segunda, 25 de novembro de 2024
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Novo prazo da CBF pode provocar até a paralisação do Brasileirão

Em documento enviado pelo Ministério do Esporte à CBF, antes do início do Campeonato Brasileiro, consta que a entidade deveria cobrar de todos os clubes participantes os documentos exigidos pela…

Em documento enviado pelo Ministério do Esporte à CBF, antes do início do Campeonato Brasileiro, consta que a entidade deveria cobrar de todos os clubes participantes os documentos exigidos pela lei – certidões negativas de débito com a União, certificado de regularidade do FGTS e comprovação de pagamento dos contratos de trabalho e imagem de todos os atletas, mas nada ainda foi apresentado, conforme revelou a ESPN na semana passada, em briga que pode até anular o Brasileirão.

O ESPN.com.br conversou com advogados para fazer uma análise jurídica sobre o tema.

Para Carlos Eduardo Ambiel, especialista em legislação desportiva, por exemplo, a situação contraria o Estatuto do Torcedor.

“Alguns clubes, por exemplo, não aderiram ao Profut. O Palmeiras é um deles, e tem todo direito disso. Ele não está no Profut, mas o Estatuto do Torcedor obriga o clube, como entidade, a demonstrar que não tem débitos pendentes”, disse Ambiel, ponderando que o aumento do prazo para os clubes aderirem ao Profut (de 30 de novembro de 2015 para 31 de julho de 2016) pode ter gerado a atual postura da CBF em relação ao pedido de apresentação dos documentos.

“Talvez esse aumento do prazo tenha justificado uma certa flexibilidade na exigência das certidões, embora o Ministério do Esporte entenda que a regra já está valendo. Eu também entendo que está valendo, pelo fato de a regra já constar no Estatuto do Torcedor desde agosto do ano passado. A partir do fim de julho, quando o prazo se encerra, a tendência é que as obrigações já sejam exigidas de uma forma mais rigorosa e, com isso, a lei seja cumprida à risca para as próximas competições que tenham mais de uma divisão”, ressaltou o advogado.Uma alteração no Estatuto do Torcedor, a partir da Lei do Profut, exige desde agosto do ano passado que os clubes, além de conquistarem o direito de disputar uma competição pelos critérios técnicos de acesso ou descenso no campo, também precisam demonstrar que estão em dia com as obrigações tributárias de FGTS e obrigações com os atletas.

“Vale ressaltar que o que foi alterado no Estatuto do Torcedor não depende do Profut”, analisou Ambiel.

João Henrique Chiminazzo, advogado que já defendeu o Bom Senso e centenas de atletas, também deu o seu parecer à reportagem.

“Entendo que o Profut, quando foi feito, tinha uma previsão de fato para que todo mundo aderisse e cumprisse as regras até 30 de novembro do ano passado, e com o início do Brasileiro todos os clubes teriam que ter aderido obrigatoriamente e cumprir suas exigências. Quando o prazo foi prorrogado para 31 de julho e o campeonato já teria começado antes, como começou, não venceu o prazo para os clubes fazerem a adesão e cumprirem o requerimento. Então infelizmente não posso exigir dos clubes que me apresentem as declarações, pois o prazo para fazerem a adesão não se esgotou”, analisou o especialista.

“Então, entendo que essa prorrogação de prazo deu ensejo à CBF para que nada fizesse. Acho que o espírito da lei se perde nesse contexto todo, o futebol perde com essa história toda, mas em tese como os clubes não foram obrigados oficialmente a fazer a adesão, então não se pode exigir esses documentos deles”, continuou Chiminazzo.

Outro que caminhou pela mesma linha de raciocínio foi o advogado e professor de direito esportivo, Luiz Marcondes.

“Imagino que sim. A extensão de prazo é naturalmente uma amostra de que a realidade é um pouco diferente do que a norma trata. A norma é boa, apesar de ter pontos que não são ideais pelo modelo brasileiro de esporte. A constituição traz que o desporto de alto rendimento é de autonomia privada. Quando falamos que lei federal regula questões de competição, quem sobe, quem desce, no meu modo de interpretar não é o mais correto. Por isso vamos tendo esses vários problemas de aplicabilidade da lei”, disse Marcondes.

Para o advogado especialista Márcio Cruz, o desfecho do caso só virá quando as denúncias chegarem às autoridades.

“A lei 13.155/2015 do Profut alterou o artigo 10 do Estatuto de Defesa do Torcedor, definindo o critério técnico exigido das equipes e das entidades de administração quanto à transparência e publicidade. Mas a Lei 13.262/2016 prorrogou o prazo para adesão dos clubes ao Profut até 31 de julho de 2016. Porém, o art. 19 da Lei do Profut prevê a criação da Autoridade Pública de Governança do Futebol APFUT, a qual será responsável por editar a regulamentação do cumprimento daquelas exigências e será o órgão que vai apurar o descumprimento das regras, mediante denúncia ou de ofício, segundo o artigo 20 Profut”, analisou Cruz.

“Há um conflito entre a previsão do Estatuto do Torcedor e do Profut. Apenas chegando denúncias seja na CBF, no STJD ou na APFUT é que vai se desenhar o desfecho de tais situações”, continuou.

Em lei sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, em agosto de 2015, foi permitido aos clubes o refinanciamento das dívidas tributárias e FGTS em prazo de até 240 meses. Como contrapartida, certos requisitos são exigidos, como manter os salários dos atletas em dia, pagar os impostos, reduzir déficits, não gastar mais do que arrecada, proibir reeleição em mandato superior a quatro anos, manter investimento mínimo nas categorias de base e futebol feminino, entre outros aspectos.

Tais medidas foram consideradas pelo Governo necessárias para boa gestão dos clubes e para que as dívidas não voltem nos anos seguintes após o parcelamento.

“Com a criação do Profut, a maioria dos clubes da Séries A e B, cerca de 70%, pelos dados do Ministério do Esporte apresentados no ano passado, aderiram à primeira etapa, que vigorou até 30 de novembro de 2015. Esse era o prazo final anterior. Em tese, isso fez com que esses clubes, atualmente, consigam apresentar Certidões Negativas de Débitos. No entanto, em março deste ano, houve uma Medida Provisória que foi convertida em Lei, pelo fato de muitos clubes de divisões menores e até que não jogam competições nacionais, apenas estaduais, não terem aderido ao Profut”, disse Ambiel.

“Com isso, houve uma prorrogação do prazo, que se encerra no dia 31 de julho. No cenário mais macro, eu posso entender e interpretar que, com a prorrogação do prazo, aqueles clubes que estão em débito no início do Brasileirão ainda estão no período que podem apresentar as certidões. E, portanto, a não aplicação teria se dado pela prorrogação da própria Lei”, continuou o advogado.

Já Luiz Marcondes relembrou a antiga Lei Pelé.

“Profut é sempre uma questão complicada. O Profut tem ideais muitos bons e veio num momento oportuno, mas impor algo por lei e como foi feito não quer dizer que na prática vai ter a aplicabilidade. Um exemplo que eu trago é quando a Lei Pelé disse que os clubes precisavam ser empresas. Ora não é porque um clube é empresa que ele será bem gerido. E, na época, os dois clubes que aderiram ao mandamento da Lei Pelé, que foram Bahia e Vitória, caíram para a Série C. Foi desastroso”, contou.

“O Profut diz que os clubes tem de ter as certidões negativas de débito, tem de estar em dia para jogar os campeonatos. Mas se hoje for cumprido todos os regulamentos e todas as normas do Profut nós não temos futebol no Brasil. Aí é a realidade que não consegue se afirmar a norma imposta. Esse é um ponto bastante complexo para ser trabalhando”, acrescentou Marcondes.

“Se o clube tem interesse em ascender de divisão, pode exigir que os clubes da Série A, por exemplo, apresentem os documentos obrigatórios. Até mesmo o próprio torcedor, pelo Estatuto do Torcedor, também pode reivindicar isso. Do ponto de vista prático, seria mais fácil a entidade exigir, mas essas outras formas estão previstas em Lei. Embora a Lei não diga quem fiscaliza, é uma obrigação que consta no Estatuto, que está vigorando desde agosto do ano passado”, finalizou Ambiel.

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