Ainda sem consenso sobre datas, a reabertura das escolas será escalonada em um modelo híbrido. Haverá um misto de atividades a distância, com uso de tecnologia, e aulas presenciais.
A volta já é debatida entre secretarias de Educação. O Consed —órgão que reúne os gestores estaduais— tem se debruçado sobre o tema.
Estão em análises experiências internacionais, exigências sanitárias e cálculos sobre custos. O MEC (Ministério da Educação) não participa do planejamento. O presidente Jair Bolsonaro já defendeu a abertura das escolas.
O fechamento de escolas no Brasil teve início em março. A medida atingiu as redes públicas de todo o país, além das unidades privadas, por causa da pandemia do novo coronavírus.
Para tentar garantir o aprendizado nesse período, secretarias têm lançado mão de atividades pela internet, aulas pela TV e envio de materiais impressos para alunos sem conexão.
Agora o novo protocolo do Consed deverá prever, a fim de evitar aglomerações, um retorno por faixa etária. Desta forma, os alunos mais velhos voltariam às escolas antes —crianças menores que contraem o novo coronavírus costumam passar pela Covid-19 de forma assintomática ou com sintomas leves que passam despercebidos, o que as torna um risco maior de disseminação da doença.
As aulas presenciais deverão ser em dias alternados. Também há estudos para a ocupação dos colégios em turnos.
Nos dias sem atividades na escola —em que haverá outro grupo nas unidades—, os alunos terão atividades online estruturadas. Os sábados também deverão ser contemplados.
“Teremos um documento orientador para as redes e também um protocolo para diretores, sobre os cuidados sanitários”, diz Laura Souza, secretária-executiva de Educação de Alagoas e responsável pelos estudos no Consed.
O órgão reúne dados de países que já iniciaram a reabertura, como a França, e de órgãos como BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Unesco e Sebrae.
A Undime, que agrupa dirigentes municipais de Educação, também trabalha em protocolos.
Agosto é o mês mais provável para o retorno, aproveitando o início do segundo semestre. Porém, a criação de um calendário unificado é considerada inviável, diz o secretário de Educação do Paraná, Renato Feder.
“O que deve ser unificado são questões da metragem [de distância entre alunos], uso de máscara, álcool em gel, e regras para merendas”, afirma.
Para enfrentar a pandemia, o Paraná elaborou um sistema com aulas transmitidas em quatro canais de TV aberta. Há ainda replicação de conteúdos no YouTube e em ambientes virtuais para as turmas. “Quando voltarmos, os professores vão dominar melhor as ferramentas. Acho que a tecnologia vai somar, nunca vai substituir”, diz Feder.
O modelo híbrido entre aulas presenciais e a distância encontra obstáculos, mais evidentes entre os mais novos e também com relação à realidade de exclusão digital.
Nem todas as redes tiveram condições de negociar pacotes de dados, como fizeram Paraná e São Paulo.
A última Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) mostra que 21% dos estudantes de 5 a 17 anos da rede pública não têm acesso à internet, segundo tabulação da Consultoria Idados.
A Folha mostrou que mais de um terço dos alunos de 3º ano do ensino médio de escola pública inscritos no Enem 2018 não tinham internet.
A existência de internet banda larga nas escolas é mais um retrato da desigualdade. Dados do MEC de 2018 mostram que, enquanto 93% das escolas públicas de São Paulo têm banda larga, o percentual
é de 14% no Amapá.
Especialista em tecnologia na educação Nelson Pretto, professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia), diz que não é possível tratar a situação atual como uma “nova normalidade”, uma vez que, sobretudo na educação, nunca houve normalidade.
“A busca pela universalização da educação não foi acompanhada com a mesma intensidade do aumento de número de professores, valorização docente e reforço de infraestrutura”, diz.
O pesquisador afirma que as soluções têm de considerar a diversidade de situações.
“É fundamental não cair nas armadilhas de empresas que vendem soluções tecnológicas como oportunidade de ganhar clientes”, diz. “Se não tivermos conectividade pública, não vamos conseguir nenhuma solução para questões educacionais.”
Por outro lado, diz ele, a pandemia pode ser uma oportunidade para repensar estratégias para educação a partir de agora.
“Não adianta sair correndo para dizer como vai ser a educação amanhã, porque não sabemos como vai ser o amanhã.”
Dirigentes e especialistas são unânimes sobre o prejuízo de não ter o MEC na liderança desses processos —tanto como articulador de questões pedagógicas quanto no financiamento.
Cálculo do Consed estima um custo acumulado até agora de R$ 1,9 bilhão com medidas durante a pandemia. Entram na conta recursos digitais, formação docente e alimentação escolar. A pasta só manteve neste ano os repasses já previstos antes da explosão da doença.
Ausente em ações específicas de enfrentamento à contingência na educação básica, o MEC (Ministério da Educação), comandado por Abraham Weintraub, apenas replicou em nota a mensagem já distribuída em outras oportunidades.
O ministério disse manter diálogo com as redes e citou a criação de um comitê emergencial. No entanto não respondeu qual papel tem desempenhado.
Além dos gastos em cursos, os secretários de Educação calculam que as redes terão, como reflexo da frustração de arrecadação, uma redução de R$ 20 bilhões do dinheiro recebido via Fundeb (principal mecanismo de financiamento da educação básica).
Estudo do Movimento Todos Pela Educação e do Instituto Unibanco indica que a perda para os estados pode chegar a R$ 28 bilhões no ano, a depender do impacto na arrecadação de tributos vinculados à educação.