sábado, 16 de novembro de 2024
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Álcool em doses controladas pode proteger coração, diz estudo

Dados de uma pesquisa conduzida no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) indicaram que o consumo moderado de álcool pode ter efeito cardioprotetor em grande parte…

Dados de uma pesquisa conduzida no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) indicaram que o consumo moderado de álcool pode ter efeito cardioprotetor em grande parte das pessoas, mas ainda não se sabia ao certo o motivo.

Essa proteção, ao que tudo indica, pode estar relacionada com a ativação de uma enzima mitocondrial chamada ALDH2 (aldeído desidrogenase-2), que ajuda a eliminar do organismo tanto os subprodutos tóxicos gerados pelo metabolismo do álcool como também um tipo de molécula reativa produzido nas células cardíacas quando estas sofrem um dano importante – como o causado pelo infarto, por exemplo.

“Nossos dados sugerem que a exposição moderada ao etanol causa um pequeno estresse nas células do coração, não o suficiente para matá-las. Como consequência, ocorre uma reorganização no sinal intracelular e a célula cardíaca acaba criando uma memória bioquímica contra estresse, também chamada de pré-condicionamento. Quando a célula é submetida a um estresse maior, já sabe como lidar”, disse Julio Cesar Batista Ferreira, professor do Departamento de Anatomia do ICB-USP e coordenador da pesquisa.

Efeitos

Para estudar os efeitos cardioprotetores do álcool em nível celular, os pesquisadores simularam uma condição semelhante ao infarto em corações de camundongo mantidos vivos em um sistema artificial. Nesse modelo, chamado ex vivo, o órgão permanece batendo fora do corpo durante várias horas, sendo alimentado por uma solução rica em nutrientes e oxigênio.

Os cientistas, então, simulam uma condição clínica conhecida como isquemia e reperfusão, interrompendo o fluxo nutritivo para o coração durante 30 minutos. Quando a solução nutritiva volta a correr, o órgão recomeça a bater lentamente e, após uma hora, os pesquisadores conseguem avaliar o tamanho do dano. Em média, nesse modelo, cerca de 50% das células cardíacas morrem caso não seja feito nenhum tipo de intervenção.

“Acreditava-se que o dano principal era consequência do período sem oxigênio. Mas estudos mostraram que, durante a isquemia, as células mudam seu metabolismo e entram em uma espécie de estado dormente. Quando a artéria é desobstruída [reperfusão], o tecido recebe uma enxurrada de sangue com nutrientes e oxigênio e acaba ocorrendo um colapso metabólico nas células”, explicou Ferreira.

Mecanismo

Em resposta ao estresse, as células cardíacas começam a produzir grandes quantidades de uma molécula reativa conhecida como 4-HNE (4-hydroxy-2-nonenal), pertencente à classe química dos aldeídos. Em excesso, essa substância tóxica começa a destruir estruturas celulares essenciais.

A enzima mitocondrial ALDH2 é a principal responsável por livrar o organismo dos aldeídos acumulados – tanto o 4-HNE das células cardíacas em estresse quanto o acetaldeído resultante da quebra da molécula de etanol no fígado após uma noite de bebedeira.

“Em nosso estudo, observamos que, no coração exposto ao etanol antes do processo de isquemia e reperfusão, a atividade da ALDH2 se manteve igual à de um órgão que não sofreu injúria. Acreditamos que o estresse causado pelo etanol em dose moderada deixa uma memória e, assim, a célula aprende a manter a enzima ALDH2 mais ativa”, acrescentou.

Danos

Mas não se anime. Embora os prejuízos físicos possam ser minimizados, de acordo com o estudo, os fatores sociais continuam irreversíveis. Um grupo da Faculdade de Medicina da USP publicou os resultados de uma pesquisa a respeito da associação entre o consumo de álcool e drogas com a ocorrência de mortes violentas. O trabalho coloca em números os dados dessa relação na cidade de São Paulo.

A descoberta é que o consumo de álcool, ou de pelo menos um tipo de droga, guarda associação com mais da metade (55%) das mortes violentas ocorridas na capital paulista entre 2014 e 2015.

Gabriel Andreuccetti, pesquisador do Departamento de Medicina Legal da Faculdade de Medicina (FM) da USP, explica que o que o levou a esse estudo foi o fato de o Brasil ter nas mortes violentas um dos seus piores problemas de saúde pública.

Relevância

Sob a luz da situação vivida pelo Brasil, o grupo de pesquisa realizou um trabalho de investigação da relação existente entre as chamadas mortes violentas e o consumo de álcool e drogas ilícitas. A literatura mundial aponta a relevância dessa associação, no entanto, faltam no País dados que sustentem estratégias de saúde pública, que é exatamente o objetivo da pesquisa.

“Nosso grupo de pesquisa já vem fazendo esses estudos sobre a violência no Brasil. Principalmente com motoristas, a relação do álcool com acidentes de trânsito. Um dos maiores problemas de saúde pública do nosso país são as mortes violentas – 60 mil mortes ao ano só por homicídio. Outros estudos mundiais mostram que associar estas mortes ao álcool e às drogas é um dado relevante, o que nos faltam são dados para subsidiar o desenvolvimento de políticas públicas relacionadas a este setor. E esse é o nosso objetivo com esta larga pesquisa”, explicou ele.

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