Rodrigo em eleições passadas é hoje um desafeto político.

Derrocada
O PSDB venceu sete eleições seguidas em SP. Mário Covas deu o pontapé inicial em 1994 (com dois mandatos), seguido por Alckmin, José Serra, Alckmin novamente (duas vezes) e, por fim, João Doria.

Desde a redemocratização, o PSDB sempre esteve no governo: nas eleições anteriores a Covas, Orestes Quércia e Luiz Antônio Fleury (ambos do MDB) foram eleitos com o apoio da sigla.

“Você não vê no país nenhum outro partido com tantas eleições em um estado de 1994 a 2018. E falamos do estado mais rico do país. É uma bandeira que o PSDB sempre trouxe consigo”, observa Curi.

Mas, em 2008, o partido sofreu com atritos entre Alckmin e Serra, que se desentenderam por causa de Kassab (então no Democratas), prefeito de São Paulo desde 2006 e candidato à reeleição.

Vice de Serra, ele assumiu o cargo quando o tucano foi disputar a Presidência. Alckmin perdeu as eleições municipais daquele ano. Parte dos vereadores paulistas, muitos alinhados com Serra, deram apoio a Kassab, o que levou a um racha interna na sigla.

Para Tobias, o problema veio oito anos depois: “Todo partido tem briga interna, mas o maior problema do PSDB foi chamar João Doria.”

Era Doria
Outsider. Em março de 2016, um apresentador de TV que não exercia cargo público venceu as prévias para disputar a Prefeitura de São Paulo, desbancando nomes tradicionais como Andrea Matarazzo e Ricardo Tripoli. Era João Doria, cujo nome era apoiado e defendido por Alckmin na ocasião.

A prévia teve troca de socos e tentativa de roubo de uma urna; há uma foto que tornou-se emblemática, na qual um apoiador de Doria aparece em meio a uma briga na rua sem as calças.

A vitória de Doria levou Matarazzo a sair do PSDB. Outros críticos dele também se desfiliaram ao longo dos anos. Ao fim de 2016, Doria ganhou força interna ao conquistar um feito inédito: vencer a eleição municipal no 1º turno.

Doria terminou o 1º ano como prefeito com alta rejeição. Não se dizia político, mas, sim, gestor, e protagonizou estratégias de marketing mal calculadas. Prometeu cumprir o mandato todo —o que não fez—, e já flertava com a ideia de presidenciável, desejo de Alckmin em 2018.

BolsoDoria. Com Alckmin escolhido o presidenciável tucano há quatro anos, Doria disputou o governo de São Paulo. No entanto, o ex-prefeito evitou fazer palanque com o padrinho político e escorou-se em Bolsonaro, lançando o voto “BolsoDoria”.

Alckmin obteve o pior resultado de um tucano nas eleições presidenciais, com cerca de 5% dos votos, e Doria foi eleito no 2º turno após vitória apertada contra Márcio França (PSB).

“Doria se associou a Bolsonaro para vencer a eleição estadual, o que lhe rendeu a pecha de traidor em relação a Alckmin. A adesão ao bolsonarismo, inclusive com a ênfase na segurança pública, durou pouco, e Doria logo se tornou o principal opositor do presidente na pandemia”, diz Curi.

2022
O futuro do PSDB foi definido em novembro de 2021, quando Doria venceu as prévias para a Presidência contra Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul), e Arthur Virgílio, do Amazonas. Os três pregavam união, embora parlamentares e lideranças admitissem preocupação com os rumos da sigla.

Rejeição. A pré-candidatura de Doria teve de lidar com o baixo percentual de intenção de votos nas pesquisas eleitorais e a alta rejeição dos eleitores, o que levou alguns caciques a discutirem um plano B: o de alçar Leite a presidenciável.

Eduardo Leite. A candidatura de Leite era apoiada e articulada por Aécio Neves, mas foi implodida quando Doria alertou que poderia desistir da Presidência para se manter no governo. Isso arriscaria arranjos do PSDB com MDB e União Brasil e a perda de apoio de prefeitos que preferiam Rodrigo Garcia no Palácio dos Bandeirantes.

Doria recuou, mas apenas após a direção nacional publicar uma carta reafirmando o apoio à sua candidatura.

A disputa interna seguiu mesmo após o “truco” de Doria. Uma ala do partido estava disposta a apoiar Simone Tebet (MDB) ao Planalto, e Doria chegou a cogitar ir à Justiça Eleitoral para garantir sua candidatura. Pouco depois, anunciou sua desistência da corrida eleitoral e seu retorno ao setor privado.

Pegou mal. Um interlocutor do PSDB disse que a derrota de Rodrigo Garcia nestas eleições ocorreu porque a imagem dele ficou atrelada à de Doria. Outro tucano disse que também “pegou mal” para o partido não contar com uma liderança nacional para alavancar a candidatura em SP.

O mais próximo que o partido esteve da corrida presidencial foi a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), candidata a vice de Tebet.

“É a primeira vez desde a redemocratização que o PSDB não tem um candidato à Presidência da República e isso é sintomático, diz muito sobre como o partido sofreu perdas, baques e choques ao longo dos últimos anos e como não conseguiu construir uma candidatura nacional viável desde 2018.”, avalia Curi.

Fim? Pedro Tobias traça uma previsão pessimista para a sigla: “Já não existe mais um partido. No máximo vai ser um governador mandando e o resto obedecendo.”

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