O agente penitenciário Jorge José da Rocha Guaranho invadiu uma festa e matou a tiros o aniversariante, o guarda municipal Marcelo Arruda, na noite de sábado (9), em Foz do Iguaçu (PR). O evento celebrava os 50 anos de Arruda, em uma comemoração temática do PT, com bandeiras e cores do partido e foto do ex-presidente e pré-candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva.
Segundo o boletim de ocorrência, ao invadir a festa, o atirador gritou “aqui é Bolsonaro”. Nas redes sociais, Guaranho demonstra apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e às pautas defendidas por seu governo.
Ferido, Arruda atirou contra Guaranho, que seguia armado —ainda de acordo com o boletim de ocorrência, a arma dele tinha onze munições intactas. Um dos filhos da vítima, presente na festa, disse que o pai atirou com medo de mais pessoas serem atingidas.
Arruda foi socorrido, mas morreu no hospital. Deixa mulher e quatro filhos, incluindo um bebê. Filiado ao PT, ele foi candidato a vice-prefeito de Foz do Iguaçu pelo partido em 2020.
Em um primeiro momento, a Polícia Civil do Paraná informou que o atirador também havia morrido. Na tarde deste domingo, porém, em coletiva de imprensa, a Polícia Civil corrigiu a informação, dizendo que Guaranho está internado. Há divergência sobre seu estado de saúde —a corporação informou que o quadro é grave, mas a delegada do caso disse em coletiva de imprensa que é estável.
O UOL apurou que Guaranho foi levado para o Hospital Municipal Padre Germano Lauck, de Foz do Iguaçu. A unidade disse que não vai dar informações.
Invasão do atirador bolsonarista
A festa de aniversário reuniu cerca de quarenta convidados na sede da Associação Esportiva Saúde Física Itaipu.
Por volta das 23h, Guaranho chegou ao local em um carro branco. No banco de trás, estavam sua mulher e uma criança de colo. Ele não conhecia o aniversariante e não foi convidado para a festa, segundo relatos.
Guaranho começou a xingar os participantes e a gritar “aqui é Bolsonaro”, de acordo com testemunhas e com o boletim de ocorrência.
André Alliana, amigo do aniversariante, disse ao UOL que a festa transcorria normalmente quando Guaranho chegou.
“Achamos que era um convidado, já que também tinha bolsonaristas no local. O Marcelo estava na cozinha e fomos chamá-lo para receber esse homem. Foi aí que vimos que não era brincadeira. Em seguida, ele [Guaranho] deu a volta de carro, xingou quem estava lá e disse que ia voltar para acabar com todo mundo. O Marcelo estava com um copo de chope na mão e acabou jogando nele para expulsá-lo do local”, diz.
Ainda segundo relatos, Guaranho deixou o local. Com medo, Arruda foi até seu carro e voltou com uma pistola, relata Alliana.
Cerca de 15 ou 20 minutos depois, Guaranho voltou para a festa, sozinho e armado. “A esposa do Marcelo, que é policial civil, tentou impedir que ele entrasse na festa. Nisso, o cara começou a atirar. Atingiu o Marcelo na perna e no peito. O Marcelo também conseguiu atirar nele”, diz o amigo da vítima.
Vídeo de câmera de segurança do lado exterior do local da festa, obtido pelo UOL, mostra a chegada do carro de Guaranho. Ele sai do veículo e empunha a arma. A mulher de Arruda tenta dissuadí-lo, mostrando a carteira funcional da Polícia Civil. O atirador desobedece a policial e efetua dois disparos —é possível ver os estampidos da arma de fogo —em direção ao salão de festas.
Imagens de câmera de segurança do interior do salão, também obtidas pelo UOL mostram Arruda de pé, caminhando com dificuldade pelo salão, mancando. Segundos depois, ele cai no chão e se abriga atrás de uma mesa. Segundo uma testemunha ouvida pela reportagem, nessa altura Arruda já tinha sido atingido pelos disparos que Guaranho fez do lado de fora do salão e estava ferido.
Em seguida, o agente penitenciário surge correndo dentro do salão de festas, com arma em punho, e mira em direção ao aniversariante, que tentava se proteger.
Então, a esposa de Arruda busca impedir que o atirador atire novamente. Ele se desequilibra e cai no chão, mas consegue disparar. No vídeo, é possível ver um sinal luminoso de um disparo saindo da arma de Guaranho em direção a Arruda.
O bolsonarista se levanta sai correndo, ainda armado. Arruda, já ferido, atira contra Guaranho, que é atingido e cai no chão.
O atirador segue se movendo. Um homem não identificado aparece e dá chutes no rosto do bolsonarista, que para de se mover. Outras pessoas também aparecem no salão.
O perfil no Facebook de Guaranho é repleto de publicações a favor do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de pautas defendidas pelo governo federal, como o armamento da população. Em uma das postagens, o agente penitenciário compartilha um vídeo em que uma mulher aparece sacando uma arma para um homem após uma agressão. O perfil do agente penitenciário ainda compartilhava críticas ao combate ao racismo e ataques à imprensa.
A Delegacia de Homicídios informou que está apurando o caso.
Ex-presidente Lula e PT lamentam violência
Pré-candidato à Presidência, o ex-presidente Lula se manifestou e prestou solidariedade à família de Arruda.
“Uma pessoa, por intolerância, ameaçou e depois atirou nele, que se defendeu e evitou uma tragédia maior. Duas famílias perderam seus pais. Filhos ficaram órfãos, inclusive os do agressor. Meus sentimentos e solidariedade aos familiares, amigos e companheiros de Marcelo Arruda”, Lula, ex-presidente e pré-candidato à Presidência
A reportagem pediu manifestação ao Palácio do Planalto, mas ainda não obteve resposta. O espaço segue aberto.
Em nota, o PT lamentou a morte do guarda municipal e diz que tem alertado sobre a escalada de perseguição a parlamentares e filiados a legendas de esquerda no país.
“Embalados por um discurso de ódio e perigosamente armados pela política oficial do atual Presidente da República, que estimula cotidianamente o enfrentamento, o conflito, o ataque a adversários, quaisquer pessoas ensandecidas por esse projeto de morte e destruição vêm se transformando em agressores ou assassinos”, disse o partido.
A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, lamentou a morte de Arruda e afirmou que é uma tragédia “fruto da intolerância dessa turma”.
O presidente do PSOL, Juliano Medeiros, também escreveu que o guarda municipal é a primeira vítima do “bolsonarismo” durante a campanha eleitoral. “Esse é o resultado da campanha de ódio disseminada pelo presidente do Brasil”, disse.
Em nota, a prefeitura de Foz do Iguaçu lamentou a morte de Arruda. O guarda municipal atuou na corporação por 28 anos e também era diretor da executiva do Sindicato dos Servidores Municipais da cidade.
“Agradecemos ao Marcelo Arruda por toda a sua dedicação e comprometimento com o município, o qual nestes 28 anos de funcionalismo público defendeu bravamente, tanto atuando na segurança como na defesa dos servidores municipais”, disse o prefeito Chico Brasileiro, em nota. “Desejamos à família, aos amigos e colegas de Marcelo força neste momento de dor”.
Marcos Antônio Jhanke, secretário de Segurança Pública de Foz do Iguaçu, também lamentou o assassinato de Arruda.
“O Marcelo sempre foi muito dedicado e lutador das causas da categoria. Ele ajudou na aprovação de um projeto municipal que prevê adequação do nível salarial dos guardas municipais de primeira classe na última sexta-feira. Amanhã, essa proposta vai para sanção do prefeito. Ele estava muito feliz, tinha direito de comemorar os 50 anos. É uma data significativa e ele estava com amigos”, disse.