O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou na noite desta terça-feira (1) a libertação do motoboy André Andrade Mazzete, de 29 anos, preso após uma suposta tentativa de roubo a um policial militar no Tremembé, na Zona Norte de São Paulo na última sexta-feira (28).
A abordagem do soldado da PM Felipe da Silva Joaquim, de 30 anos, foi gravada por vizinhos do bairro e mostram o motoboy sendo agredido e xingado pelo policial, que diz ter sido vítima de uma tentativa de roubo pelo acusado. Nas imagens, o motoboy nega o crime e afirma que parou a moto apenas para fumar.
Por causa do vídeo que circulou nas redes sociais, a Polícia Militar de São Paulo afastou o soldado das atividades de rua nesta segunda-feira (31), enquanto a Corregedoria investiga a ação contra o motoboy, que foi preso em flagrante e levado para o Centro de Detenção Provisória (CDP) do Belém, na Zona Leste da capital.
Ao determinar a soltura de André Andrade Mazzete, a juíza Tania da Silva Amorim Fiuza disse que as informações apresentadas pelo PM na ocorrência são conflitantes e não justificam a manutenção da prisão do motoboy.
“Desta forma, diante das informações conflitantes nos presentes autos, não é cabível a manutenção da prisão do averiguado, visto que há fundadas duvidas sobre a materialidade da suposta tentativa de roubo”, disse a juíza.
A Corregedoria da Polícia Militar informou que vai analisar ovídeo que mostra Felipe agindo com truculência contra o motoboy. O advogado de André Mazzete pede que o soldado seja investigado por abuso de autoridade e falsa comunicação de crime.
Outros vídeos
O Ministério Público (MP) e a Secretaria da Segurança Pública (SSP) também analisam outros vídeos de abordagens feitas e gravadas pelo soldado Felipe da Silva Joaquim nas atividades de rua.
O soldado participa de um canal nas redes sociais com mais de 300 mil inscritos, onde abordagens policiais são filmadas pelos próprios PMs. Segundo um especialista ouvido pela reportagem do SP1, policiais que filmam abordagens sem autorização da corporação e divulgam as imagens nas redes sociais podem responder por crime de invasão de privacidade .
Vídeos de abordagens
O Ministério Público e a pasta da Segurança informaram que também vão avaliar se esses outros vídeos infringem alguma lei. Para um especialista em segurança pública ouvido pela reportagem, os vídeos gravados por PMs e postados em suas redes sociais ferem a privacidade do cidadão. Mas não são fiscalizados pela corporação.
“Existem algumas pequenas regras de mídias sociais e entra no código disciplinar de uma forma geral, mas a aplicação disso tem sido bastante leniente”, disse Rafael Alcadipani, professor da FGV e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O soldado Felipe tem mais de 377 mil inscritos no seu canal de vídeos de perseguições policiais no Youtube, intitulado Rocam Zona Norte. Rocam é a sigla para Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas da Polícia Militar. Não é uma página oficial da corporação. Lá tem abordagens gravadas por uma câmera acoplada em seu capacete.
Além do soldado, outros PMs também postam filmagens de perseguições, nem sempre protegendo a imagem e identificação dos suspeitos e de outras pessoas, a maioria moradores de comunidades.
Os vídeos postados por Felipe na página não estão mais no ar. A rede social dele no Instagram, que era pública e tinha centenas de seguidores, foi fechada somente para convidados.
O que diz o PM
Foi justamente numa postagem na internet que o policial militar negou que tivesse agredido o motoboy.
“Agora a pessoa tenta me roubar e eu recebo isso? Agora me fala no vídeo onde eu agredi ele? Em todo vídeo eu segui nosso treinamento”, informa Felipe no Instagram. A reportagem não conseguiu localizar o soldado para comentar o assunto.
Peritos e especialista em segurança ouvidos pelo G1 divergem do soldado. Eles analisaram as imagens e apontaram ao menos oito falhas que podem ter sido cometidas pelo policial militar de folga durante abordagem.
Nas imagens é possível ver o policial apontar a arma em direção a cabeça de André e dizer “um tiro na sua cara”. O suspeito estava desarmado e rendido, dizendo que havia usado droga em frente sua motocicleta, depois de ter feito uma entrega.
Motoboy
André compete como lutador de jiu jitsu e trabalha como entregador para complementar a renda. Ele já tem uma passagem criminal anterior por receptação de carro irregular. Foi condenado por esse crime em 2013, chegando a cumprir a pena com medida restritiva.
O soldado ainda arrasta o motoboy até a calçada, chuta suas costas e bate com o cano da arma na cabeça dele. Além disso, Felipe ofende o suspeito com palavrões até a chegada de uma viatura da PM, que levou André para um hospital e para a delegacia, onde foi indiciado por tentativa de roubo a veículo. O registro policial não é claro, mas ele teria tentado roubar a moto do PM, segundo o boletim de ocorrência.
O soldado acusou o motoboy de fingir que estava armado para tentar assalta-lo na Rua Marco Rutini. Felipe falou à Polícia Civil que sacou a arma e se identificou como policial. E que os dois entraram em luta corporal, quando André tentou pegar a pistola dele. E que devido a isso os dois se machucaram. O motoboy tem um ferimento na cabeça.