O juiz da 6ª Vara Cível de Rio Preto, Flávio Dassi Vianna, autorizou a travesti Rachel Silveira, 36 anos, a usar nome feminino em todos os seus documentos.
Na certidão de nascimento, porém, o sexo permanece masculino. É a primeira decisão desse tipo na cidade e uma das pioneiras no Estado de São Paulo, de acordo com o Grupo de Amparo ao Doente de Aids e Hepatites Virais (Gada), que ingressou com a ação. Diferentemente de transexual, travesti aceita conviver com o sexo de nascença. Rachel, por exemplo, disse que não pretende fazer cirurgia de mudança de sexo.
O pedido da alteração do nome, segundo o advogado da entidade Neimar Leonardo dos Santos, baseou-se na Lei de Registros Públicos, que concede o direito a mudar o prenome quando este expuser o indivíduo a constrangimento. “Se a pessoa se apresenta como mulher, se veste como mulher e, em muitos casos, aparenta ser mulher, como pode ser chamada como homem?”, questiona o advogado.
À Justiça, Rachel (ela diz que pronuncia-se “Rêitchel”) afirmou que “desde criança foi diferente dos outros meninos, pois se sentia e se via como sendo do sexo feminino e que tal sensação permanece até os dias de hoje”. O argumento foi acatado pelo juiz. “O pedido merece deferimento, como, aliás, preconizaram psicólogos, assistente social e o promotor de Justiça”, disse o magistrado na breve sentença.
A decisão foi publicada em setembro, mas só transitou em julgado – quando não há mais possibilidades de recursos – no fim de dezembro, já que o Ministério Público não recorreu. Para Rachel, batizada com o nome de José Augusto Silveira, a decisão põe fim a uma sucessão de constrangimentos. “Já sofremos muito preconceito por nossa condição. Todo mundo pensa que travesti é prostituta e drogada. O nome masculino só agrava essa situação. Uma vez estava em um processo de admissão profissional quando a moça me chamou pelo nome do meu RG. Quando me levantei, todo mundo olhava, comentava. Foi vexatório”, disse.
Para o coordenador do Gada, Fábio Takahashi, a decisão judicial reforça a luta dos travestis para serem reconhecidos como gênero. “A Justiça brasileira tem se mostrado mais aberta a essas questões”, disse. Decisões judiciais como a que beneficiou Rachel ainda são raras no País – há casos já divulgados apenas no Rio Grande do Sul e Paraíba. “É possível que haja outras sentenças do tipo, mas, como esses casos tramitam sob segredo judicial, a sociedade não toma conhecimento”, disse.
Rachel, que trabalha como agente de saúde, cabeleireira, maquiadora e transformista, já enviou o mandado judicial ao Cartório de Registro Civil de Janiópolis, norte do Paraná, onde ela nasceu. Na próxima semana ela deve receber sua nova certidão de nascimento, já com o novo nome. Com o documento, poderá alterar sua carteira de identidade e CPF. “Meus problemas com meu nome de batismo acabaram. Agora é vida nova”, comemora.