O juiz da 1ª Vara Criminal de Fernandópolis, Evandro Pelarin, condenou o aposentado Clóvis dos Santos a 30 anos de prisão por estupro de vulnerável. Ele era acusado pelo Ministério Público de abusar sexualmente de duas netas, das quais uma é também sua filha biológica, em um enredo macabro de incestos em série que persistiu por 25 anos.
O caso de Clóvis foi narrado em março do ano passado pelo Diário. Em razão da condenação judicial, seu nome verdadeiro é divulgado pela primeira vez – para os demais familiares, que moram no distrito de Brasitânia, permanecem os nomes fictícios. Pela sentença, a pena será cumprida em regime fechado, e Clóvis, que está preso em Andradina desde que o caso chegou à polícia, em outubro de 2011, não poderá recorrer em liberdade.
Os abusos começaram em 1987, quando Aline, filha de Clóvis e mãe dos seus cinco netos (veja quadro nesta página), começou a ser abusada pelo pai aos 11 anos de idade. À polícia, Aline disse que “não ‘olhava’ seu pai ‘como um pai’, e sim como ‘homem, sentia atração física por ele, sentia desejo sexual”.
Na mesma época, Clóvis investiu também contra outra filha, Elaine, então com 13 anos. Mas, diferente da irmã, ela delatou o pai à polícia em 1992, e o aposentado foi denunciado à Justiça por estupro. Por falta de provas, acabou absolvido – esses crimes já prescreveram, e não são analisados na sentença de agora.
Consentidos por Aline, os abusos persistiram. Por vários anos ela dividiu a mesma cama de Clóvis – a mãe dela e mulher do aposentado, Zaíra, dormia em outro quarto. Do relacionamento nasceram Mirian e Murilo, seus filhos-netos. Após Aline dar à luz esse último, a libido de Clóvis se voltou para a neta-filha Marcela, hoje com 17 anos, deficiente mental, e para Manuela, 15 anos, única filha de Aline que não é ao mesmo tempo filha do aposentado.
Os abusos contra Manuela e Marcela duraram seis anos, segundo o Ministério Público, e começaram quando a mais nova, Manuela, tinha apenas 8 anos. Eram praticados por Clóvis dentro de casa, quando todos dormiam ou não havia mais ninguém, ou no carro, dentro de um canavial, nos dias em que o aposentado levava as duas meninas para consultas com o psicólogo em Fernandópolis.
Os estupros só cessaram em outubro de 2011, quando Manuela relatou os abusos a uma enfermeira da Unidade Básica de Saúde (UBS) de Brasitânia, que, por sua vez, repassou o caso para a polícia. Desde então, ela vive em um abrigo. Em entrevista do Diário no ano passado, a adolescente diz não querer mais conviver com o avô. “Ele fez maldade comigo”, disse.
Já Marcela sofre de problemas mentais, de acordo com laudo do Hospital das Clínicas da USP, consequência do incesto: segundo geneticistas, quando um pai tem um filho da própria filha, o risco de o bebê ter problemas neurológicos aumenta em 40%. Clóvis acabou denunciado à Justiça pelo crime de estupro de vulnerável – o Instituto Médico Legal (IML) já havia atestado a ruptura do hímen de Manuela.
Em juízo, Marcela negou ter sido abusada pelo pai-avô, mas laudo do Hospital das Clínicas da USP atestou que a adolescente sofre de deficiência mental leve. “Ao negar que tenha sido molestada pelo avô, Marcela pode estar reproduzindo a estrutura de proteção familiar em torno do avô, o que vem de longa data”, escreve Pelarin na sentença.
“Pela conjugação da prova oral, produzida no processo, com a prova crítica, extraída do exame genético, que comprova a paternidade do réu em relação a três de seus netos, há plena convicção de que o acusado praticou os fatos descritos na denúncia em relação à sua neta Manuela.”
A pena para o crime varia de oito a 15 anos de prisão, mas acabou fixada acima do limite devido às circunstâncias do crime: o fato de ter se prolongado durante vários anos e de Clóvis ser avô das vítimas. “O réu praticou relações incestuosas com uma de suas filhas, comprovadamente, tendo com ela filhos-netos, o que evidencia sua personalidade deformada, perigosa e extremamente deletéria dentro da família”, argumenta o juiz.