domingo, 10 de novembro de 2024
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Mais respeito e fiscalização, menos lei!

Na Câmara Municipal de Fernandópolis, em junho de 2013, foi aprovado o projeto de lei nº 24/2013 que impõe limitações na venda e no consumo de bebidas alcoólicas, no percurso…

Na Câmara Municipal de Fernandópolis, em junho de 2013, foi aprovado o projeto de lei nº 24/2013 que impõe limitações na venda e no consumo de bebidas alcoólicas, no percurso de extensão das avenidas Expedicionários Brasileiros e Augusto Cavalin e, ainda, nas vias a elas paralelas, na extensão de 100 metros. Incluem-se as limitações de horário aos dias da semana, assim dispostas: durante a semana até a meia-noite e aos finais de semana, haverá a tolerância de uma hora. A aplicação de tais limites e direcionada a estabelecimentos que não servem alimentação para consumo local e que não possuem infra-estrutura adequada (cozinha própria, sanitários, balcão de atendimento, mesas e cadeiras) e alcança ainda a proibição da propagação de som automotivo, bem como o consumo de bebida alcoólica de tais vias publicas.

Pensemos então, na limitação da venda de bebidas alcoólicas – colocando em segundo plano o que envolve a problemática do som automotivo e o consumo em tais avenidas – que fere no mínimo dois princípios importantes amparados pela Constituição Federal.
Num primeiro momento, questiona-se: houve a observância do princípio da isonomia (art. 5, caput, CF)? O legislador relata que todos são iguais perante a lei, sendo inquestionável que, se uma lei aplica-se a determinada categoria (no caso, os comerciantes dos estabelecimentos em questão), deveria ela abranger a todos que compõem essa mesma categoria, sem restrição. Isto é, ao limitar alguns estabelecimentos, de somente uma determinada localização (as avenidas), do mesmo município, não estamos diante de igualdade em relação aos demais estabelecimentos (de outras avenidas ou ruas), portanto, não há isonomia.

A mensagem subentendida é: “Saiam dessas avenidas e vão comprar em outro lugar permitido”. A conclusão é lógica, o resultado, subentendido consiste no benefício dos outros estabelecimentos de mesmo gênero que não estão situados nessa avenida, acarretando prejuízo para aqueles que lá se encontram e há muito tempo exercem esta atividade. Portanto, para que esta norma seja constitucional e, respeite o ordenamento jurídico brasileiro, deveria limitar todos, estabelecimentos do mesmo gênero, da cidade e não somente de referidas avenidas.

Com o objetivo de valorizar o trabalho humano e a livre iniciativa, os princípios gerais da atividade econômica trazem, dentre outros, um relevante princípio a ser aqui ressaltado: o da livre concorrência (art. 170, IV, Constituição Federal). Ora, se o Brasil adota um regime de mercado cujo objetivo é garantir a competição mercantil de forma justa, livre de intervenção e abuso de poder por órgãos do Estado, como se pode admitir intervencionismo no desenvolvimento da atividades dos estabelecimentos selecionados? Levando em conta que não estamos falando de venda de um objeto ilícito, ao contrário, já existe prévia autorização para o comércio de bebidas alcoólicas para maiores de 18 anos, pelo nosso direito.

Assim os comerciantes atingidos pela lei referida são vítimas de um Estado que deixa de lado sua função de racionalizar a vida econômica nacional e passa a dar a ela limites inapropriados, lembrando que já existem leis em vigor para versar sobre o tema que deseja alcançar tal medida imposta pela Câmara Municipal.

Impossível deixar de fazer um breve levantamento, ao que diz respeito, da “inflação legislativa”, ou seja, estamos passando por um aumento da complexidade do nosso ordenamento jurídico, por conta de inúmeras e exageradas leis, sem fundamentos necessários, considerando a já existência de leis, melhores discutidas e fundamentas por órgãos devidamente competentes, que, já visam os mesmos objetivos, porém, de forma mais racional.

Da norma em questão se observa os seguintes objetivos: a) diminuir os acidentes de trânsitos causados pelo consumo de bebida alcoólica combinado com a direção de veículos automotivos (o que já é previsto pelo Código de Trânsito Brasileiro, com as alterações produzidas pela recente “Lei Seca”); b) diminuir o uso e comércio de drogas nos pontos “estratégicos” apontados (problema que só não é melhor solucionado devido a falta de efetiva fiscalização, pois já há lei com este viés, a exemplo disto da lei nº.11.343/06, que estabelece o “Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas” , prescrevendo medidas para prevenção do uso indevido de drogas e também ao trafico ilícito de drogas ); c) permitir a segurança do menor de 18 anos que esta exposto ao consumo de bebidas alcoólicas e afins ( problema perfeitamente amparado pelo ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n.8069/90).

Dessa forma, os problemas que a norma objetiva regulamentar, não encontra solução apenas com a criação de novas leis, e sim com a efetividade de leis já existentes, através de rígida e eficaz fiscalização pelos órgãos municipais, estaduais e federais, que muitas vezes fazem “vista grossa” para poupar trabalho e tempo, portanto, a norma em análise, traz muito mais problemas do que aqueles que pretende solucionar, haja vista que o Direito brasileiro já tem mecanismos aptos à solução dos conflitos por ela estabelecidos como alvo, bastando a assunção de responsabilidade dos poderes constituídos para por fim aos males locais. Não precisamos de mais leis, precisamos de mais homens e mulheres capazes de assumir sua responsabilidade diante das circunstâncias ilegais que vivenciamos diariamente nestas e em outra avenidas de nossa cidade. Façamos valer a Constituição Federal! Façamos valer nossos direitos! E por que não, nossos deveres!

MARCUS VINICIUS MARCHAN, ESTUDANTE DE DIREITO PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MATO GROSSO DO SUL, E CIDADAO FERNANDOPOLENSE!

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