A Assembleia Legislativa de São Paulo irá gastar mais de R$ 2 milhões com mandatos “tampão” neste começo de ano.
Por até dois meses e meio, seis suplentes assumem o cargo no lugar dos deputados cujos mandatos terminam em março e que já deixaram a Casa para ocupar vaga no Legislativo Federal ou Executivo paulista. A nova legislatura, quando assumirão parlamentares eleitos nas eleições de 2018, começa em 15 de março.
Os suplentes recebem salários de R$ 25,3 mil, têm carro oficial à disposição, podem nomear até 32 assessores – custo médio de R$ 142 mil por mês de verba de gabinete -, além de R$ 32 mil mensais de verba indenizatória.
Embora o montante pago aos suplentes não seja um gasto extra, já que seria destinado aos deputados aos quais substituem, é um dinheiro empenhando por um período tido como pouco útil, uma vez que o orçamento já foi aprovado e a atividade das comissões permanentes, que já foi bem baixa em 2018, é praticamente inexistente entre janeiro e março.
Nesta quinta-feira (17), foi empossado o deputado Dr. Itamar Coppio (MDB). Ele entrou no lugar de Milton Vieira (PRB), que renunciou ao mandato para assumir como deputado federal.
No dia 1° de fevereiro, serão empossados os suplentes de Cezinha de Madureira (PSD) e Alencar Santana (PT), que também foram eleitos deputados federais. Outros três já estão no cargo desde a primeira semana de janeiro.
José Bittencourt (PSD) assumiu o posto do deputado Coronel Camilo, atual secretário-executivo da Polícia Militar do governo de João Doria, além de Luiz Gonzaga Vieira e Antônio Carlos da Silva Jr. (ambos do PSDB), que passaram a ocupar as cadeiras de Marco Vinholi (PSDB), nomeado secretário estadual de Desenvolvimento Regional, e Célia Leão (PSDB), atual secretária estadual da Pessoa com Deficiência.
Constituição
A Assembleia Legislativa de São Paulo é o único parlamento estadual do Brasil a iniciar os trabalhos em 15 março. Nos demais, a posse ocorre no dia 1° de fevereiro. A data foi fixada pela Constituição Estadual a partir de 1971 e, à época, coincidia com a posse dos governadores.
A Constituição Federal de 1988, porém, definiu a posse do presidente e vice-presidente da República e dos governadores e vices dos estados em 1º de janeiro.
Em nota, a presidência da Alesp alega que segue a Constituição Estadual, “que assegura o pagamento da remuneração dos parlamentares, independente do período ocupado por eles entre a posse e o fim de cada legislatura.”
Falta de atividade
Especialistas avaliam que a população acaba pagando pela falta de atividade parlamentar ou pelo pouco tempo de mandato de um deputado tampão.
“A produção legislativa, o benefício para a população, não vai ter. Até março não vai acontecer nadada na Alesp, todo mundo sabe”, diz Américo Sampaio, sociólogo e gestor da Rede Nossa São Paulo.
“Ganha dois, três meses de salário, a população não ganha absolutamente nada, perde R$ 2 milhões que poderiam ir para a política pública, e mantém a organização partidária desses gabinete. É um mecanismo de fazer caixa. Ganha uma grana, fica para o partido”, complementa o gestor da Rede Nossa São Paulo.
Na avaliação de Gustavo Fernandes, professor do departamento de gestão de políticas públicas da FGV-SP, com pós-doutorado em políticas públicas pela Universidade de Harvard, nos EUA, os custos não estão relacionados apenas ao orçamento e às despesas da Casa.
“É ausência de atividade parlamentar significativa que nos impõe um custo. Não o custo direto, financeiro, mas custo intangível. Eles [deputados, suplentes] estão fiscalizando, estão atuando? O processo de elaboração para se formar a legislação é permanente. É difícil mensurar [a perda] do ponto de vista quantitativo.”
Para Américo Sampaio, a falta de unidade nas datas dá margem a manutenção de privilégios e aplicação de dinheiro de maneira ineficaz.
“Você tem um problema Constitucional, que é justamente não ter um alinhamento em os três entes federados no que diz respeito a posse. Esse modelo desorganizado, que foi montado para a manutenção de privilégios de deputados que assim querem, ele estimula com que os partidos façam isso para se valer do caixa”, aponta o sociólogo da Rede Nossa São Paulo.
“O grande problema não é a existência da figura do suplente, mas a existência de um período de inatividade excessivamente longo. Esse é o tipo de coisa que uma reforma política realizada no país poderia contribuir muito”, defende Gustavo Fernandes, professor da FGV-SP.
PEC
A mudança no “calendário” do mandato, entretanto, só pode ser feita por meio de uma alteração na Constituição do Estado de São Paulo, ou seja, através de uma PEC – Proposta de Emenda Constitucional.
A proposta foi apresentada uma única vez por um grupo de deputados em 2011, e arquivada em março de 2015. “A brecha, a confusão que a Constituição faz, não justifica o que os deputados fazem”, diz Sampaio, da Rede Nossa São Paulo.
Na opinião do professor da FGV, o legislativo, embora seja um dos poderes que mais represente a democracia, tem uma atuação e fiscalização muito enfraquecida no Brasil.
“A gente não olha para as assembleias estaduais. (…) Ainda estamos longe de alterar esse calendário. Vai demorar alguns anos para ter pressão popular para antecipar esse prazo e cobrar trabalho”.
Gustavo Fernandes ainda destaca o excessivo monopólio do poder Executivo. As assembleias, que deveriam fiscalizar, questionar, cobrar a atuação do governo do estado, acabam por existir para servi-lo.
“É um super Executivo. No fim, é ele quem legisla e executa. É o desenho incorreto, as grandes democracias não funcionam assim.”
Partidos
O PT afirmou que ainda não está definido quem assumirá o posto de Alencar Santana. Pela linha de sucessão da coligação, seria o suplente João Leite. Como o político deixou o PT, o partido deve recorrer na Assembleia para que o cargo seja transferido a José Bittencourt.
Sobre a provável parca produtividade parlamentar das suplências na Casa, o partido disse que não irá se manifestar.
O G1 entrou em contato com os demais partidos citados (MDB, PRB, PSD e PSDB), mas não obteve retorno.