Neste domingo, mais de 120 milhões de eleitores, de 5.563 municípios, vão às urnas escolher seus prefeitos e vereadores. Mas, em 57 deles, o efeito prático das eleições pode durar pouco tempo. Esses municípios, criados a partir de 1996, poderão desaparecer e voltar à condição de distritos, em função de uma emenda constitucional aprovada naquele ano. A EC 15/96 definiu que a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios serão feitas por lei estadual. No entanto, essa mesma emenda definiu que tudo isso acontecerá “dentro do período determinado por lei complementar”. Essa lei ainda não foi aprovada, o que colocou em dúvida a existência dos municípios criados pelas assembléias legislativas.
O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que, em maio do ano passado, reconheceu a demora do Congresso Nacional em editar a lei complementar federal e estipulou o prazo de 18 meses para que o Congresso aprove a norma – ou seja, até novembro deste ano. O presidente do STF definiu também um prazo para que as leis estaduais que criaram municípios continuem em vigor. Nesse caso, o prazo é de 24 meses – até maio de 2009. Caso esses prazos não sejam cumpridos, os municípios criados a partir de setembro de 1996 voltarão a ser distritos.
PEC regulamenta municípios
Diante desse quadro, o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkosky, espera que a Câmara vote uma proposta de emenda à Constituição já aprovada no Senado.
“O sentimento é de muita perplexidade, porque esses municípios estão funcionando, com câmaras instaladas, prefeituras, concursos feitos, e infelizmente até agora não tivemos a manifestação do Congresso Nacional. O Senado já aprovou a PEC 495/06, que regulariza tão-somente os 57 municípios. Está na Câmara tramitando há mais de um ano. Se a Câmara tiver vontade política, pode votar em poucos dias. Faz-se a comissão especial e soluciona-se a questão.” A admissibilidade da PEC 495/06 foi aprovada pela CCJ em julho de 2006.
Reação na Câmara
No entanto, a decisão do Supremo Tribunal Federal de notificar o Legislativo sobre o prazo para votação de uma lei sobre o assunto causou mal-estar entre os parlamentares. No início de setembro, o presidente da Câmara encaminhou resposta ao presidente do STF. No documento, Arlindo Chinaglia afirma que discorda da fixação de um prazo para que o Congresso exerça sua função de legislar e que o povo, reunido na Assembléia Nacional Constituinte, deu à Câmara poder para decidir como participar da elaboração de normas jurídicas.
Ex-presidentes da Câmara saíram em defesa da posição de Arlindo Chinaglia. Foi o caso do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). “É grave engano supor que a omissão de um dos Poderes da República implica a ampliação das competências dos outros Poderes. Como se, por exemplo, a nós coubesse julgar o jornalista Pimenta Neves por um crime que já está há oito anos sem julgamento definitivo. Quem deu a alguém a atribuição de fixar prazos para esta Casa produzir determinada lei?”
Já o deputado Roberto Magalhães (DEM-PE) lembra que não foi por culpa do Congresso que até hoje não houve regulamentação do tema. “Foram vários nesta Casa os projetos de lei complementar para que se atendesse os requisitos para a criação de municípios. Desses vários projetos, só um foi aprovado, tanto na Câmara como no Senado. Todavia, o presidente Lula vetou. Então, não se pode dizer que esta Casa tenha sido omissa.”
Na realidade, foram dois os projetos vetados pelo Executivo. O PL 2105/99, do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), definia parâmetros mínimos para os Estudos de Viabilidade Municipal. Foi integralmente vetado por inconstitucionalidade. Já o PLP 41/03, do Senado Federal, foi vetado sob a alegação de inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público. A proposta determinava o período em que poderiam ocorrer os procedimentos para criação, incorporação, fusão e desembramento de municípios. O Ministério da Justiça argumentou que não havia ficado claro no texto que o processo de criação de município teria que tramitar até 10 meses antes das eleições municipais. No entender do governo, isso causaria insegurança jurídica.
Propostas em andamento
Há várias propostas em tramitação na Câmara que tratam desse assunto. Desde projetos de lei complementar para regulamentar a Constituição a novas emendas à Constituição. No início do mês passado, a Comissão de Desenvolvimento Urbano aprovou uma nova proposta para a regulamentação dos Estudos de Viabilidade Municipal necessários à criação, à incorporação, à fusão e ao desmembramento de municípios. Esse projeto regulamenta a emenda. Pelo texto aprovado, os estudos ficam a cargo das assembléias legislativas, por iniciativa de deputado estadual, com apoio de 1% dos eleitores dos municípios envolvidos.
A proposta foi aprovada na forma de substitutivo elaborado pela deputada Angela Amin (PP-SC) ao Projeto de Lei 1121/07, do deputado Marcelo Melo (PMDB-GO).