A Justiça considerou improcedente a ação de uma aposentada contra um banco depois de perder mais de R$ 200 mil ao transferir o dinheiro para um golpista que se passava pelo ator norte-americano Johnny Depp e prometia um relacionamento com a brasileira. Cabe recurso.
Segundo a decisão da juíza Clarissa Rodrigues Alves, no processo de indenização, a vítima afirmou que teve o primeiro contato com o criminoso em 21 de setembro de 2020 pelo Instagram.
As transferências foram feitas para uma conta em nome de Antônio, que foi identificado pelo falso Johnny Depp como um “amigo brasileiro de seu advogado”. Os valores pedidos durante o golpe de romance foram referentes a falsas condenações em processos que supostamente envolviam a figura do ator.
Na Justiça, ela pediu a condenação do banco que recebeu as transferências em nome do brasileiro com indenização e danos materiais e morais em R$ 208,4 mil.
O banco alegou à Justiça que a moradora de Osasco, na Grande São Paulo, foi quem transferiu o dinheiro por “livre e espontânea vontade”, sem interferência da agência.
“Embora a autora afirme ter sido vítima de um golpista, nada nos autos comprova toda a sua narrativa. Note-se que a autora anexou aos autos apenas e tão somente os comprovantes de transferência bancária, que por livre e espontânea vontade efetuou, mas não junta o tal perfil do Instagram que a enganou”, escreveu a juíza em decisão foi publicada em 28 de setembro.
O golpe
Segundo apurado pelo g1, no início as conversas eram apenas sobre o cotidiano, mas, com o passar do tempo, a pessoa que afirmava ser o próprio ator contava a história de que precisava de dinheiro para o pagamento de condenações em processos que estava envolvido.
Realmente, no começo do ano, Depp estava processando a ex-mulher Amber Heard e pedindo US$ 50 milhões em danos morais por um artigo que ela escreveu no jornal “The Washington Post” em que afirmou ser vítima de violência doméstica. Heard também processou o ator em ação que pediu US$ 100 milhões.
Amber e Johnny foram condenados por difamar um ao outro no Tribunal do Condado de Fairfax, no estado norte-americano da Virgínia. O processo repercutiu mundialmente.
Ao mesmo tempo em que ocorria o embate na vida real, o golpista enganava a vítima na Grande São Paulo. Ainda segundo apurado, havia nas conversas promessas do golpista em levar a vítima para morar com ele, que estaria nos Estados Unidos.
“A pandemia contribuiu para que a Autora acreditasse em toda mentira contada pelo golpista, haja vista o abalo emocional vivenciado, a mesma só procurava uma ‘saída ou mudança de vida’, realizando até uma cirurgia plástica acreditando ir morar em Los Angeles”, defendeu a advogada no processo contra o banco.
A aposentada vendeu carro e casa para “ajudar” o falso ator. A pedido dele foram feitos depósitos na conta de um brasileiro de R$ 15 mil, R$ 40.400 e R$ 153 mil.
Após a venda da casa, do veículo e de ter tido alguns cheques bloqueados, o filho da vítima desconfiou da fraude e perguntou à mãe sobre as transações bancárias. No celular dela, ele viu as conversas.
A defesa da vítima chegou a encontrar o nome do dono da conta bancária em sites mantidos por “caçadoras de golpistas” que apontam suspeitos em transações criminosas envolvendo golpes de romance.
A mesma conta que seria de “um amigo do advogado de Depp” foi identificada pela caçadora de golpistas Glauce Lima em outro caso, quando o perfil com fotos do “médico David” conversou por sete meses com uma vítima e pediu dinheiro para vir ao Brasil.
“Infelizmente, esse tipo de golpe está acontecendo. Estamos tendo brasileiros envolvidos nessas quadrilhas. Sabemos que nenhuma dessas vítimas são culpadas, elas são vítimas. São mulheres que se apaixonaram e se deixaram levar pelo sentimento. Elas fazem essas transferências porque estão apaixonadas e querem ajudar a pessoa que pensam que amam. O Brasil não está dando a devida importância para esses golpes.”
‘Caçadoras de golpistas’
Diferentemente de outros países, como os Estados Unidos, o Brasil não tem estatísticas oficiais sobre golpes de romance virtual. No entanto, um grupo de mulheres passou a monitorar e guardar informações sobre este tipo de crime.
Alguns materiais já foram encaminhados e usados pela polícia. O caso foi mostrado no Fantástico.
Segundo Crystal Brasil, que também se identifica como “caçadora”, alguns pontos podem ser um alerta para um perfil impostor: quase nenhuma resposta pública a comentários, nenhum parente entre os amigos e poucas fotos pessoais, que são escolhidas a dedo para impressionar, como fotos com crianças, animais e cozinhando.
As caçadoras de golpistas usam a chamada “busca reversa de imagens” para tentar desmascarar os golpistas. São ferramentas de pesquisas que indicam em quais sites uma determinada foto aparece.