O governo da Bolívia afirmou nesta quarta-feira (25) que está tentando renegociar o seu atual contrato de fornecimento de gás natural à Petrobras e que busca um preço mais alto para o insumo.
Na sexta-feira passada, a Petrobras já havia informado que a Bolívia havia cortado em 30% o fornecimento de gás natural à estatal, de 20 milhões de metros cúbicos diários para 14 milhões, sem especificar o motivo para a redução.
Em um comunicado à imprensa divulgado nesta quarta-feira, o ministro dos Hidrocarbonetos e Energia da Bolívia, Franklin Molina, afirmou que o atual preço vigente no contrato com a Petrobras estaria provocado prejuízos à estatal boliviana Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB).
Ele argumentou também que o preço atual foi definido em um adendo contratual assinado durante o governo da presidente interina Jeanine Áñez, que governou o país por um ano, de novembro de 2019, após a renúncia de Evo Morales, até a posse do atual presidente, o esquerdista Luis Arce, do mesmo partido de Morales, em novembro de 2020.
“É um dever renegociar as condições deste adendo, porque foi assinado por um governo de fato que não se preocupou com os interesses do Estado (…) A Bolívia procura um melhor preço para o seu gás natural, melhores condições e um melhor mercado”, afirmou Molina.
O governo Arce e seu partido, o Movimento ao Socialismo (MAS), costumam se referir à gestão de Áñez como um “governo de fato” por considerarem que em 2019 houve um golpe de Estado contra Morales e que a transição de poder não foi legal.
Renegociação e novos contratos
Quando o adendo do contrato de venda de gás natural para a Petrobras foi assinado, em março de 2020, o governo interino boliviano esperava obter um rendimento de pelo menos 4 bilhões de dólares até 2026, para fornecer de 14 a 20 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia.
Ao assinar esse adendo ao contrato, a Petrobras abriu mão de outros 10 milhões de metros cúbicos diários de gás para que pudessem ser negociados com outras empresas no Brasil, como parte da abertura do mercado de gás no país e da quebra do monopólio da estatal no setor.
De acordo com Molina, nos termos atuais do contrato, a Petrobras paga de 6 a 7 dólares por milhão de BTU, uma medida usada na comercialização do insumo. Ele afirmou que existem atualmente no Brasil empresas privadas interessadas em comprar gás boliviano a um preço de 15 a 18 dólares por milhão de BTU.
O ministro relatou que foi feita uma tentativa “formal” de solicitar à Petrobras uma renegociação do contrato e que o presidente da YPFB, Armin Dorgathen, foi ao Brasil em busca de “melhores condições” para a venda de gás ao mercado brasileiro.
“A resposta não foi a esperada e, tendo em conta esta situação, nos concentramos no contrato, no qual uma das suas cláusulas declara que se uma das partes não estiver satisfeita com o preço, essa parte pode procurar renegociar”, afirmou Molina.
O gás natural tem sido o principal produto de exportação da Bolívia e o pilar da economia do país nas últimas duas décadas, sendo os seus principais mercados a Argentina e o Brasil.
Uma das hipóteses discutidas no mercado é que o corte também poderia estaria ligado ao fornecimento de gás da Bolívia para a Argentina por preços superiores aos pagos pela estatal brasileira.
Preços em alta
A Petrobras, ao informar que estava recebendo 30% menos gás natural da Bolívia, disse que tinha tomado medidas para retomar o fornecimento, mas que teria que recorrer à importações de outras fontes.
Nesse caso, a substituição seria feita pelo gás natural liquefeito (GNL), importado de países como Estados Unidos, Trinidad e Tobago e Catar, usando navios que transportam o gás na forma líquida.
A guerra na Ucrânia vem provocando aumento generalizado dos preços do GNL, enquanto países dependentes do gás natural russo, especialmente os da União Europeia, buscam fontes alternativas.
A maior demanda fez os preços do BTU dispararem – se, durante a pandemia, o milhão de BTU era negociado a 5 dólares, nesta semana está em torno de 27 dólares.
Momento delicado
A estatal brasileira atravessa um período turbulento em sua gestão. Na segunda-feira, o governo federal decidiu demitir o então presidente da Petrobras, José Mauro Ferreira Coelho, apenas 40 dias depois de ele assumir o cargo, e indicou para seu lugar Caio Mário Paes de Andrade, secretário especial de Desburocratização do Ministério da Economia.
A troca do comando da estatal foi realizada em meio a crescentes pressões do presidente Jair Bolsonaro contra os reajustes frequentes dos preços de combustíveis e do gás de cozinha e críticas à política de preços praticada pela estatal, que usa como referência os valores do mercado internacional.
O aumento dos combustíveis coloca pressão sobre a inflação dos produtos e tem potencial para afetar a popularidade de Bolsonaro e sua corrida à reeleição. Segundo relatos da imprensa brasileira, o objetivo do governo é postergar ao máximo novos aumentos dos combustíveis.
Essa intenção do governo, no entanto, se choca com os interesses dos acionistas privados da Petrobras. A política de reajustes atual é um dos fatores que explicam os lucros recordes que a estatal vem registrando.