sábado, 23 de novembro de 2024
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Empresários usam mão de obra infantil em trabalho irregular

O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – que trata basicamente sobre questões relativas à proteção integral da criança e do adolescente em vários aspectos sociais define em…

O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – que trata basicamente sobre questões relativas à proteção integral da criança e do adolescente em vários aspectos sociais define em seu capítulo quinto, no que diz respeito ao direito à profissionalização e a proteção no trabalho de jovens e crianças, quesitos básicos para a atividade profissional voltada ao menor de idade e ao adolescente.

Em trecho transcrito pelo CIDADÃO, é definida pelo ECA a proibição de qualquer trabalho à menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. Além disso, é considerada aprendizagem a formação técnico-profissional os trabalhos que respeitem a garantia de acesso e frequência obrigatória ao ensino regular da criança e do adolescente, ao mesmo tempo em que revela a importância de atividade compatível ao desenvolvimento do adolescente, sem que o horário prejudique o desenvolvimento do mesmo.

Aos adolescentes de até quatorze anos é assegurada bolsa aprendizagem e aqueles jovens que se encontram em idade superior, deverão ter assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários, segundo o Estatuto.

O ECA não permite trabalho noturno realizado entre as vinte duas horas de um dia até as cinco horas do dia seguinte, assim como é ilegal o trabalho de jovens se ele for perigoso, insalubre, penoso, realizado em locais prejudiciais ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral ou social ou que não permita a frequência escolar.

Contrariando algumas das normativas do Estatuto da Criança e do Adolescente, empresários de Fernandópolis ainda realizam o dito “contrato de boca”, não se preocupando com a forma em que a panfletagem comercial de suas empresas é veiculada.

É fácil observar menores que aparentam ter por volta de dez anos de idade, em situação insalubre nos trabalhos por eles praticados. Expostos ao sol, sem qualquer tipo de identificação e correndo risco no trânsito entre os automóveis, eles realizam um serviço que, na teoria, deveria ser passível de regulamentação que assegure seus direitos e principalmente a saúde.

O CIDADÃO entrou em contato com algumas destas empresas e confirmou aquilo que pode ser facilmente observado nas ruas. Não existe uma preocupação dos empresários sobre o assunto, sendo possível perceber a falta de informação dos mesmos quando o tema trata das relações de trabalho voltadas para menores e adolescentes. Em uma das empresas que realizam este tipo serviço, a reportagem do CIDADÃO ouviu do proprietário que: “é fácil conseguir estes meninos para trabalhar. Basta procurar em supermercados da cidade e conversar com algumas pessoas que os jovens passam panfletando o que for necessário pelos bairros e avenidas”.

Também foi apurado pela reportagem que existem dois grupos de “entregadores de panfleto”: os que trabalham de forma autônoma e os que são agenciados por empresários do ramo de publicidade de Fernandópolis. No primeiro caso o CIDADÃO entrou em contato com um menor identificado aqui somente por “M”. Sem qualquer tipo de contrato, conhecimento de seus responsáveis e por um preço irrisório é possível contratá-lo para o trabalho sem maiores dificuldades.

O segundo caso é um pouco mais preocupante. Foi constatado, após conversa com um ex-entregador de panfletos que não quis se identificar, que as jornadas de trabalho para aqueles que trabalham para empresas do ramo são rigorosas. Os jovens chegam a caminhar de 10 a 15 quilômetros diários e o valor ganho pelo serviço é pequeno, em torno de R$ 10.

Além disso, os “agenciadores” ficam com boa parte dos lucros. Segundo o ex-entregador: “No começo era bom poder ganhar meu próprio dinheiro, mas depois disso resolvi sair daquela vida e estudar porque não queria trabalhar em serviços pesados a vida inteira”, enfatiza.

Apesar das duras jornadas, o ex-entregador diz que os “agenciadores” mantinham, por vezes, algumas refeições durante o dia como pão com mortadela e refrigerantes como bonificação.

Em conversa com representantes do Conselho Tutelar de Fernandópolis, foi constatado que o problema é grave e que até mesmo os órgãos competentes possuem dificuldades em lidar com o caso. Os entraves vão desde a reluta dos responsáveis pelos jovens no que diz respeito à aceitação do trabalho irregular destas crianças e adolescentes e até mesmo dos empresários da cidade que, devido a falta de conhecimento, pensam estar dando benefícios a estes jovens sem que isso, de fato, esteja de acordo com a lei.

Em entrevista, Manoel Franco de Souza, Presidente do Conselho Tutelar de Fernandópolis fala sobre o assunto: “O jovem deve partir para a capacitação e ser encaminhado ao mercado de trabalho regularmente. Nós, do Conselho, já debatemos o assunto com empresas da cidade e também com os jovens” diz o presidente.

O CIDADÃO procurou a Vara da Infância e Juventude de Fernandópolis e obteve resposta do Juiz Evandro Pelarin sobre o assunto. Questionado pela reportagem, Pelarin enfatiza que:

“O Poder Judiciário, pela Vara da Infância e Juventude, é favorável ao trabalho de adolescentes. E nós autorizamos, sistematicamente, menores a trabalhar na cidade, em empresas, escritórios em projetos sociais, sempre com um pedido formal dos pais, dirigido ao Juiz da Infância e Juventude, cópia do boletim escolar e avaliação (se necessário) da empresa em que o menor vai trabalhar. Ou seja, o Judiciário só defere trabalho legítimo ao menor, mediante acompanhamento. Até o momento, entretanto, não foi expedida qualquer autorização judicial para menores trabalhar em panfletagem. E também nós, do Judiciário, não recebemos qualquer denúncia formal do Ministério Público, a quem a lei atribui o dever de fiscalizar os trabalhos insalubres de menores, relativa aos casos que a reportagem do CIDADÃO encontrou.

Perguntado sobre a autorização de trabalho para estes jovens Dr. Pelarin afirma: “Nós entendemos que todos os menores de 18 anos devem ser autorizados a trabalhar pelo Poder Judiciário, independentemente do local onde o menor trabalha. Isso porque nós, do Judiciário, podemos requisitar documentos para saber se o menor está estudando, quais as notas dele, se o pai ou a mãe sabe, se o serviço será ou não prejudicial ao menor” enfatiza o juiz.

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