Após o Congresso Nacional aprovar Medida Provisória para reajustar o salário de policiais do Distrito Federal, integrantes da Polícia Civil de São Paulo voltaram a cobrar empenho político do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), para iniciar, ao menos, um debate sobre reajuste e reposição de servidores em todo Estado.
Em meio à pandemia da Covid-19, uma lei federal veda aumento salarial de servidores. No entanto, funcionários da Polícia Civil de São Paulo pressionam deputados na Assembleia Legislativa (Alesp) para que a categoria receba uma maior atenção do governo tucano.
As cobranças também giram em torno de melhor estrutura para o trabalho diário dos policiais. Em recente entrevista, Doria afirmou que as contratações de servidores públicos estão proibidas por meio de um decreto de Jair Bolsonaro (sem partido).
Um parecer do Ministério da Economia, no entanto, diz que contratar servidor para substituir, por exemplo, funcionário que se aposentou, está liberado.
“A pandemia não pode ser utilizada como justificativa para mascarar o que, na realidade, é uma falta de vontade política. Uma falta de vontade política em repor o efetivo da Polícia Civil e uma falta de vontade política de promover uma remuneração justa aos seus policiais”, afirmou o delegado Gustavo Mesquita Galvão Bueno, presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Adpesp).
A situação dentro da Polícia Civil é considerada grave. Isso porque, de acordo com atualização mensal do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), o déficit de servidores da Polícia Civil é de 14.180 postos.
“A responsabilidade da contratação é do governador do Estado de São Paulo. Ele tem possibilidade de fazer isso. Hoje, nós temos aqui, de exemplo, mais de 700 candidatos aprovados em concurso público, remanescentes, que poderiam ser chamados. Bastava uma canetada do governador. E esses policiais eles iriam repor cargos existentes, então não há vedação legal alguma”, diz Bueno.
Histórico
De acordo com levantamento da Associação, a Polícia Civil recebeu 4% de reajuste em 2018, ainda no governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Em 2019, já sob o comando de João Doria, o reajuste foi de 5%. Ambos abaixo da inflação. Pelo índice IGP-M, o reajuste deveria ser, em 2019, por exemplo, de 7,3%. Apenas em 2020, entre janeiro e agosto, 9,64%.
“É uma determinação legal para que todo ano o governo proceda o reajuste, a gente não está falando de aumento, é o reajuste inflacionário, é a correção monetária do salário do policial, do funcionalismo. Enfim, para que o funcionário público preserve o poder de compra. É só isso, e nem isso é feito. A gente não tem reajuste já há muitos anos. O último reajuste que a gente teve, no ano passado, foi de 5%, depois a gente teve uma alíquota, o aumento da alíquota previdenciária, que já absorveu qualquer reajuste que pudesse se falar de 5%”, afirma Bueno.
Ainda segundo o presidente da Adpesp, um reajuste salarial real gira em torno de 100%.
“Sem dúvida, a gente teria um número muito próximo de 100%. Se a gente for pensar no cumprimento da promessa dele (Doria), no compromisso dele falado muitas vezes, manifestado muitas vezes publicamente, de pagar aos seus policias o maior salário do Brasil, sem dúvida a gente teria que dar um aumento, no caso dos delegados, de mais de 100%. Porque hoje nós recebemos menos da metade do primeiro colocado. Então a situação é muito crítica, muito preocupante aqui na Polícia Civil, porque o que eu tenho dito também é que a questão salarial dos policiais civis do Estado de São Paulo ultrapassou uma questão apenas de justiça com o policial, de bem-estar, de dignidade policial”, disse Bueno.
O Estado com maior piso para delegados é o Mato Grosso com pagamento de R$ 24,4 mil, segundo levantamento feito há ano pelo sindicato da categoria. Em São Paulo, 26º colocado entre os Estados e o Distrito Federal, o piso é de R$ 9,8 mil.
Formação
O presidente da Associação de Delegados alerta também para os gastos com a formação de policiais que, posteriormente, acabam buscando empregos em outros Estados. “O governo gasta, gasta bastante, gasta tempo, gasta dinheiro, com a seleção, com a formação dos policiais, que pouco tempo depois deixam a carreira para outros postos mais atraentes, outros estados, outras carreiras e o governo acaba com prejuízo. Então é uma economia que não se justifica nem do ponto de vista financeiro”, disse.
O DLNews questionou a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo sobre reajustes, reposição retroativa e contratação de servidores. A pasta informou que “investe na valorização, ampliação e recomposição do efetivo policial em todo o Estado. A atual gestão reajustou em 5% o piso salarial dos policiais, equiparou o auxílio alimentação dos agentes, além de ter ampliado a bonificação por resultados, que passa a ser bimestral. O número de premiações passará de 4 para 6 por ano para todos os policiais. O governo de São Paulo também autorizou a abertura de mais 2.750 vagas para concursos da Polícia Civil, sendo 250 delegados, 900 investigadores e 1.600 escrivães. Em razão do decreto 64.937, de 13 de abril de 2020, novas contratações estão temporariamente suspensas, a fim de que os recursos sejam destinados ao combate ao coronavírus”.
‘Patrimônio da Sociedade’
O presidente da Associação dos Delegados, no entanto, afirma que a cobrança continuará. “A gente vai continuar a esclarecer, eu acho que a palavra melhor aqui é esclarecer a sociedade, que eu faço questão de frisar. Uma polícia civil fortalecida não é que favorece os policiais, não é que favorece o governador, favorece a sociedade. A polícia civil pertence ao patrimônio da sociedade e da população paulista. E, portanto, não cabe ao governador uma discricionariedade, se ele deve ou não fortalecer a segurança pública, é uma obrigação fortalecer a segurança pública. Fortalecer a polícia civil é um grande passo, é um caminho necessário para gente ver a esperada valorização da segurança pública aqui do Estado”, disse Bueno.