Os incêndios no Pantanal intensificaram a migração de araras-canindé para a região Noroeste Paulista neste ano. As aves, que já são vistas com frequência pela região, agora estão aparecendo em maior número, segundo moradores de Santa Fé do Sul, Pereira Barreto e Jales. Biólogos ouvidos pelo Diário apontam a possível fuga dos focos de incêndio na região Centro-Oeste como uma das causas desse massivo aparecimento.
O fotógrafo Alan Souza observa há mais de 15 anos as aves em Santa Fé do Sul e notou o maior aparecimento nesse ano.
Junto de um primo e outro amigo, eles montaram um projeto para construção de ninhos artificiais para as araras, ficando conhecidos na região como os “guardiões das araras”.
“O aumento das aves por aqui é notório, a cada temporada que passa aumenta mais. Do início do projeto até agora podemos dizer que teve um aumento grande, não só pela oportunidade e ajuda que damos a elas para se reproduzir em ninhos artificiais, mas acredito muito pela falta de habitat e alimento na própria natureza. Em Santa Fé, temos o privilégio de receber as araras para sua reprodução e também espécies migratórias que passam por aqui, param para se alimentar e continuam suas viagens”, disse Souza.
Segundo a diretora de meio ambiente de Pereira Barreto, Sandra Yukie Seki Perozim, pelo frequente aparecimento, as araras-canindé se tornaram atração na cidade.
“Temos feito o plantio de palmeiras específicas ao redor da cidade que geram frutos pra elas. Além disso, estamos tentando confeccionar ninhos artificiais. As aves já viraram um patrimônio da cidade”.
As araras-canindé migram, principalmente, em busca de alimento. Costuma deslocar por grandes distâncias durante o dia e alimentam-se basicamente de sementes, frutas e nozes. Constroem seus ninhos em troncos de grandes palmeiras, entre 10 e 25 metros de altura, colocando em média dois ovos, que são incubados em até 26 dias.
“Essas aves se alimentam muito dos frutos que dão em algumas palmeiras que são frequentes de ser encontradas na região. Isso atrai muito elas”, indicou o biólogo do zoológico de Rio Preto, Samuel Villanova Vieira.
Segundo o ornitólogo do Instituto Florestal de São Paulo, Alexander Zamorano Antunes, o Noroeste Paulista apresenta uma vegetação que atrai a espécie.
“Nos últimos anos, essas araras começaram a aparecer muito nas praças das cidades e até na arborização urbana. Se alimentam muito de coco verde e também de outros frutos. Outro fenômeno que incentiva essa migração é que essas cidades têm muitas palmeiras. A própria altura benecia para que as araras façam ninhos”.
A espécie pode ser encontrada da Amazônia até o Paraná, mas com predominância no Centro-Oeste, Noroeste Paulista e na região do Triângulo Mineiro. Especialistas também destacam que essas aves podem ser vistas em outros países, como no leste do Panamá, norte da Colômbia, Venezuela, Peru e Bolívia.
“Em uma semana essas araras podem percorrer uma distância de mais de 300 quilômetros. Naturalmente, elas têm a capacidade de fazer voos longos sem pousar e isso ajuda nessa locomoção”, falou Antunes.
O biólogo da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), João Batista de Pinho, está estudando os impactos dos incêndios no Pantanal para as diversas espécies que vivem nos locais atingidos pelas chamas.
“Essa migração para o Noroeste Paulista tem muito a ver com a queimadas. Isso porque essas araras têm a capacidade de voar por um bom tempo. Como o Pantanal está queimando, elas vão procurar recurso e acabam indo para outras regiões. E como o fogo está fora de controle, as aves que têm capacidade maior de voo escapam. Agora as que não têm capacidade de voo perecem”, diz.
Além da palmeiras, Pinho ressalta que, com o desmatamento, cada vez mais a espécie tem procurado áreas abertas para se alimentar.
“Não é natural elas se alimentarem em áreas abertas, mas estão se alimentando por falta de recurso natural, por conta do desmatamento”. O ornitólogo Zamorano arma também que os incêndios no Pantanal gerarão impactos a longo prazo. “A questão dos incêndios é que os filhotes, mesmo não sendo atingidos pelas chamas, podem morrer nos ninhos devido à toxicidade da fumaça. Isso gera todo um impacto no futuro da espécie”, indicou.