sexta-feira, 20 de setembro de 2024
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Medalhas de Lítio

A Olimpíada do Rio de Janeiro tem revelado a personalidade de muitos atletas participantes dos jogos da era moderna. Mostrou a simplicidade, ousadia e simpatia do recordista Usain Bolt, a…

A Olimpíada do Rio de Janeiro tem revelado a personalidade de muitos atletas participantes dos jogos da era moderna. Mostrou a simplicidade, ousadia e simpatia do recordista Usain Bolt, a determinação e humildade do incrível Michael Phelps, mas também a malandragem e a falácia de seus compatriotas.

Um grupo de quatro nadadores norte-americanos mentiu para a polícia brasileira e inventou um suposto roubo do qual teriam sido vítimas. Depois de descoberta a farsa, a maioria tirou o corpo fora e confirmou que a história fantasiosa fora inventada pelo colega Ryan Lochte, para encobrir um ato de vandalismo cometido por eles em um posto de gasolina.

Ainda que não haja punições adequadas para o caso, o mais importante é que, pelo menos, foi revertido o reforço da imagem negativa do país, especialmente do Rio, que o fato criou. Que nosso país tem inúmeros problemas todos sabem, mas isso não dá direito de acharem que aqui é a casa da mãe Joana e que nossas instituições não são sérias.

Entretanto, quero abordar aqui outro aspecto desse episódio, que está por trás da empáfia e soberba daqueles nadadores: o preconceito motivador de tal ato. Certamente, por terem uma ideia “de que o Rio é um grande “velho-oeste” americano”, como sugeriu Brian Winter, escritor e especialista em América Latina, imaginaram que poderiam inventar uma história fantasiosa que iria “colar”, que as autoridades brasileiras seriam incapazes de descobrir.

Esse tipo de preconceito contra países e culturas, infelizmente, não é propriedade exclusiva dos norte-americanos, as pessoas em geral o têm, em menor ou maior grau. É fácil verificar.

Imagine um jogo de memória em que fosse perguntado o que vem à cabeça da pessoa quando mencionados alguns lugares ou culturas. Provavelmente, quando disséssemos a palavra África, a resposta seria selva, elefantes, leões, sem citar o fato de muitos acharem tratar-se de um país, não de um continente.

Egito. Logo vem à mente pirâmides, deserto e camelos. A imagem preconcebida em nossa memória não leva em conta que nesses lugares existem cidades como as nossas, pessoas como nós, mas somente aquilo que previamente foi gravado em nossa mente por livros, filmes, propagandas e outros meios.

Da mesma forma que muitas pessoas acham que na China todo mundo só come insetos e outros pratos exóticos, o Paraguai é uma gigantesca banca de muamba e todo muçulmano é terrorista, o estereótipo do Brasil no exterior é o de que aqui tem Carnaval o ano inteiro e o país todo é uma grande favela dominada pelo tráfico e a violência. Assim, generalizamos o comportamento e as características de outros povos e culturas.

Que esse fato ocorrido no Rio de Janeiro com os nadadores norte-americanos possa servir de ensinamento a todos nós, um ponto de reflexão sobre como nossos preconceitos podem gerar ideias e atitudes errôneas, baseadas em julgamentos

preconcebidos, ou seja, gerados anteriormente a partir de convicções falsas e enganosas em sua maior parte.

Se, nos jogos olímpicos, o símbolo maior de conquista é a medalha de ouro, o mais nobre dos metais, que os ardilosos nadadores norte-americanos e todos os nossos preconceitos pessoais recebam medalhas de lítio, o metal mais suscetível à corrosão.

SÉRGIO PIVA

s.piva@hotmail.com

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