Um bebê de apenas dois meses de Praia Grande, no litoral de São Paulo, precisou ficar internado por uma infecção derivada da escabiose, conhecida como sarna humana. Em entrevista ao g1 neste domingo (21), a mãe dele, Stefanny Bomfim Albuquerque, de 25 anos, relatou que a família toda está com a doença, e, apesar do filho ter recebido alta, ainda está sofrendo de dor.
A escabiose é causada por um ácaro que gera bolhas que, quando coçadas, se tornam feridas na pele. Ela é transmitida facilmente pelo contato entre as pessoas e deve ser tratada com remédios, loções e sabonetes. No meio deste ano, uma comunidade de Praia Grande havia sofrido com surtos de reinfecção da doença.
Stefanny relata que mora na Vila Sônia, é de uma família humilde e mora na mesma casa que o pai, com a mãe, os dois irmãos e os quatro filhos, incluindo o bebê Kauan. No ano passado, de acordo com a jovem, a família já havia tido a doença e tratou com algumas medicações, mas, segundo ela, neste ano a família teve uma reinfecção.
“No ano passado eu já havia buscado ajuda porque minha filha tinha tido a infecção de forma mais grave. Tratamos com algumas pomadas que melhoraram, mas na gravidez do Kauan, com 4 meses, a infecção voltou de forma mais agressiva e eu fiquei morrendo de medo de não me curar e passar para ele. E eu fiz todo o acompanhamento, pedia remédios mais fortes, porque sabia que se eu tivesse quando ele nascesse, passaria para o meu filho. Mas não fui curada”, afirma.
No último dia 10 ela conseguiu uma consulta particular para o filho e a médica disse a ela que o bebê precisava de internação. “Ela disse para eu procurar o posto que ele passava por consulta e dizer que ele tinha essa necessidade. Cheguei lá e pedi para ele ser internado, mas o médico passou remédio, xarope que era necessário comprar e eu não tinha como, então postei nas redes sociais pedindo ajuda e a Patrícia [voluntária] viu e me chamou. Eu expliquei a situação e ela postou também para me ajudar”, relata.
Após a postagem da voluntária, ela relata que um vereador conseguiu vaga para o bebê em um hospital de São Vicente, onde Kauan ficou internado do dia 16 deste mês até a manhã deste sábado (20).
“Mesmo com alta, a situação do meu filho ainda é delicada. O meu peito está lotado de sarna, eu sinto dor para amamentar, mas não tenho como manter mamadeira para ele, devido ao alto custo de leite para bebê pequeno. O banho para mim é uma tortura de tanto que arde quando a água cai no corpo. Eu estou com sarna no corpo todo, até na mão, assim nem emprego consigo. Meu filho grita de dor. Deve ser muito difícil, eu sei que ele está sofrendo, porque eu sei como coçar e dizer quando estou mal e ele não consegue”.
Segundo a mãe, agora ela tenta que o bebê seja internado em Praia Grande. “O pessoal do posto só entrou em contato comigo depois que a Patrícia os acionou, mesmo eu já tendo ido algumas vezes lá. Quando o pessoal do posto entrou em contato disseram para eu ir no dia 16, mas era a data que meu filho foi internado em São Vicente, e não dava para eu ir”, relata.
Outros casos
A voluntária Patrícia Ogna Patrali é fundadora da página Praia Grande Invisível e é quem divulga nas redes sociais e acompanha de perto os casos de escabiose na comunidade Nova Mirim, e também é quem está prestando apoio à família de Kauan, que é da Vila Sônia
“Da minha comunidade [Nova Mirim], graças a Deus, nós tínhamos controlado tudo, porém, agora nos últimos 20 dias começaram a aparecer novamente alguns casos, tanto de sarna, quanto de impetigo. E nós temos o caso grave desse bebê de dois meses, que estamos tentando ajudar na medida do possível”, relata.
De acordo com a voluntária, os números de casos da doença não estão tão generalizados como em julho deste ano, época em que a quantidade de contaminados era alta, mas ainda há preocupação de que os registros da infecção voltem a aumentar.
“O bebê foi liberado da internação sem ter a escabiose controlada e, agora, a mãe está procurando interná-lo, por meio do atendimento público, em Praia Grande. Eu acho que com relação aos casos de sarna, a Secretaria da Saúde começou a acompanhar novamente, então ficamos um pouco menos preocupados. E que no mais, é preciso que o profissional da saúde trate a doença como tal, ou seja, consiga identificá-la e proponha o tratamento adequado caso a identifique no paciente”, destaca.
Escabiose
A dermatologista Helena Engelbrecht Zantut já havia explicado ao g1 que o agente causador da escabiose é o ácaro Sarcoptes scabiei, só transmitido entre humanos. As consequências são coceiras na pele, com horários de piora. “Geralmente [a piora acontece] à noite, quando o sarcoptes sai para depositar ovos na pele”, diz.
Nas feridas, também há o risco de infecções secundárias, causadas por bactérias. A escabiose é causada pelo contato direto da pele de uma pessoa para outra. “Em ambientes com muitas pessoas, é mais fácil de passa para outro. Também é assim em casas de repouso e cadeias”, explica.
A sarna pode ser tratada com o antifúngico ivermectina. “Mas todos que moram na mesma casa têm que tomar a medicação juntos, no mesmo dia”, diz. “Eu acho que estamos nesse surto de sarna desde o começo do ano. Todos os dias atendo três ou quatro casos de escabiose”, contou anteriormente.
Prefeitura
Em nota, a Prefeitura de Praia Grande alega que não houve negativa de atendimento à criança. Afirma que ela passou em consulta na unidade de saúde no dia 10 de novembro, foi avaliada e medicada conforme indicação médica.
Segundo a administração, foi solicitado ainda um retorno no dia 16, porém, a mãe não compareceu com a criança. Foi realizada busca ativa da criança e reagendada a consulta para o dia 17 e nova falta foi registrada. A equipe afirma estar em nova busca no território para localizar a criança.
A prefeitura afirma ainda que atende a 100% de todo o território do município por meio de suas 30 Unidades de Saúde da Família (Usafas) e das 109 equipes de saúde da família. Todas as equipes estão orientadas a, caso surjam casos de escabiose, tratar de forma mais precoce possível.
A cidade possui o Programa Consultório na Rua, onde os atendimentos são feitos em um veículo, tipo van, equipado com sala reservada e local para vacinas e exames. Essa equipe, segundo a municipalidade, tem ido frequentemente nos territórios de maior vulnerabilidade fazendo ações preventivas junto às comunidades.
“Casos pontuais serão tratados e acompanhados pelas equipes e, caso haja o aparecimento de novos casos, ações integradas serão implementadas nas localidades, como já feito anteriormente por meio do Consultório na Rua, Saúde Ambiental e Rede de Atenção Básica”, diz a administração municipal, por meio de nota.