Foram necessários 10 anos para que a Justiça chegasse à conclusão de que não existiam provas para condenar um jovem de 29 anos e mantê-lo preso.
O servente de pedreiro e ajudante de entregas, detido em 2004 por acusação de latrocínio, ganhou a liberdade em 2014 após revisão do seu processo de condenação em São Paulo. Agora, ele diz que quer reconstruir a vida.
O homem pediu para não ter a identidade revelada e emitiu declarações através da Defensoria Pública, órgão que moveu o recurso de revisão criminal. Réu primário, o jovem havia sido condenado a 23 anos e quatro meses de prisão em decisão de 1ª instância, confirmada em 2ª instância no ano de 2006, quando não cabia mais recurso.
Os acusadores o imputavam participação em um roubo seguido de morte registrado na zona leste de São Paulo. Outras cinco pessoas fariam parte de uma quadrilha que planejou o roubo e disparou um tiro que matou o proprietário de um estabelecimento. No pedido que reabriu o caso, cujo mérito foi atendido pelo Tribunal de Justiça, a Defensoria sustentou que não existiam provas para a condenação.
Para o órgão, a condenação ocorreu em “meros indícios” apresentados durante a fase de inquérito policial e que não foram comprovados judicialmente. “Nenhuma das quatro testemunhas-chave do processo reconheceu José como autor do crime: dois funcionários identificaram apenas três outras pessoas, que entraram na loja, e dois pedestres não reconheceram qualquer dos réus, pois os viram de costas”, informou a nota do órgão.
Outro réu que respondia pelo crime e teria sido autor do disparo confirmou no processo que havia se encontrado com os demais membros da quadrilha, mas não houve menção ao homem agora inocentado.
O recurso foi movido pela defensora Maria Carolina Pereira Magalhães. Em nota, ela destacou a importância da decisão. “Esse é um tipo muito raro de decisão, especialmente considerando-se a gravidade em abstrato do crime e a extensão da pena aplicada e mantida após recurso. É uma vitória da defesa na luta pela aplicação do devido processo legal”, declarou.
Reconstrução. À Defensoria, o homem disse ainda não ter se acostumado à vida fora da cadeia e quer agora reconstruir a sua rotina. “Minha mente ainda não está boa aqui fora. Minha família até quer me ajudar a passar num psiquiatra. Tem coisas em que eu me perco ainda”, disse. Livre, o jovem relatou já ter tirado o RG e CPF novos, e ainda busca o título de eleitor.
Em junho, o jovem deixou a Penitenciária de Flórida Paulista, unidade localizada no oeste do Estado. O presídio tem capacidade para 844 pessoas, mas abriga hoje mais que o dobro: 1.782. Antes, ele havia passado pelo Centro de Detenção Provisória de São José do Rio Preto e nas Penitenciárias de Presidente Bernardes e de Junqueirópolis, todas no interior de São Paulo.
À Defensoria, o homem relatou que na prisão passava a maior parte do tempo jogando bola, vendo televisão e no trabalho como faxineiro ou costurando bolas. O tempo era aproveitado também para a leitura de livros religiosos e de autoajuda sobre estresse e depressão. Ele cursou o ensino fundamental até a 8ª série.