Embora tenha determinado o retorno de todos os alunos às aulas presenciais a partir desta segunda-feira (18), o governo de São Paulo gastou apenas 20% da verba total para reforma e melhoria estrutural das escolas prevista para este ano.
A gestão estadual determinou retorno obrigatório de 100% alunos na rede estadual, mas apenas 24% das escolas têm condições físicas de atender a todos com distanciamento.
De acordo com a execução orçamentária estadual, dos R$ 576,3 milhões que foram aprovados para melhorias físicas e manutenção de escolas em 2021, apenas R$ 114,1 milhões foram liquidados.
A verba faz parte do “Escola Mais Bonita”, programa anunciado em 2019 pela gestão João Doria (PSDB) com investimento de R$ 1,1 bilhão para reformas estruturais nas escolas ao longo de três anos (até 2021).
Em 2019, o g1 revelou que um grupo de professores pediu ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para investigar uma orientação da gestão do governador João Doria (PSDB) de pintar 40% da fachada de 2,1 mil escolas estaduais do estado de azul e amarelo, as cores do partido dele.
Nas fachadas, além do branco, era exigido que as cores azul e amarela sejam destacadas, sendo 30% azul e 10% amarelo
Durante a pandemia, o programa foi readaptado para atender também as necessidades de infraestrutura sanitária. A dois meses do fim do prazo anunciado, foram investidos R$ 618 milhões, pouco mais de metade do total (56%).
A Secretaria Estadual da Educação argumenta que, apesar da baixa execução orçamentária do “Escola Mais Bonita”, os reparos nas unidades foram garantidos devido ao repasse direto de verbas para as escolas por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola Paulista (PDDE).
“Temos duas ações orçamentárias com foco na melhoria das estruturas das escolas: o “Escola mais bonita”, que são obras mais complexas, e o recurso do dinheiro direto na escola. Já foi liquidado R$ 1,1 bilhão em 2021 do PDDE. E é com esse recurso que as escolas fazem melhorias nos banheiros, no refeitório, na ventilação nas salas de aula”, disse ao g1 a secretária executiva da pasta, Renilda Peres.
De acordo com Renilda, o programa “Escola mais bonita” depende de licitações e processos mais complexos, que sofreram atraso por conta do contexto da pandemia. “O programa será executado 100%, provavelmente ultrapassando 2022 por causa desse contexto”, afirmou.
Sem distanciamento e limpeza
A secretária disse ainda que todas as escolas receberam recursos do PDDE, que foram suficientes para as melhorias que permitem o retorno seguro dos alunos.
No entanto, o sindicato dos professores e funcionários ouvidos pela reportagem afirmam que algumas escolas ainda não têm condições adequadas. Entre os problemas citados estão falta de ventilação, falta de pias para lavagem das mãos, limpeza regular do ambientes e capacidade nos refeitórios para evitar aglomerações.
É o caso da Escola Estadual Guilherme Giorgi, na Zona Leste da capital paulista, onde os estudantes convivem com uma reforma ainda em curso. Segundo funcionários, as obras não incluem adaptação sanitária e o barulho constante atrapalha o andamento das aulas.
“A reforma foi feita só para embelezar a escola, mas ele não é funcional. Os professores não têm uma copa e ficam todos juntos em uma salinha pequena. O refeitório também não permite distanciamento entre os alunos, justo no momento em que tiram a máscara para comer. Não tem ventilação suficiente nas janelas e a gente é proibido de ligar o ventilador por causa do protocolo”, disse um professor que pediu para não ser identificado.
Os também alunos reclamam de falta de limpeza no chão e nas carteiras.
Em nota, a Secretaria da Educação afirmou que as denúncias “não procedem”.
“A unidade conta com três funcionárias para fazer a limpeza da unidade e manter a organização. A unidade está seguindo todos os protocolos sanitários determinados pelas autoridades de saúde, incluindo manter janelas e portas abertas para ventilação dos ambientes”, diz o texto.
Retorno obrigatório
De acordo com a Secretaria da Educação, a princípio, a volta de 100% dos alunos será obrigatória apenas nas escolas capazes de manter o distanciamento de 1 metro entre as carteiras sem a necessidade de revezamento de alunos. A pasta admite que só 24% das escolas estaduais estão aptas a receber todos os estudantes.
A partir de 3 de novembro, o distanciamento não será mais necessário e o retorno deverá ser total na rede estadual. A exigência também vale para as escolas privadas, mas elas terão prazos definidos pelo Conselho de Educação para se adaptarem. No caso das municipais, a maioria das prefeituras tem autonomia para decidir.
O uso de máscara por parte de estudantes e funcionários permanece obrigatório para todos.
“A educação precisa ser prioridade da sociedade. Fizemos todos os investimentos necessários para o cumprimento dos protocolos”, afirmou secretário da Educação, Rossieli Soares, em coletiva de imprensa na quarta-feira (13).
Sindicato é contrário
O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) considerou a medida do retorno obrigatório “desnecessária, descabida e perigosa”.
Na avalição da Apeopesp, as escolas não têm condições de cumprir os protocolos de segurança contra a Covid.
O sindicato ainda alega que em diversas instituições não há funcionários de limpeza para garantir a higienização das unidades.
Unesco é favorável
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) disse que apoia a volta do ensino 100% presencial e obrigatório nas escolas.
A Unesco não tem dúvidas de que este é o momento de reabrir as escolas, especialmente considerando os prejuízos do ensino à distância na aprendizagem.
“Nada substitui o ensino presencial e sabemos que muitos alunos e famílias tiveram problemas de conectividade e nos equipamentos para o ensino hibrido. As populações vulneráveis não têm condições de comprar pacotes de dados e o suporte não foi suficientemente bem estruturado no Brasil, apesar do esforço das secretarias de Educação. A Unesco vêm alertando para a catástrofe que o ensino à distância pode causar na aprendizagem, com perdas educacionais muito expressivas, inclusive no processo cognitivo”, disse Marlova Noleto, diretora e representante da Unesco no Brasil.
Histórico
Em setembro do ano passado, o estado retomou as aulas presenciais durante a pandemia, mas manteve um percentual limitador de 35% dos alunos matriculados por dia.
Durante a fase emergencial, em março deste ano, as instituições ficaram abertas apenas para acolhimento de crianças em situação de maior vulnerabilidade e oferta de merenda.
Em abril, as escolas foram liberadas para voltar a receber alunos, desde que mantendo a capacidade máxima de 35%.
No início de agosto, o governo estadual liberou o retorno às aulas presenciais com 100% ocupação respeitando os protocolos sanitários, o que em algumas unidades exigiu revezamento de grupos. Apesar da autorização, o envio do estudante para a sala de aula era facultativo aos pais.