sexta-feira, 20 de setembro de 2024
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O Homem do Saco

Quando criança, para não sair sozinho por aí, era ameaçado com a história do homem do saco, um maltrapilho que andava pela cidade com um saco de estopa (na minha…

Quando criança, para não sair sozinho por aí, era ameaçado com a história do homem do saco, um maltrapilho que andava pela cidade com um saco de estopa (na minha imaginação) nas costas recolhendo as crianças que estivessem na rua desacompanhadas. Toda criança que conhecia tinha pavor do homem do saco.

As ameaças feitas pelos pais em geral não paravam por aí, havia outros personagens da cultura popular que eram usados para amedrontar as crianças: bicho papão, cuca, boi da cara preta, lobo mau, mula sem cabeça, o bicho do escuro e muitos outros que não me lembro.

Na minha adolescência, outros medos povoavam o universo juvenil. Listado em ordem terrivelmente crescente, tínhamos os seguintes medos: dos pais, dos professores, dos mais velhos e fortes das séries subsequentes, da diretora da escola, de bandidos, da polícia, da loira do banheiro, de lobisomem e de personagens famosos dos filmes de terror.

A vida vai passando e outros medos vão tomando o lugar dos monstros de outrora. Cada um, de acordo com as experiências vividas tem menos ou mais medo, coleciona poucos ou muitos monstros. Somente a própria pessoa, no seu íntimo, sabe qual ou quais os monstros que mais assombram sua vida e, mesmo que seja no imaginário, o temor ou tremor é real.

Hoje, parece que não há mais tantos monstros assombrando as crianças. Não sei se quiseram poupar as crianças dos assombros fictícios, se quiseram mostrar-lhes a realidade mais cedo ou se acham injusto provocar medo. Seja qual for a resposta indicada, parece que atualmente não existe mais medo de tantas coisas.

Medo de professor já não existe faz tempo, da diretora talvez um pouco, dos pais quase nenhum, na maior parte das famílias. Medo de polícia então, nem mesmo os bandidos. Lembro-me que a polícia tinha um projeto, não sei se ainda existe, que levava estudantes, especialmente os mais jovens, para visitar o batalhão, mostrava as viaturas e as dependências do quartel com objetivo de amenizar esse medo que as crianças tinham de polícia.

Não sei se o medo é o melhor recurso para impedir as transgressões, nem acho que crianças e jovens devam ter medo dos professores ou da polícia. Apenas penso que nessa mudança de postura da sociedade o medo deveria ter sido substituído por um valor maior: o respeito. O que, me parece, não aconteceu, pois deixaram de ter medo de muita coisa e respeito por quase nada.

Pode ser que o respeito seja um valor ainda em construção em nossa sociedade, quem sabe, e que o medo seja visto por muitos como uma solução ultrapassada, apesar de

ainda muito usado. Longe de qualquer tipo de apologia, a sabedoria popular sempre disse que só morre afogado quem não tem medo de água.

Tenho esperança de que o respeito possa ser eleito como valor principal na forma de se comportar e interagir das pessoas, caso contrário, viva o homem do saco, ou melhor, cuidado com o homem do saco.

Sérgio Piva

s.piva@hotmail.com

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