Em carta aberta divulgada nas redes sociais nesta terça-feira (5), o filho do ator Flávio Migliaccio, 85, Marcelo Migliaccio, 56, afirmou que irá entrar com processo contra o Estado do Rio de Janeiro por divulgar imagens do corpo do ator, encontrado morto em seu sítio em Rio Bonito (RJ) nesta segunda.
As fotos foram tiradas por dois agentes da polícia militar e divulgadas na web pelos autores, segundo Migliaccio. “Quanto aos policiais militares que fotografaram com celular a cena mórbida no quarto do sítio e colocaram a imagem em redes sociais, o Estado do Rio de Janeiro responderá judicialmente por ter pessoas assim a representá-lo”, escreveu.
Segundo explica o advogado da família, Sylvio Guerra, o Estado terá que responder pelas acusações de violação ao direito de imagem e vilipêndio a cadáver, previsto no art. 212 do Código Penal.
“Esses policiais carregam a bandeira do Estado em suas fardas. Além de vilipêndio de cadáver, elencado no Código Penal, buscaremos em face do Estado, danos causados pela absurda, abusiva e mórbida divulgação da foto de meu Cliente Flávio Migliaccio, já falecido, violando sua imagem , o luto da família, amigos e fãs.”
Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar afirmou que “o comandante do 35ºBPM (Itaboraí) instaurou um procedimento apuratório para analisar o caso.”
O advogado Sylvio Guerra afirma que caso a indenização seja reconhecida pela Justiça, o dinheiro será doado pela família do ator. “Foi uma violência, um desrespeito!”
A morte de Flávio Migliaccio foi confirmada como suicídio por seu único filho, Marcelo, segundo quem o pai estava em depressão profunda desde o ano passado. O ator deixou cartas à família.
Nas várias novelas que fez na Globo, o ator ficou conhecido por sua atuação, entre outras, em “Rainha da Sucata”, “A Próxima Vítima”, “Vila Madalena”, “Senhora do Destino” e “Passione”. Pela última novela de que participou na emissora, “Órfãos da Terra”, recebeu o prêmio de ator de TV do ano da Associação Paulista dos Críticos de Arte, a APCA.
Um de seus trabalhos mais recentes de Migliaccio foi no seriado “Tapas & Beijos”, que a Globo exibiu de 2011 a 2015, como seu Chalita, dono de um restaurante árabe em Copacabana. Sua última aparição profissional foi, no entanto, no cinema, no longa independente “Jovens Polacas”, lançado no ano passado.
Leia a carta de Marcelo Migliaccio na íntegra:
“Eu sabia que o meu pai era muito querido pelo Brasil inteiro. O que eu não fazia ideia era do quanto eu tinha amigos, pessoas que ontem e hoje se preocuparam em me dirigir palavras de consolo, de otimismo e de resignação. Ex-colegas de trabalho, das escolas, da faculdade, dos bairros onde morei e muita gente que sequer conheço pessoalmente. Essa é a melhor parte desse capítulo.
Meu pai fez o que fez à nossa revelia. Pegou um táxi e foi para o sítio enquanto eu cuidava da minha mãe no último domingo. Sem nos avisar, sem se despedir. Ele sempre me dizia que não aguentava mais viver num mundo como esse e sentir seu corpo deteriorar-se rapida e irreversivelmente pela idade avançada.
Pouco escutava e enxergava. “Daqui para frente só vai piorar”, ele me dizia enquanto eu buscava todos os argumentos possíveis para lhe mostrar que ainda havia muita coisa boa reservada para ele. Como o prêmio de melhor ator de televisão de 2019, que incrivelmente ele ganhou aos 84 anos de idade. Ou como ver no cinema o documentário sobre sua vida e sua carreira que estamos preparando para breve.
Mas meu pai tinha uma inteligência enorme e era difícil demovê-lo de alguma coisa em que acreditasse. Infelizmente, ele agora é para nós só uma imensa saudade e lembranças maravilhosas. Lembraças de alguém que me ensinou o que é amar um ofício. Alguém que me mostrou a magia da criatividade. Me fez ver que a maior prova de amor que se pode dar a uma pessoa é respeitar suas convicções, suas decisões, seu jeito de ser e de não ser.
Por isso hoje respeito o ato de extrema coragem que meu pai teve na madrugada de ontem, fazendo o que acreditava ser a única coisa a fazer. Tentei impedir de todas as formas, sofro agora, e sofrerei para sempre, por não ter conseguido, mas entendo sua decisão.
Agradeço de coração a todos que me enviaram mensagens. Fizeram um bem enorme a mim e a ele, onde quer que ele esteja nos esperando.
PS: Quanto aos policiais militares que fotografaram com celular a cena mórbida no quarto do sítio e colocaram a imagem em redes sociais, o estado do Rio de Janeiro responderá judicialmente por ter pessoas assim a representá-lo.”