As aulas recomeçaram nas redes particular e pública depois da pausa das férias de julho. Para algumas crianças a felicidade de reencontrar os amigos e, quem sabe, a alegria de rever os professores. Lógico, estou falando das crianças pequenas do ensino infantil, sabendo que mesmo dentre elas há as que não estão nada contentes com o retorno das aulas.
Se falarmos dos ensinos fundamental e médio, o índice de alegria ou contentamento deverá ficar em um percentual tão baixo quanto o nível da inflação nos dias atuais, em se tratando de reencontrar os amigos e colegas de escola. Quanto a rever os professores, não me atrevo a chutar um comparativo, ainda que fosse qualquer índice da balança comercial argentina.
No período de recesso escolar, cada vez menor para os professores, afinal eles não precisam de mais horas de descanso, já que não fazem “quase” nada entre a meia-noite e seis da manhã, o descanso, objetivo das férias de julho, parece não alcançar sua missão, não somente em relação aos docentes, mas também não dá folga aos pais e não deixa os alunos relaxarem completamente.
Os pais, se trabalham, como ocorre com a maioria, precisam do auxílio de avós, de tias, ou qualquer outro parente voluntário que se prontifique a tentar distrair a criança nesse período. Os adolescentes não são motivo de preocupação maior nesse aspecto, no entanto, elevam os gastos do orçamento familiar, ou em razão de viagem, ou do custo das inúmeras atividades que suas imaginações sejam capazes criar para ocupar o tempo parcialmente ocioso.
Parcialmente, porque se os professores não podem mais descansar, os pais passam a ter mais atividades extras ou aumento da preocupação com os filhos sozinhos em casa, os alunos também trazem para suas férias algumas lições de casa, tarefas a serem realizadas no período em que deveriam desocupar suas mentes das obrigações e relaxar da maneira que lhes aprouver ou seja possível.
Mas isso não acontece como deveria ser. Eu mesmo, quando lecionava, também cometi esse crime: dar tarefa, trabalhos de pesquisa, ou qualquer outra incumbência de estudo que se opunha absolutamente à finalidade do período de férias escolares.
O aluno não vai morrer se tirar algumas horas por dia para fazer tarefa durante as férias, pode dizer o leitor. Pode ser que agora não cairá morto no chão do local de estudo ao realizar seu compromisso. Mas devemos lembrar que a obrigação imposta para o período de descanso não permite o relaxamento da mente, objetivo maior do ócio.
Tal fato ocorre porque em nossa sociedade atual, pós-moderna, ou o que venha depois de “pós”, quem sabe “pré”, o ócio parece ser considerado um crime, logo, logo inserido no código penal brasileiro.
Hoje em dia, temos medo de dizer que não estamos fazenda nada, porque há uma cobrança socio-laboral-intelectual de que devemos produzir o tempo todo, se possível para isso, que reduzamos até horas de sono, quanto mais de descanso, de momentos de preguiça e vadiagem, como o ócio é interpretado por muitos.
O ócio é fundamental para o descanso físico e mental e a reorganização do pensamento. Mas o ócio não significa ficar prostrado vinte e quatro horas em cima da cama ou no tapete da casa. O temido ócio é o momento de relaxar com atividade prazerosas, fazer aquilo que normalmente não há tempo para fazer no período de trabalho ou de aulas, é dedicar mais tempo aos hobbies preferidos e, em muitos momentos, só ficar pensando à sombra de uma árvore.
O sociólogo italiano Domenico de Masi criou o conceito do ócio criativo, título de seu livro, onde evidencia como a satisfação pessoal no dia a dia aumenta a criatividade, que por sua vez faz crescer o potencial de imaginação necessário a um melhor desempenho produtivo no trabalho. “Existe um ócio alienante, que nos faz sentir vazios e inúteis. Mas existe também um outro ócio, que nos faz sentir livres e que é necessário à produção de ideias, assim como as ideias são necessárias ao desenvolvimento da sociedade”, relata Domenico, em seu texto.
A etimologia, ciência que trata da origem das palavras, diz que o vocábulo “negócio” indica a “negação do ócio”, ou seja, uma empresa ou algo que ocupa alguém. Assim, podemos concluir que as férias, ao menos atualmente, não existem para se fazer negócio, seja ele financeiro ou escolar. Então não serve para negar o ócio, mas abraça-lo.
Os professores e instituições escolares devem pensar sobre isso e os pais devem executar e propor o ócio, como forma de descanso, de passatempo, de instrumento de criatividade, colocando para seus filhos-alunos esse comportamento como uma lição de casa.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com