Dois aditivos usados para melhorar a textura e aumentar a durabilidade de alguns alimentos ultraprocessados podem estar associados a um risco maior para doença intestinal inflamatória e síndrome metabólica. É o que sugere um trabalho sobre os efeitos dos emulsificantes polissorbato 80 e o carboximetil celulose em roedores. A pesquisa, realizada por bioquímicos da Universidade da Georgia, nos Estados Unidos, foi publicada na revista científica “Nature”. A investigação constatou que os dois emulsificantes, usados como ingredientes de pães, bolos e biscoitos industrializados, provocaram alterações nas bactérias presentes no intestino dos animais.
Doença intestinal inflamatória refere-se a um grupo de doenças que comprometem a qualidade da nutrição e, consequentemente, o bom funcionamento do organismo. Ela engloba a doença de Crohn, a retocolite ulcerativa (inflamação intestinal) e a colite indeterminada. Já a síndrome metabólica é um conjunto de doenças associadas à resistência insulínica. Entre elas, a obesidade, a diabetes e a hipertensão arterial.
Segundo a nutricionista Ana Lúcia Augusto, professora adjunta do Departamento de Nutrição e Dietética da Universidade Federal Fluminense (UFF), alguns aditivos alimentares já têm sido relacionados a doenças na mucosa do intestino, por serem antígenos em potencial. Isto é, são capazes de estimular o sistema imunológico a uma determinada resposta, como reações de alergia e outros problemas:
“As doenças inflamatórias intestinais, como a doença de Crohn e a colite ulcerativa, são decorrentes de respostas imunológicas alteradas, que possivelmente também ocorrem após a exposição a antígenos, através de mecanismos diversos daqueles que ocorrem nas alergias alimentares. Partindo-se dessas premissas, aditivos alimentares, como corantes, conservantes e emulsificantes, são moléculas bem diferentes daquelas próprias do organismo.
A especialista, que atua na área de Nutrição Clínica Infantil, acrescenta que o fenômeno tem sido observado entre crianças:
“Doenças autoimunes (aquelas em que o organismo ataca a si próprio), como as doenças inflamatórias intestinais, que eram mais prevalentes e mais incidentes em adultos, passaram a ter um aumento de frequência na população infantil, inclusive em menores de 4 anos de idade. Alguns estudos sugerem, mas não comprovam, que o aumento do consumo de alimentos industrializados poderia atuar como auxiliar na instalação dessas doenças.
O desequilíbrio na flora intestinal também seria capaz de interferir na atuação da insulina no organismo e, consequentemente, nos níveis de glicose.
“Os estudos apontam que a composição alterada da microbiota (microorganismos) intestinal poderia estar relacionada à obesidade e ao diabetes.”
A presença de aditivos químicos em alimentos é uma das preocupações da Organização Mundial de Saúde, que este ano elegeu a segurança alimentar como tema do Dia Mundial da Saúde, celebrado em 7 de abril. Um dos aspectos abordados é o excesso de substâncias potencialmente tóxicas acrescidas aos alimentos em diversas etapas de seu cultivo e produção. Com o slogan “From farm to plate, make food safe”, a entidade quer chamar a atenção para os riscos associados aos alimentos ultraprocessados.
Além disso, uma das preocupações é o uso de antibióticos na criação de animais destinados ao consumo humano e o de pesticidas nas lavouras. Em diferentes documentos, a entidade afirma que a “segurança alimentar e nutricional significa acesso equitativo a alimentos de alta qualidade ricos em micronutrientes e contendo quantidades mínimas de aditivos e resíduos químicos (pesticidas, fertilizantes, hormônios e antibióticos) necessários para assegurar a produção sem comprometer a saúde humana”.