Dois policiais civis abandonam a carreira por dia, em média, no estado de São Paulo desde 2018, aponta levantamento realizado pela Associação dos Delegados de Polícia do estado (Adpesp).
A Polícia Civil de São Paulo enfrenta uma crise institucional por falta de infraestrutura, protestos por melhores condições de trabalho e déficit salarial.
Em dezembro de 2018, a Polícia Civil contava com 29.717 policiais na ativa; já em setembro de 2021, eram 27.524 policiais – uma redução de 2.193 agentes, segundo a associação.
Atualmente, o déficit total é de 15 mil no efetivo do estado, segundo dados da associação obtidos com base em números oficiais via Lei de Acesso à Informação (LAI).
Para a associação de delegados, a queda no número do efetivo da corporação no período contraria uma das promessas de campanha do governador do estado, João Doria (PSDB), que se comprometeu a investir na recomposição da categoria ao assumir o cargo em janeiro de 2019.
A Polícia Civil refutou, porém, em nota ao g1SP, o déficit na categoria, afirmando que “o número apontado não tem qualquer lastro com a realidade, assim como as afirmações sobre a falta de contratações e novos concursos”. Segundo a polícia, a gestão do governador João Doria (PSDB) contratou 2.200 policiais civis, incluindo remanescentes do concurso de 2017.
A associação dos delegados entende, porém, que a Polícia Civil estadual “encolheu”: entre 2015 e 2021, ao todo, mais de 10,8 mil agentes deixaram a instituição – e 7 mil foram contratados após formação na academia.
Veja os números:
Policiais civis aposentados em SP:
2015 a 2020 – 8.596
2021 (até setembro) – 734
Exoneração a pedido:
2015 a 2020 – 848
2021 (até setembro) – 211
Demissões
2015 a 2020 – 248
2021 (até setembro) – 16
Mortes em serviço
2015 a 2020- 20
2021 (até setembro)- 1
Suicídio
2015 a 2020 -55
2021 (até setembro) – 6
Covid-19
2015 a 2020 – 21
2021 (até setembro)- 63
“Sem um planejamento estruturado e factível para recomposição do déficit e valorização dos policiais, o estado está enxugando gelo. Permanecemos formando bons profissionais e perdendo-os para os outros Estados, que remuneram melhor”, entende o presidente da Adpesp, delegado Gustavo Mesquita Galvão Bueno.
Para ele, muitos agentes prestam concursos e acabam se mudando para outros estados devido aos baixos salários pagos em São Paulo e à falta de estrutura para trabalho nas delegacias.
Veja a íntegra da nota da Polícia Civil sobre os dados:
“A Polícia Civil não comenta levantamentos cuja metodologia desconhece. Em relação ao déficit, no entanto, ressalta que o número apontado não tem qualquer lastro com a realidade, assim como as afirmações sobre a falta de contratações e novos concursos. Desde o início da atual gestão, em 2019, mais de 2.200 policiais civis, incluindo remanescentes do concurso de 2017, foram contratados. Outros 2.939 profissionais da segurança pública, sendo 2.750 para a Polícia Civil e 189 para a Polícia Técnico-Científica tiveram suas contratações autorizadas por meio de concurso público, no último mês de outubro. Paralelamente à política de recomposição dos efetivos, o Governo do Estado tem investido na modernização dos equipamentos e armamentos da Polícia Civil. Neste período foram adquiridas mais de 15 mil novas armas, entre pistolas e carabinas, 4.455 novos coletes balísticos, e mil novas viaturas, sendo 105 delas blindadas. Outras 1.600 viaturas estão em processo de compra, com previsão de entrega para 2022.”
Baixos salários
Um levantamento feito pelo Sindicato dos Delegados da Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp) em janeiro deste ano mostrava que o salário dos delegados paulistas é o menor entre todos os estados do país e o Distrito Federal. A remuneração da categoria, de acordo com os dados de dezembro de 2020, era de R$ 10.382,48. A maior remuneração foi registrada em Mato Grosso, com R$ 24.451,11
Em outubro, outro levantamento divulgado pela associação mostrava aumento de suicídios na categoria paulista. Nos primeiros oito meses de 2021, foram seis suicídios, dentre eles o de uma policial mulher, de 36 anos, em Campinas. Os demais policiais que cometeram suicídio neste ano são homens, com idades entre 44 e 62 anos. As mortes deles foram nas cidades de Atibaia, Marapoama, Mogi das Cruzes, São Sebastião e Bauru.
Diante do cenário, policiais civis vêm fazendo manifestações por reajuste salarial. Em outubro, duas foram realizadas em frente ao Palácio da Polícia, no Centro de São Paulo, e próximo ao Palácio dos Bandeirantes, sede do governo da capital.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou, na época, que reajustou, no primeiro semestre de 2021, em 5% o salário dos policiais, ampliou a bonificação dos agentes e deu um pacote de benefícios, além de ter contratado mais de 10 mil policiais e autorizado novos concursos para a contratação de mais agentes.
Problemas de infraestrutura
Em 2019, uma fiscalização do Tribunal de Contas do estado apontou uma série de problemas de infraestrutura e falhas no atendimento em 275 prédios que abrigam delegacias de polícia de todo o estado de SP.
Entre os problemas apontados pelo órgão, estava o fato de que mais da metade da frota das viaturas está sem revisão, 60% das delegacias apresentaram problemas estruturais e 83% não possuem Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros. Havia também infiltrações e vazamentos.