A cada dois dias, pelo menos uma pipa com linha de cerol (mistura de pó de ferro ou de vidro com cola) é apreendida em Rio Preto.
De janeiro a julho deste ano, foram 110 flagrantes feitos pela Guarda Municipal. Mas a punição é igual a zero. A lei municipal 10.842 prevê multa de meio salário mínimo para os infratores. A impunidade incentiva o abuso de adolescentes, crianças e até adultos, principalmente na região Norte da cidade. Dados da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL) mostram que neste ano foram 56 casos de interrupção de energia por causa de acidentes com pipas, que resultou em prejuízo para 12,1 mil casas.
O dano não é só material. O mototaxista Júlio Rodrigues, 51 anos, já sentiu na pele. Após enroscar a mão em uma linha cortante na avenida Philadelpho Gouvêa Neto, ele perdeu os movimentos do dedo mínimo da mão esquerda. “Quase perdi o dedo. Ele chegou a ficar pendurado. Os médicos conseguiram emendar, mas como perdi o nervo não sinto mais o dedo. E o pior, não sei nem que foi o responsável por isso”, diz. Pior aconteceu em 2010, no mês de novembro, com o motociclista André Pietro, de 30 anos. Ele morreu após ter o pescoço cortado pela linha que estava presa aos fios de alta tensão no condomínio Estância Quinta do Golfe.
Esta semana, na praça que fica às margens da avenida Mirassolândia, no residencial Ana Célia, a reportagem flagrou pelo menos cinco pipeiros usando cerol. “Sabemos que é errado, mas se não utilizarmos os outros moleques que usam cortam a nossa pipa”, diz G.B., 13 anos. Os amigos preparam a mistura na casa de um deles, amarram a linha entre os postes da rua para passar o produto e esperam secar. “A gente disputa para ver quem tem o melhor cortante”, diz A.S.C., 14 anos.
De acordo com chefe da Guarda Municipal, José Duarte Dias, os guardas priorizam a orientação para acabar com a prática, mesmo não surtindo efeito. Na avenida Solon da Silva Varginha, uma viatura chegou a ser apedrejada pelos “pipeiros” no mês passado e a Guarda precisou de apoio da Polícia Militar para realizar a fiscalização.
“Na maioria são pessoas pobres, que não têm condições de pagar multa. Não queremos ser hostis, mas esse vai ser o único jeito”, afirmou. A lei municipal prevê multa de meio salário mínimo para o infrator. Se ele for menor, os pais são penalizados. Já lei estadual 10.017/98 proíbe a fabricação e a comercialização da mistura de cola e vidro moído utilizada nas linhas para pipas, sob pena advertência ao estabelecimento infrator e, no caso de reincidência, de fechamento.