Um levantamento inédito realizado pelos Cartórios de Registro Civil aponta que mais de 8,6 mil crianças e adolescentes de até 17 anos ficam órfãs de pelo menos um de seus pais por ano no estado de São Paulo. Os dados, pela primeira vez consolidados em nível estadual, mostram ainda que, em 2021, a Covid-19 foi responsável por um terço da orfandade no estado, correspondendo a 2.988 crianças que perderam um dos pais devido à doença, em um total de 8.840 órfãos.
O levantamento abrange o período de 2021 a 2024, quando foi possível realizar o cruzamento dos dados dos CPFs dos pais existentes nos registros de óbitos com o registro de nascimento de seus filhos, permitindo averiguar com exatidão o número de órfãos no estado ano a ano. Até a metade de 2019, não havia a obrigatoriedade de inclusão do CPF dos pais no registro de nascimento, inviabilizando uma correlação exata entre ambos os registros — situação que mudou a partir de 2021.
“Com a evolução da legislação brasileira, que estabeleceu o CPF como número identificador único e permitiu sua inclusão em diversos atos de registro, foi possível realizar um cruzamento sólido das bases de registros de óbitos e nascimentos, possibilitando chegarmos a números concretos”, explica Luís Carlos Vendramin Júnior, diretor da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) e presidente do Operador Nacional do Registro Civil (ON-RCPN), órgão responsável por desenvolver tecnologias para a implantação do registro eletrônico no país.
Segundo os dados consolidados pela Arpen-SP, além dos 8.840 órfãos contabilizados em 2021, o ano seguinte registrou 7.468 crianças que perderam ao menos um dos pais. Em 2023, houve um aumento para 9.039 órfãos, e, até outubro de 2024, o número já totaliza 9.383, superando o recorde do ano passado no mesmo período. “Tratam-se de dados vitais para a elaboração de políticas públicas no país, inclusive para que os governos possam se planejar para atender esta grande demanda de orfandade”, completa Gustavo Renato Fiscarelli, presidente da Arpen-Brasil.
Quando consideradas apenas crianças e adolescentes que ficaram órfãs de ambos os pais, os números diminuem consideravelmente. Em 2021, foram 174; em 2022, 126; em 2023, 165; e, até outubro de 2024, 126 órfãos. Em razão de seu contingente populacional, São Paulo é o estado que mais registra órfãos no Brasil, seguido pela Bahia, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
FENÔMENO DA COVID-19
Os dados consolidados do levantamento dos Cartórios de Registro Civil apontam que a Covid-19 deixou, desde 2019, 3.689 crianças órfãs de pelo menos um de seus pais em São Paulo. Se forem consideradas doenças correlacionadas ao coronavírus no período, como Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) — 131; Insuficiência Respiratória — 1.795; e Causas Indeterminadas — 288, o número pode chegar a ao menos 5.903 crianças órfãs em São Paulo devido às doenças relacionadas à Covid desde 2019.
Ainda segundo o estudo, ao menos 50 crianças perderam ambos os pais em razão da doença causada pelo novo coronavírus. Esse número pode ser ampliado a 89, se forem considerados óbitos de doenças à época relacionadas à Covid-19, como SRAG — 2; Insuficiência Respiratória — 29; e Causas Indeterminadas — 8. O levantamento também aponta reflexos no aumento do número de órfãos em razão do falecimento de seus pais por doenças como infarto, AVC, sepse e pneumonia, que estiveram relacionadas à pandemia nos últimos anos.