Os católicos da região de Rio Preto poderão ganhar seis novos santos nos próximos anos. São religiosos que atuaram nas cidades de Barretos, Catanduva, Fernandópolis, Jales, José Bonifácio, Mirassol e Rio Preto, e que estão com processo de canonização abertos, em análise pelo Vaticano.
Para ser considerado santo, é necessário passar por um processo dividido em 15 etapas, que começa com análise da vida, comportamento religioso, dedicação à fé e comprovação de pelo menos dois milagres.
Segundo o padre Fabio Aparecido Dungue, presidente do Tribunal Eclesiástico de Rio Preto, o suposto milagre é analisado por uma comissão técnica do Vaticano. Por meio de checagem de documentação e estudo do caso, os estudiosos da igreja descartam o milagre, por exemplo, quando chegam à conclusão de que a cura de uma doença é resultado da utilização de remédio e tratamento. Esgotadas todas as possibilidades de uso da ciência, pode se reconhecer que a cura foi alcançada por meio da fé do paciente, seus amigos e parentes, em oração.
“Caso a pessoa morra enquanto defendia sua fé, é considerada mártir, sem a necessidade de passar por várias etapas, vai para análise do papa, que pode reconhecê-lo como santo”, diz o sacerdote.
O processo mais recente de pedido de canonização é do padre holandês Mattheus Van Herkhuizen (1915 a 1973), que atuou em Rio Preto, Fernandópolis e Jales. A iniciativa partiu em 2019, pelo então bispo da Diocese de São João da Boa Vista, dom Antônio Emidio Vilar, que atualmente coordena a Diocese de Rio Preto. Inclusive a pesquisa sobre sua vida religiosa e milagres também será feita na região de Rio Preto.
Padre Matheus foi ordenado sacerdote em 1942 e iniciou sua vida religiosa como missionário no então Congo Belga (atual República Democrática do Congo). Durante a Segunda Guerra Mundial, atuou na arrecadação de comida e na ajuda humanitária aos soldados envolvidos no conflito armado naquela região do continente africano.
Em 1946, o religioso veio para o Brasil, sendo designado para trabalhar em Rio Preto. Até 1953, ele foi responsável por recrutar jovens para o seminário mantido pelos assuncionistas em Rio Preto, além de trabalhar em Fernandópolis e Jales.
O religioso morreu em 15 de abril de 1973, na cidade de Espirito Santo de Pinhal. O título de servo de Deus, o primeiro no caminho à canonização, foi atribuído ao padre Matheus em fevereiro de 2019. Uma equipe de postuladores está à procura de milagres atribuídos ao padre.
Outro processo recente de canonização é do padre italiano André Bortolameotti (1919 a 2010), iniciado em 2018, a pedido do bispo de Barretos, dom Milton Kenan Júnior.
“Foi um padre que viveu aqui em Barretos por 30 anos, integrante da Congregação de Jesus Sacerdote. Ele dedicou a vida toda a acolher padres em dificuldade e a ajudar a socorrer os pobres. O povo de Barretos admirava muito ele. Tanto é que no dia de seu sepultamento tinha uma faixa no velório com a seguinte frase: um santo viveu entre nós”, diz o bispo.
Por enquanto, os dois religiosos são considerados servos de Deus, porque os processos ainda estão nas etapas iniciais, à espera de comprovação pela Congregação para as Causas dos Santos, órgão do Vaticano responsável por analisar os pedidos de beatificação e canonização.
Relíquia
Bispo de diocese de Rio Preto, dom Antônio Emidio Vilar, incentivador dos processos de canonização, vai fazer no dia 14 de agosto deste ano, uma missa especial na Catedral de São José para a vinda de uma relíquia do padre Donizetti Tavares de Lima (1882 a 1961), que teve o processo iniciado na diocese de São João da Boa Vista e foi beatificado há quatro anos, pelo papa Francisco.
Monsenhor: servo de Deus
Um dos religiosos da região considerado servo de Deus é o monsenhor Angelo Angioni (1915 – 2008), que atuou em José Bonifácio. Um dos possíveis milagres em análise do sacerdote seria a cura inexplicável de um pedreiro, que ficou em coma por meses, após cair de um telhado de uma residência, em 2015, em Rio Preto. “A mulher dele chegou a ser aconselhada pela equipe médica a trazer as roupas para prepará-lo para o sepultamento. Ao invés disso, ela pediu a intercessão do monsenhor Ângelo Angioni e, segundo ela, de forma repentina, ele se recuperou”, diz o padre Mauro Ziati Pereira, um dos responsáveis pelo processo.
A religiosa irmã Isilda Aparecida Balbuena, do Colégio Santo Antônio, de Rio Preto, que trabalhou com Angioni entre 1978 e 2008, acredita que conviveu com um santo. “Era uma pessoa muito dedicada à fé e às causas dos pobres. Uma das frases que ele dizia e nunca esqueço é uma vida inteira não é suficiente para realizar uma ideia. Ou seja, temos tanto a fazer pelos outros e tão pouco tempo de vida”, recorda a religiosa. (MAS)
Caminhos para a santidade
Estágios
Indicado a santo
Servo de Deus
Venerável
Beato
Santo
Passo a passo para canonização:
Pedido de abertura do processo.
O bispo da diocese do candidato a santo escolhe um postulador. Em geral, uma pessoa com experiência em direito canônico.
Postulador investiga a vida do indicado, provas de virtudes e santidade.
O nome e o histórico do indicado a santo são submetidos à Congregação para a Causa dos Santos, durante uma reunião de religiosos, chamada de conferência de episcopal.
Uma comissão no Vaticano faz o processo de verificação de documentação e checagem da história do indicado. É concedido o “Nihil obstat” (nada obsta), que autoriza a o processo.
Confirmadas todas as informações em documentos, é iniciado o processo de beatificação. Nesta etapa, ele ganha o título de Servo de Deus.
Bispo institui a causa da beatificação.
Bispo nomeia um juiz para o tribunal sobre as virtudes e santidade do indicado.
A Santa Sé concede o título de Venerável.
Papa recebe para análise do parecer do 1º milagre.
Reconhecido o 1º milagre, papa concede o título de Beato.
Papa analisa o relatório do 2º milagre. Aprovado, anuncia a canonização.
O beato é anunciado pelo Papa como novo santo da Igreja.
Tempo indeterminado para tramitação.
Candidatos a santo da região de Rio Preto:
Madre Assunta Marchetti
Classificação: Beata
Onde atuou: Mirassol
Onde nasceu: Itália
Nascimento: 1871
Morte: 1948
Padre Mariano de la Mata
Classificação: Beato
Onde atuou: Cedral e Rio Preto (Engenheiro Schmitt)
Onde nasceu: Espanha
Nascimento: 1905
Morte: 1983
Padre Albino Alves da Cunha e Silva
Classificação: Venerável
Onde atuou: Catanduva
Onde nasceu: Portugal
Nascimento:1882
Morte: 1973
Monsenhor Angelo Angioni
Classificação: Servo de Deus
Onde atuou: José Bonifácio
Onde nasceu: Itália
Nascimento: 1915
Morte: 2008
Padre Matheus Van Herkhuizen
Classificação: Servo de Deus
Onde atuou: Fernandópolis, Rio Preto, Espírito Santo do Pinhal
Onde nasceu: Holanda
Nascimento: 1915
Morte: 1973
Padre André Bortolameotti
Classificação: Servo de Deus
Onde atuou: Barretos
Onde nasceu: Itália
Nascimento: 1919
Morte: 2010
Processo de canonização é longo e caro
Atualmente, o Brasil tem 37 santos reconhecidos pela Santa Sé – entre os que tiveram processo de canonização e aqueles que foram considerados mártir -, mas poderia ter bem mais, se não fosse tão burocrático e caro o processo, calculado em aproximadamente 100 mil euros, algo em torno de R$ 530 mil.
“Uma das dificuldades hoje em dia é o processo de beatificação, porque tudo aquilo que é recolhido sobre o servo de Deus tem que ser traduzido para o italiano. Até alguns anos atrás, eles aceitavam os documentos em português, mas de um tempo para cá, não mais. Isso leva muito tempo e dificulta o processo”, diz o bispo da diocese de Barretos, dom Milton Kenan Júnior, à frente do processo de canonização do padre André Bortolameotti.
Segundo dom Milton, há muitos outros exemplos de pessoas que merecem ter a santidade reconhecida, mas que sequer os processos foram iniciados, dado o alto custo. “Temos muitos exemplos de santidade em muitos lugares do Brasil, que não foram canonizados. Têm religiosas, padres, uma infinidade de gente, que é santa, só não tem processo de beatificação, em razão de toda uma burocracia que existe em razão dos custos do processo”, explica o religioso.
Dom Milton afirma que durante a fase diocesana são baixos os custos, porque muitas pessoas colaboram de forma voluntária, mas os valores começam a aumentar quando a documentação é enviada para Santa Sé. Estão previstos como custos despesas com taxas cobradas pela Congregação para as Causas dos Santos; pagamento para a comissão de peritos dos milagres, composta de historiadores, médicos, teólogos e especialistas em direito canônico; pesquisadores, tradutores e impressão de todo o processo, dentro dos padrões exigidos pelo Vaticano.
Preocupado com o alto custo da canonização, o papa Francisco determinou em junho de 2020 a criação de um fundo para financiar os processos de canonização dos postulantes enviados pelos países mais pobres. Para inibir as cobranças, o santo padre exige inclusive prestação de contas públicas de todas as cobranças dos demais processos, como forma de inibir elevação dos valores.
Brasileiros
Quatro religiosos do Brasil foram canonizados em reconhecimento à vida dedicada à fé e às causas dos mais pobres: Santo Antônio de SantAna Galvão (Frei Galvão), Santa Dulce dos Pobres, São José de Anchieta e Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus. Há também 33 pessoas canonizadas porque morreram como mártires.
Dois veneráveis e um beato
A região tem três religiosos com processos mais adiantados. Dois são considerados veneráveis: padre Albino Alves da Cunha e Silva (1882 – 1973), de Catanduva, e a madre Assunta Marchetti (1895 – 1948), de Mirassol. A fé em madre Assunta é a principal motivação para o trabalho da devota Égide Ustaszewsky, que se dedicou à restauração da capela religiosa em que ela viveu, na década de 1930.
“Começamos a reforma da capela em 2019, com apoio da Prefeitura. Em 2020, após sonhar com ela, começamos a rezar um terço todas as semanas, pelo fim da pandemia do coronavírus. Acredito que ela tenha nos atendido. Torcemos para terminar a reforma até o final do ano”, diz a designer de interior, especialista em arte sacra.
O religioso da região que está mais próximo da canonização é o padre Mariano de la Mata (1905 a 1983). Ele foi beatificado em 5 de novembro de 2006 pelo papa Bento XVI. O religioso viveu por muitos anos no distrito de Engenheiro Schmitt onde atualmente os cristãos fazem sempre na primeira semana de novembro a tradicional Caminhada do Padre Mariano, que vai até a cidade de Cedral, onde o sacerdote também celebrava missas.
Falta apenas a análise de um segundo milagre para que o religioso seja canonizado como o primeiro santo da região de Rio Preto. (MAS)