Laudos do Departamento Médico Legal do Espírito Santo confirmam lesões em pelo menos 72 detentos que estavam na Casa de Custódia de Viana quando policiais da Força Nacional de Segurança foram deslocados para o Estado para fazer a guarda emergencial da unidade. Os agentes estão entre os suspeitos na investigação do Ministério Público.
Essa é a primeira acusação oficializada de espancamentos e tortura envolvendo policiais da FNS, criada em 2004 pelo governo federal para atuar nos Estados em situações de crise.
Dos feridos, 71% tinham lesões na parte posterior do corpo –costas, nuca e glúteos– ou em regiões que sugerem que estariam tentando se defender quando foram atingidos –antebraço, mãos, cotovelos–, e não se colocavam em posição de confronto.
Nos casos mais graves, um detento perdeu a visão do olho esquerdo, outro teve o maxilar fraturado e pelo menos três apresentavam ferimentos por arma de fogo.
Presos e familiares apontam homens da FNS e policiais militares locais como os agressores. Ao Ministério Público, os comandos das duas operações negaram os abusos.
Os exames de corpo de delito dos presos na Casa de Custódia de Viana (39 km de Vitória) foram realizados nos dias 7, 8 e 10 de julho de 2006. Vinte dias antes, homens da FNS chegaram ao Estado com a missão de atuar no sistema prisional, que passara por várias rebeliões.
Os policiais da FNS foram direto para a Casa de Custódia e assumiram a segurança da unidade –que abrigava mais de mil presos em um lugar com capacidade para 375. Boa parte dos detentos foi trazida da penitenciária de segurança máxima, no mesmo complexo, destruída em uma rebelião.
Os relatos de tortura referem-se a essa transferência dos presos, realizada pela PM do Estado, e aos primeiros dias na Casa de Custódia, quando a FNS já tinha assumido a segurança do local –no total, 170 homens da FNS permaneceram no Estado por cem dias.
Segundo o padre Xavier Paolillo, vice-presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana, presos relataram agressões cometidas por agentes da FNS, incluindo choques elétricos. “Infelizmente, naquela época, ninguém acreditou nas denúncias”, disse.
Depois da denúncia feita por entidades que integram o Comitê Estadual de Erradicação da Tortura do Espírito Santo, promotores pediram os exames. Os laudos foram enviados ao Ministério Público no final de 2006. Dos 83 documentos que a Folha teve acesso, 72 confirmam as lesões.
O promotor Cézar Ramaldes Santos, coordenador do Getep (Grupo Especial de Trabalho em Execução Penal), responsável pela investigação, afirma que os laudos atestam as lesões, mas só os depoimentos devem esclarecer se houve tortura e quem foram os autores.
Segundo Santos, o grupo deve finalizar o relatório sobre o caso neste mês. Ele confirma que, nos depoimentos, os presos ora acusam policiais da FNS ora os PMs locais.