A irritação é um estado de espírito, não exclusivo do ser humano, no entanto,melhor visível nesse animal, porque convivermos com ele por muito mais tempo do que com os demais.
Se for passageira, manifestando-se ocasionalmente nos momentos de mauhumor, a irritação será apenas uma disposição emocional circunstancial, quando somos incapazes de controlar uma situação ou a nós mesmos.
O mau humor constante, quando não é algo de momento, mas se estende por longos período, às vezes para vida toda e inteira, é característico da irritação crônica, ou do que chamamos de pessoa chata.
Acredito não me enquadrar na segunda definição de irritação, mas sou chato, ao menos ocasionalmente. Tenho melhorado, deixando de lado a chatice provocada por coisas insignificantes, situações efêmeras e seres de alma pequena.
Continuarei na jornada incessante, se não infinita, de busca do autoconhecimento, tentando me irritar o menos possível, ou melhor, ser menos chato com quase tudo que não vale a pena.
Contudo, existem situações que são próprias do irritar, de vez em quando enervantes e, ainda que sejam desculpas para meu estado de espírito e para minha chatice incrustrada, têm coisas que me irritam quase que profundamente, as quais listarei abaixo.
Motoristas que dirigem em avenidas com duas pistas de rolamento e andam entre elas, bem em cima da faixa pontilha. O pior de tudo é que esse tipo de condutor faz a obra descrita andando a vinte quilômetros por hora, nem vai nem deixar que está atrás dele ir. Isso me irrita tanto, talvez porque eu só ande apressadamente, que pretendo escrever um texto falando exclusivamente do assunto ou dessa típica figura urbana.
Pessoas que jogam lixo ao chão. Aliás não sei qual delas me irrita mais, aquelas que atiram seus resíduos sólidos aos próprios pés, estando a poucos passos, se não apenas um, da lata de lixo, ou aqueles que atiram pelas janelas dos automóveis latinhas, embalagens, papeis de bala, bitucas de cigarro, restos de cérebros e demais matérias descartáveis, deixando-os espalhados pela via pública.
Pessoas que estão em frente a minha mesa de trabalho e ficam lendo o que está escrito nos papéis sobre a mesa, quando não pegam na mão para ler melhor, dando-se além dessa liberdade, ou seria apropriado dizer invasão, o disparate de fazer perguntas sobre o assunto, e além, dar opinião ou inquirir sobre aquilo que sequer lhes diz respeito.
Coisas que não funcionam quando a esposa põe a mão. Suponho que deva ser uma maldição lançada sobre as mulheres ou talvez opostamente um dom divino que lhe dá a capacidade e extrema habilidade de irritar o esposo. Andei pesquisando informalmente e descobri que o fato não acontece só com a minha, mas com as esposas dos amigos. É curioso como qualquer aparelho inventado pelo ser humano, e vem trabalhando perfeitamente, não funcione quando a esposa coloca a mão.
A frase que mais ouço em minha casa depois de “você não me ajuda” é a afirmação “isso não funciona”, ainda que eu tenha acabado de usar o bendito aparelho que ela está tentando ligar. O mais misterioso ainda é que o tal aparelho, ou qualquer outra coisa que necessite de energia elétrica ou humana, que não estava funcionando na mão da esposa, liga ou executa imediatamente a tarefa para qual foi fabricado quando está na mão do marido.
Fenomenal é a interjeição mais adequada para expressar o que acontece nesse momento, especialmente porque a palavra é derivada de fenômeno, no caso, paranormal, porque não se sabe como as esposas conseguem excepcional proeza.
A lista irritante é longa e não cabe no espaço que a mim é reservado, nem parece ser atrativo tantos exemplos de chatice. Acho que basta para ilustrar as irritações que me perseguem diariamente, com maior ou menos grau, pouca ou mais duração, dependendo do momento, local, ou situação que ocorram.
Pensando melhor, pode ser que eu as persiga, pode ser que eu queira controlar todas as situações, pode ser até que seja meu carma ou minha condição de atração dos contextos de irritação.
Seja como for, o que mais me irrita mesmo é ficar irritado. Sem dúvida isso está no topo da lista, mas deixei para o final para não revelar meu segredo logo no início e assim deixar o texto mais irritante ainda.
O fato é que, quando ocorrem as irritações, quando estou no estado de chatice e me torno um chato de plantão, na maior parte das vezes comigo mesmo, existe um desejo que sempre dá um grito mudo lá no fundo do meu ser dizendo: pelo amor de Deus, tira eu de perto de mim.
Sérgio Piva
s.piva@hotmail.com