sábado, 23 de novembro de 2024
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Brasileiros de renda média pagam mais IR do que os super-ricos

O sistema tributário brasileiro coleciona distorções que impactam os cofres do governo – e o bolso dos contribuintes. Uma delas faz com que os assalariados de renda média paguem mais…

O sistema tributário brasileiro coleciona distorções que impactam os cofres do governo – e o bolso dos contribuintes. Uma delas faz com que os assalariados de renda média paguem mais Imposto de Renda (IR) do que os super-ricos.

No topo da pirâmide social, os contribuintes com renda mensal superior a 320 salários mínimos (o equivalente a R$ 334,4 mil) pagam uma alíquota efetiva de IR de apenas 5,25%. Esse percentual representa o quanto de fato é recolhido em IR como proporção do rendimento total da pessoa.

É praticamente a mesma alíquota daqueles que ganham de cinco a sete salários mínimos (entre R$ 5,2 mil e R$ 7,3 mil) – que são taxados, efetivamente, em 4,91%. E inferior ao percentual observado na faixa de sete a dez salários (R$ 7,3 mil a R$ 10,4 mil), que pagam em Imposto de renda 7,7% dos rendimentos.

Não existe uma classificação oficial para as faixas de renda no Brasil. Entidades e órgãos de governo utilizam dados diferentes nesse cálculo.

Os números foram calculados pelo Sindifisco Nacional, sindicato que reúne os auditores da Receita Federal, com base nos dados da declaração de Imposto de Renda de 2021, referentes ao ano-calendário de 2020. Por esse motivo, foi considerado o valor do salário mínimo de 2020.

“É exatamente o contrário do que deveria ocorrer. São os que podem pagar menos (Imposto de Renda), pagando mais, e os que podem pagar mais, pagando menos”, afirma Isac Falcão, presidente do Sindifisco Nacional.

Alíquota sobe – e depois desce
A análise detalhada do IR mostra que a a faixa de renda em que a cobrança do tributo é maior é entre aqueles que ganham de 20 a 30 salários mínimos (entre R$ 20,9 mil e R$ 31,3 mil), alcançando uma alíquota efetiva de 11,89%. A partir daí, a cobrança fica cada vez menor.

“Essa é uma característica muito negativa do sistema tributário brasileiro, porque um dos princípios importantes da tributação é que ele respeite a capacidade econômica do contribuinte. O que significa dizer que você deveria tributar menos os mais pobres, de forma intermediária a classe média e mais quem é mais rico”, afirma Manoel Pires, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Rendas isentas
Essa distorção ocorre, em grande parte, porque uma fatia expressiva da renda dos mais ricos é recebida na forma de lucros e dividendos, que são isentos de IR desde 1996. São valores distribuídos por empresas a sócios e acionistas.

Quem ganha mais de 320 salários mínimos por mês – ou seja, os 1% mais ricos do País – tem quase 70% da sua renda livre desse tributo. Já o trabalhador que recebe entre um e dois salários está na outra ponta e tem apenas 13% dos rendimentos isentos.

Ampla reforma
Os analistas afirmam que as distorções na cobrança do Imposto de Renda só serão corrigidas por meio de uma ampla reforma tributária. Na avaliação deles, dois pontos são fundamentais:

1) Rever isenções. A isenção da cobrança de IR sobre lucros e dividendos e fundos fechados de investimentos precisa ser alterada, porque, no formato atual, acaba beneficiando a parcela mais rica da sociedade brasileira.
“Essas isenções são importantes para quem tem mais renda. As pessoas pobres não têm um rendimento relevante obtido com lucros e dividendos, por exemplo”, afirma Pires, que ressalta que seria necessário mexer, também, no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.

“O país deveria reduzir a carga (tributária) na empresa para compensar a volta da tributação sobre lucros e dividendos. Isso iria ajudar muito o Brasil, porque a alíquota (de Imposto de Renda) nas empresas é muito elevada. Então, uma redução iria colocar a gente numa convergência com as principais tendências internacionais”, acrescenta.

2) Atualizar e criar novas faixas. Os especialistas também acreditam que o país precisa remodelar as faixas de cobrança de IR – o reajuste pela inflação, por exemplo, deixou ser automático desde 1996 – e criar novas alíquotas, que sejam superiores aos 27,5% (a mais alta da tabela atual).
“A nossa faixa mais alta é baixa (na comparação com outros países). Na experiência internacional, a gente vê alíquotas que chegam a 35% ou 40%”, diz o pesquisador do Ibre/FGV.

“O país passou a depender de um ato formal do governo para que a tabela pudesse ser reajustada (pela inflação). Ou seja, a simples omissão do Executivo em mandar o reajuste da tabela do Imposto de Renda passou a consistir numa forma de aumento (de carga tributária)”, diz Falcão, do Sindifisco Nacional.

Defasagem da tabela
Atualmente, segundo os cálculos dos auditores fiscais, a tabela do IR acumula uma defasagem de 147% em relação à inflação.

Em junho de 2021, o governo Jair Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional uma proposta de alteração do Imposto de Renda, como parte da reforma tributária. O texto chegou a ser aprovado pela Câmara dos Deputados, mas não avançou no Senado.

O projeto isenta de IR todos os trabalhadores celetistas que recebem até R$ 2,5 mil mensais (hoje, esse valor é de R$ 1,9 mil) e reajusta as demais faixas de cobrança. Também propõe alterações no imposto pago pelas empresas e a volta da tributação sobre lucros e dividendos.

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