Após uma mãe denunciar pelas redes sociais o atraso de quatro meses na entrega de um medicamento para o filho de 9 anos, portador de doença rara, o prefeito da cidade em que mora, Castanhal, na Grande Belém, Paulo Titan (MDB), respondeu de forma debochada: “Não aceito é drama através de rede social”. O medicamento chega a custar mais de R$ 300.
Bruna Melo, mãe de Miguel, usou uma foto publicada no último dia 14 pela filha de Paulo, a deputada estadual Paula Titan (MDB), para questionar o atraso no medicamento, que, segundo decisão judicial, deveria ser fornecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da prefeitura ou do governo estadual.
Bruna usa as redes sociais para compartilhar o dia a dia do filho, portador de megacólon congênito, uma doença que impede o intestino de funcionar, por não ter as células ganglionares, responsáveis por estimular o bom funcionamento, o que cria o fecaloma — massa de fezes endurecidas — e deixa o cólon grande.
“Quatro anos após o diagnóstico de megacolón congênito, descobrimos a retocolite ulcerativa. Essa doença provocou úlceras sangrentas no ânus, que pingava sangue no chão; perda de peso; febre e outros sintomas”.
As duas doenças não têm cura, apenas tratamento, como explicou o médico proctologista Helder Ikegami.
“O megacólon geralmente é diagnosticado na infância e se deve a ausência de células nervosas relacionadas à motilidade do intestino grosso, levando à constipação intestinal e até mesmo a obstrução funcional. Já a retocolite ulcerativa é caracterizada por uma inflamação da mucosa intestinal, o que leva a quadros clínicos de diarréia crônica, inclusive com muco e sangue”, esclareceu o médico.
Segundo ele, as duas doenças são de baixa prevalência e, no caso do megacólon, a incidência é de um a cada 20.000 nascidos, o que o Ministério da Saúde considera como doença rara.
De acordo com Bruna, um dos cuidados necessários para que Miguel tenha uma vida minimamente saudável são feitos a partir da ingestão de um leite especial, o Modulen, voltado à retocolite e que chega a custar, cada lata, mais de R$ 300.
Sem condições para custear a quantidade necessária para o filho, a mãe conseguiu, por meio de uma decisão judicial, que o alimento fosse dado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio do estado ou do município de Castanhal, que desde 2019, após seis meses de provisão do governo estadual, passou entregar o leite.
Sobre a importância do uso do leite no caso de Miguel, um laudo assinado por uma médica que acompanha o paciente descreve a eficácia e percepção de melhora no quadro de retocolite ulcerativa da criança.
Desde o dia 28 de novembro de 2022 sem receber o leite, Miguel teve diversas complicações no caso e precisou ir para a emergência por conta das fortes dores e das úlceras, de acordo com a mãe.
Na última quarta (24), o município de Castanhal entregou as 11 latas de Modulen referentes à março, mas não deu as outras 44, dos quatro meses que ainda faltam.
“O certo é ir buscar com 30 dias depois da data do recebimento. Por exemplo, se eu recebi dia 24 de março, a próxima é 24 de abril. Mas não tem data correta, porque eles nunca dão na data certa. A farmacêutica do município disse que não sabe se ele (Miguel) vai receber mês que vem”, completou a mãe, aflita pela possível falta do fornecimento do leite.
Posicionamento
Procurados sobre o caso, nem o governo estadual e nem o municipal responderam se as 44 latas atrasadas dos últimos quatro meses serão entregues, além da data prevista para o fornecimento das próximas levas de Modulen.
Sobre a compra do leite, a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) informou apenas que a compra do complemento alimentar para o paciente já está em execução e pontuou que a fórmula não faz parte dos padrões nutricionais fornecidos pelo estado. “Por essa razão, foi necessário a abertura do processo para a aquisição do produto”, finalizou.
Já a prefeitura de Castanhal explicou o motivo dos atrasos e disse que o prefeito “lamenta o ocorrido e ainda mais que suas palavras possam ter gerado um equívoco de interpretação”. Leia a nota completa abaixo:
“A prefeitura municipal é ciente quanto ao problema de falta de alimentos especiais pelo qual passa a secretaria de saúde. No caso em específico, informa que acompanha o paciente desde 2014, dando todo o suporte para a criança em questão. Ressalte-se que existe processo judicial em que Estado e Municipio são responsaveis pela dispensação do alimento, mas, o município vinha arcando sozinho com a entrega.
Este ano, o governo do Estado foi acionado para arcar com a despesa da alimentação especial, mas, está em processo licotatório para a aquisição da fórmula, razão pela qual o município realizou a entrega de 11 latas referente ao mês de março, porém não existe respaldo legal para a dispensação retroativa.
Importante frisar que essa alimentação especial não tem recursos específicos do MS e por isso o município vem arcando com recursos próprios. Desta forma, políticas públicas estão sendo avaliadas em conjunto com governo e parlamento estadual para viabilizar recursos para a despesa com alimentos especiais.
Quanto ao comentário feito pelo prefeito, ele lamenta o ocorrido e ainda mais que suas palavras possam ter gerado um equívoco de interpretação. Ele está acompanhando diariamente o trabalho da secretaria e foi recentemente à Brasília em busca de recursos para a saúde do município.”