Para deflagrar a Operação Vagatomia na última terça, 3, a Polícia Federal de Jales, no interior de São Paulo, submeteu à Justiça Federal um relatório de 599 páginas apontando o suposto envolvimento de mais de trinta investigados na venda de vagas do curso de medicina da Universidade Brasil, sediada no município de Fernandópolis. Ao solicitar judicialmente ordens de prisão e de busca e apreensão, a PF indicou que haveria um ‘balcão de negócio de vagas ocorrendo sem nenhum tipo de receio’.
O esquema contava com fraudes no ingresso de alunos no curso de Medicina da instituição, na obtenção do Financiamento Estudantil do Governo Federal (Fies) e de bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni) e na venda irregular de vagas de transferência para os cursos de complementação do exame Revalida – para revalidação de diploma.
Segundo a PF, somente as fraudes no Fies causaram prejuízo estimado de R$ 500 milhões aos cofres públicos.
A deflagração da operação se deu a mando do juiz federal Bruno Valetim Barbosa. O magistrado entendeu que havia ‘inúmeros’ indícios de cometimento de crimes e reiteração criminosa. Ele decretou a prisão de 22 investigados, inclusive do empresário José Fernando Pinto da Costa, dono da Universidade Brasil.
A decisão anota que a representação policial destaca a gravidade dos crimes atribuídos ao grupo e indica as consequências para os futuros pacientes dos alunos que compraram as vagas, ‘que evidentemente não têm condições intelectuais e profissionais de atuar como médicos’. “São assustadoras e podem ser fatais.”
Segundo a Procuradoria, as vagas eram negociadas pelo grupo por valores entre R$ 80 mil a R$ 120 mil. A representação policial cita ainda suposta participação de José Fernando Pinto da Costa em uma negociação de três vagas por R$ 600 mil.
Na decisão, o magistrado considerou. “A sociedade brasileira está a pagar indevidamente pelo estudo de profissionais que se formarão sem os conhecimentos técnicos para atendê-la com qualidade. Enquanto isso, alunos, pais, e a suposta organização criminosa se beneficiam, os dois primeiros, por obterem um diploma de médico ou um financiamento público sem merecer, a última, na venda das vagas e dos financiamentos”.
Além das ordens de prisão e de busca e apreensão, a Justiça Federal determinou o bloqueio de até R$ 250 milhões em bens e valores dos investigados.
Entre os bens que seriam sequestrados, a decisão lista 50 carros, cinco embarcações e três aeronaves.
Segundo a PF, a entrega de veículos era uma das formas de pagamento pelas vagas.
Quando a operação foi deflagrada, a Polícia Federal indicou que entre os estudantes que compraram suas vagas e financiamentos estão filhos de fazendeiros, servidores públicos, políticos, empresários e amigos dos donos da universidade.
Dois vereadores de cidades do interior paulista são citados pela PF na representação à Justiça.
Segundo a representação, o dono da universidade teria determinado a um homem, ‘possivelmente professor’, que aprovasse um aluno que é vereador em Birigui.
Em outro momento, a Polícia indicou que um parlamentar de Fernandópolis buscou ‘bolsa’ para o filho, o que, segundo os investigadores, se tratava da concessão de um Fies fraudulento, ‘pago indevidamente com dinheiro público em favor do filho de um político’.
Segundo a PF, a investigação teve início com base em uma notícia crime apresentada por uma pessoa cujo parente havia sido contatado para que comprasse uma vaga no esquema.
Alguns alunos também relataram o excesso de vagas no campus ao Ministério Público Federal.
As estimativas das investigações indicam que pelo menos 500 alunos do curso de medicina da Universidade Brasil de Fernandópolis tenham obtido o Fies fraudulentamente com a atuação de assessorias educacionais nos últimos três anos.
Segundo a PF, os mesmos alunos ainda devem receber pelo menos outros três anos de parcelas do financiamento.
A representação policial registra ainda ameaças proferidas pelo dono da universidade aos alunos que fizeram as denúncias, além de tentativas de influenciar e intimidar autoridades, destruição e ocultação de provas.
Em um diálogo interceptado pela PF, um empresário, apontado como um dos principais integrantes de uma assessoria educacional envolvida no esquema, classifica José Fernando como ‘gangster’ e ‘quadrilheiro’ e aborda medidas que o então reitor da universidade tomaria em relação às alunas que fizeram a denúncia de excesso de alunos ao Ministério Público Federal – expulsão, fechamento do Centro Acadêmico e etc.
COM A PALAVRA, A UNIVERSIDADE BRASIL
“A Universidade Brasil vem a público para informar a alunos, docentes e funcionários, bem como a toda a comunidade universitária nacional e à população em geral, que suas atividades acadêmicas e administrativas seguirão as rotinas ordinariamente, a despeito dos recentes fatos ocorridos. Solicitações gerais, atendimento aos alunos, bem como o funcionamento de cursos, com aulas regularmente ministradas, continuarão a ocorrer dentro da normalidade em todos os campi.
A instituição de ensino esclarece também que está integralmente à disposição da Polícia Federal, assim como às demais autoridades em todas as esferas, para colaborar com quaisquer investigações e também para prestar todos os esclarecimentos que se façam necessários.”
COM A PALAVRA, O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
“Em casos de indícios de irregularidades, o MEC irá instaurar processo administrativo para a responsabilização dos envolvidos. Caso as irregularidades sejam comprovadas, serão aplicadas as penalidades previstas em Lei.
O MEC também se coloca à disposição da Polícia Federal e do Ministério Público Federal para colaborar com a investigação.”
COM A PALAVRA, OS INVESTIGADOS
A reportagem tenta contato com os investigados pela operação Vagatomia. O espaço está aberto para manifestação