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AÇÚCAR: doce perigo à vista

Originário da Nova Guiné, a partir do século XI até o século XVII, o açúcar era um produto caro, desejado, a ponto de ser dado como dote nos matrimônios. Caparica…

Originário da Nova Guiné, a partir do século XI até o século XVII, o açúcar era um produto caro, desejado, a ponto de ser dado como dote nos matrimônios. Caparica (2010, p. 63) relata que as moças de então “guardavam entre as rendas dos seus enxovais uma caixinha mimosa com um pó branco, o açúcar”. Foram os portugueses da Ilha da Madeira que desenvolveram a cultura dos doces, as técnicas açucareiras e o comércio das frutas cristalizadas. O açúcar chegou ao Brasil em 1526, em Pernambuco, cujo clima e solo massapê favorecem o cultivo da cana-de-açúcar que dominou o cenário econômico por quatro séculos, tornando-se o caminho preferencial da ocupação e da formação social e cultural do brasileiro. O açúcar, como alimento e fonte calórica de amplo consumo e aceitação popular, aos poucos, teve ampliadas as formas de seu uso que iam desde remédio para facilitar a absorção de outras substâncias medicinais, até “produto de luxo e ostentação, símbolo da nobreza, conservante de frutas e outros alimentos, especiaria culinária essencial e, finalmente, alimento básico na dieta da classe trabalhadora” (Caparica, 2010, p. 63).

O açúcar, nome vulgar da sacarose refinada, é um “produto químico barato [extraído de um capim] que, travestido de alimento, impregna a alimentação do homem moderno, transformando-a na ração patogênica que empurrou a humanidade para a era das doenças crônicas, metabólicas e degenerativas” (Carvalho, 2006, p. 173). O açúcar do dia a dia é a sacarose, um carboidrato formado por frutose e glicose, sendo, no Brasil, extraído da cana-de-açúcar. Trata-se de uma das principais fontes de energia da dieta, encontrado nos alimentos in natura como frutas, verduras e leite, e em produtos industrializados. Não é um vilão para a saúde, e o impacto de seu consumo depende da quantidade usada nas preparações: em uma dieta balanceada, sem excesso, deixa os alimentos mais saborosos e proporciona uma sensação de prazer e bem-estar. Seu consumo excessivo, porém, estimula o desenvolvimento de doenças como diabetes e cárie, que podem ser contornadas com mudança de hábitos dietéticos e higiene bucal adequada (Torrezan; Neves; Reis, 2017).

Produto químico farto e considerado relativamente de baixo custo, o açúcar é um veneno da alimentação diária e impregna alimentos e “tudo o que entra pela boca do ser humano: comida, bebida, remédio e até fumaça de cigarro e pasta de dente” (Carvalho, 2006, p. 35). Adicionado aos alimentos como agente adoçante e conservante, embora até agências oficiais que regulam os aditivos alimentares assim não o considerem, o açúcar é um aditivo químico que alterou completamente o caráter da alimentação do ser humano e lhe conferiu patogenicidade (Carvalho, 2006) O açúcar pode ser entendido como um agente agressor do organismo e ao enfraquecimento do sistema imune e potencializar o envelhecimento (BRASIL, 2006a). O açúcar também desidrata, elimina minerais e vitaminas ingeridos, acidifica, irrita mucosas do tubo digestivo, desequilibra o sistema glandular endócrino e osmolar e inferniza todo o organismo com o fenômeno da glicação não-enzimática de proteínas (GNP) (Carvalho, 2006 Fialho et al., 2019; Morais; Sperandio; Priore, 2020).

No passado, o consumo de doces, especialmente na infância, estava associado a produtos regionais e fabricação familiar, que vinham carregados de significado cultural. Com a industrialização atual, as crianças dispõem de um universo mais amplo de alimentos doces de acesso fácil, forte apelo visual, mas sem significado cultural. O aumento acentuado no consumo de doces e produtos açucarados (incluindo bebidas) impactou a saúde dos consumidores provocando doenças ligadas a esse consumo alimentar como diabetes e cárie dentária, tornando-se o açúcar o grande vilão da saúde bucal (Fialho et al., 2019) por três fatores: introdução precoce da sacarose na vida do bebê que o condiciona a aceitar alimentos doces, alta frequência de ingestão de alimentos açucarados determinando perda mineral constante e a ocorrência de cárie dentária.

A Resolução da Anvisa nº 12, de 24 de julho de 1978, define açúcar como uma “sacarose obtida da cana (Saccoharum officinarum), ou da beterraba (Beta alba, L.), e, menos frequentemente, de outros vegetais, por processos industriais adequados” (Anvisa, 1978). As diferenças dos açúcares estão, principalmente, no gosto, na cor e em sua composição nutricional; destaca-se que “quanto mais escuro é o açúcar, mais vitaminas e sais minerais ele possui, e mais perto do estado bruto ele está. A cor branca significa que o açúcar recebeu aditivos químicos no último processo da fabricação, o refinamento” (Brasil, 2016, p. 108).

De acordo com sua característica, o açúcar é classificado em (CNNPA, 1978; Machado, 2012): açúcar cristal (mínimo 99,3% de sacarose), açúcar refinado (mínimo de 98,5% de sacarose), açúcar moído (mínimo de 98,0% de sacarose), açúcar demerara (mínimo de 96,0% de sacarose), açúcar mascavo (mínimo de 90,0% de sacarose), açúcar mascavinho (mínimo de 93,0% de sacarose), açúcar-cande (mínimo de 99,0% de sacarose), açúcar glacê ou em pó ou de confeiteiro (mínimo de 99.0% de sacarose, excluído o antiaglutinante), açúcar em cubos ou tabletes (mínimo de 98.0% de sacarose, excluído o aglutinante), açúcar para confeitar e açúcar pulverizado ou em cristais (adicionado de corantes permitidos). O açúcar simples é de rápida absorção e utilização pelo organismo, portanto, de curta duração; são considerados açúcares simples a sacarose (açúcar de cana), a frutose (açúcar da fruta) e a lactose (ou galactose – açúcar do leite): ingeridos provocam um aumento excessivo de açúcar no sangue, seguido de um decréscimo acentuado. Mais recentemente, surgiram os açúcares light e o de coco. Por ser mais amplamente consumido, merece destaque o açúcar refinado, ou conhecido como açúcar branco, a ser produzido livre de fermentações, de matéria terrosa, de parasitos e detritos animais ou vegetais A cor branca resulta da aplicação de aditivos químicos (como enxofre) no último processo da fabricação, o refinamento, que se perdem, porém, algumas vitaminas e sais minerais (Brasil, 2016).

Por serem muito consumidos e mais presentes em pontos de venda do produto (como mercados e postos de conveniência), alguns tipos de açúcares podem assim ser caracterizados (Brasil, 2016): a) açúcar cristal: traz cristais grandes, transparentes, cujo processo de refinamento retira aproximadamente 90% das vitaminas e minerais; b) açúcar demerara: com refinamento leve, sem aditivo químico, apresenta grãos marrom-claros, contém alto valor nutricional à semelhança do açúcar mascavo; a melhor escolha do açúcar demerara é em sua forma orgânica, por manter todos os nutrientes sem a adição de defensivos agrícolas; c) açúcar mascavo: forma mais bruta de extração do açúcar da cana-de-açúcar após o cozimento do caldo de cana; não passa por qualquer tipo de refinamento, apresenta coloração mais escura e sabor mais encorpado, semelhante ao da cana-de-açúcar (lembra rapadura); sem qualquer refinamento, as vitaminas e os minerais como cálcio, ferro, zinco, magnésio e potássio são preservados; d) açúcar de coco: substitui o açúcar de cana; extraído do fluido das flores da palma de coco, não passa por refinamento ou adulteração; é isento de conservantes e possui alta quantidade de potássio, magnésio, zinco, ferro e vitaminas B1, B2, B3 e B6, com baixo índice glicêmico, tem digestão lenta; e) açúcar light, ou açúcar fit, açúcar magro, composto de uma mistura do açúcar refinado comum e adoçantes artificiais (como sucralose, ciclamato de sódio e sacarina sódica); menos calórico que o açúcar comum (menor teor de sacarose), deve ser consumido com cautela; contem menor teor de sacarose em comparação com outros açúcares, não contém nutrientes nem é considerado um alimento saudável, pode ser consumido por indivíduos com diabetes (tipos 1 ou 2) em uma alimentação equilibrada e saudável, observando-se as recomendações do nutricionista ou médico e atentando-se para os sintomas clínicos e exames laboratoriais.

O açúcar é amplamente utilizado para realçar o sabor dos alimentos, mas o uso frequente e sem controle desse componente pode estar associado à origem de sérios problemas de saúde, obesidade e diabetes (Brasil, 2014). Embora o organismo humano necessite de açúcar (a glicose é um de seus componentes), têm-se outras formas mais saudáveis e nutritivas de se consumir glicose que não seja por meio de açúcar comum: os próprios alimentos já contêm doses naturais desse elemento em sua composição, de forma a constituir uma alimentação equilibrada e saudável com dosagem adequada do produto (Torrezan; Neves; Reis, 2017).

Biologicamente, o ser humano é “preparado para preferir o sabor doce. Essa preferência foi importante para a evolução humana, pois favoreceu o aleitamento materno no recém-nascido e o consumo posterior de frutas” (França, 2016, p. 6), enquanto a rejeição ao sabor amargo, normalmente associada à toxicidade, seria um fator de proteção. Com a industrialização ea globalização, porém, a oferta de açúcares livres (especialmente a sacarose) alcançou níveis alarmantemente grandes.

Consumidos na infância, o açúcar ou os produtos açucarados são mais problemáticos porque, em crianças, o “elevado consumo de bebidas adicionadas de açúcar provoca o deslocamento do consumo de outros alimentos, com repercussão importante na qualidade da dieta” e no padrão alimentar do indivíduo por toda a vida (Brasil, 2014, p. 92). Alguns fatores têm influenciado esse consumo, tais como a modernização da agricultura e a industrialização dos alimentos, que impactaram fortemente a composição da dieta que passou a “apresentar baixos teores de fibras, vitaminas e minerais, como magnésio e potássio, ao mesmo tempo em que aumentou o teor de gordura saturada, açúcares simples e sódio” (Brasil, 2016, p. 13). A exposição na mídia e as grandes redes de supermercados também entram como fatores que estimulam esse consumo por facilitar o acesso a alimentos pré-cozidos açucarados e gordurosos. Seria mais interessante estimular o consumo de alimentos in natura em detrimento de alimentos elaborados ou industrializados com adição de açúcar e conservantes em suas composições. Por outro lado, a ingestão excessiva de açúcar em crianças costuma vir associada ao reduzido consumo de cálcio, das vitaminas A e E, de frutas e hortaliças, cereais e tubérculos, grãos, leites e iogurtes, que são elementos importantes na dieta alimentar (Brasil, 2014a, 2016).

No passado, o açúcar já foi considerado um herói. Desde o século XV, era usado na formulação de remédios, especialmente aqueles que se originavam de extratos de plantas e de conservas de frutas. Caparica (2010, p. 62) menciona, como exemplo, a produção, na Ilha da Madeira do século XVI, de casquinhas cristalizadas produzidas com tirinhas de frutas cítricas recobertas por açúcar para combater o escorbuto, uma doença muito presente nas embarcações da época das grandes navegações e descobrimentos marítimos.

A dieta alimentar tem seguido modismos, ou por novos produtos alimentícios geralmente enriquecidos com muita propaganda com o intuito de influenciar gosto e paladar. A consciência popular na atualidade, porém, tem alterado esta influência, e o foco do consumo de alimentos tem-se voltado para a conquista e manutenção da saúde, a despeito do incentivo ao consumo de determinados produtos alimentícios veiculados pelo marketing da indústria alimentar que vê, na criança, um potencial consumidor cada vez mais atento e influente na decisão de compra dos pais. Com base no que veem nos comerciais, ou por influência de amigos, principalmente as crianças são induzidas a crer que os alimentos ultraprocessados (como fast food), muitos deles fortemente açucarados (como chocolates), têm mais qualidade e tornam as pessoas mais felizes, fortes, atraentes e socialmente aceitas (Brasil, 2014b). A indução ao consumo excessivo desse tipo de alimento faz com que especialmente as “crianças comecem cada vez mais cedo um hábito alimentar incorreto, que pode acarretar” doenças e comorbidades” (Ceccatto et al., 2018, p. 143).

Morais e Sperandio (2020, p. 35) registraram um aumento significativo do consumo de alimentos “ultraprocessados [compostos predominantemente de açúcar, óleos, gorduras e sal, antioxidantes, estabilizantes e conservantes], sobretudo, de embutidos, bebidas açucaradas, doces, chocolates, sorvetes e refeições prontas, além da redução do consumo de alimentos in natura ou minimamente processados, como o feijão e o leite” (grifos nossos). Insta ressaltar que o açúcar presente nos alimentos ultraprocessados aparece rotulado como açúcar, açúcar simples, açúcar invertido, sacarose, frutose, glicose, glucose de milho, xarope de malte e de milho, dextrose e/ou maltodextrina; assim, muitas vezes confunde o consumidor que desconhece a real informação nutricional e, sem conhecimento, acaba por consumir o alimento (Brasil, 2014b). Brasil (2016, p. 74) exemplifica os chocolates: o branco é feito basicamente de “manteiga de cacau, leite e açúcar, e não apresenta cacau, sendo este o tipo com maior teor de gordura saturada, açúcar e calorias; o chocolate ao leite tem alto valor calórico, grandes quantidades de gorduras saturadas e açúcar; os chocolates meio amargos e amargos contem menor porção de leite, gordura e açúcar e maior quantidade de cacau, maiores teores de substâncias antioxidantes e menor valor energético, quando comparados ao chocolate ao leite.

O excessivo consumo de açúcar está entre os principais fatores que estimulam o desenvolvimento de doenças (como obesidade e diabetes) que poderiam ser evitadas ou controladas com a simples mudança de hábitos dietéticos. A obesidade é fator de risco à saúde da população para o desenvolvimento de diversas outras doenças ou comorbidades como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, cânceres, entre outras (Almeida; Guerra, 2022). Segundo Ferreira et al. (2021), no Brasil, entre 2013 e 2019, houve tendências temporais de crescimento nas prevalências de obesidade na população brasileira: para os homens e para as mulheres: de 11,8% em 2006 para 20,3% em 2019; na prevalência de excesso de peso, de 42,6 para 55,4%.

Estimativas recentes sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal, em 2023, reportam que a frequência do consumo de refrigerantes (5u mais dias/semana) atingiu 14,9% (16,8% para homens e 13,2% para mulheres), sendo menor entre os indivíduos mais velhos. A presença de diabetes foi de 10,2%, maior entre as mulheres (11,1%) do que entre os homens (9,1%); em ambos os sexos, essa condição aumentou intensamente com a idade e diminuiu com o nível de escolaridade. A ingestão de açúcares tem aumentado, assim como a ingestão total de energia, o que possibilita a redução na ingestão de alimentos contendo calorias mais adequada. Considere-se, ainda, que os padrões de consumo de bebidas açucaradas são particularmente preocupantes, porque promovem ganho de peso (obesidade) pela compensação incompleta de calorias líquidas nas refeições e tendem a aumentar o risco de diabetes, doenças cardíacas crônicas e outras doenças – o que faz acender o sinal de alerta para adoção de medidas urgentes a fim de deter o aumento progressivo dessas doenças (Brasil, 2023).

As mudanças nos padrões alimentares, todavia, parecem acompanhar uma tendência global no sentido de uma alimentação cada vez mais rica em fontes de energia (carboidratos) e calorias, proteínas, vitaminas e sais minerais (cálcio, fósforo, ferro, cloro, potássio, sódio, magnésio), uma vez que os produtos ultraprocessados não substituem alimentos in natura ou minimamente processados como pães e peixes enlatados (Brasil, 2014b). O açúcar não escapa a essas mudanças: seu consumo, considerado um dos maiores riscos à saúde de crianças, jovens e idosos, passa a ser um grande desafio de saúde pública do século atual, como um dos fatores que interferem no balanço energético do metabolismo de uma pessoa, no estilo de vida, estresse, sono, fatores genéticos, disruptores endócrinos e outros. O açúcar está na base de indução da obesidade que, habitualmente, confere à pessoa obesa discriminação e preconceito na vida pessoal e em ambiente de trabalho, favorecendo o aparecimento de transtornos ou distúrbios psicológicos, tais como ansiedade, depressão, transtornos alimentares, baixa autoestima, sentimentos inespecíficos de tensão e imagem corporal distorcida (Almeida; Guerra, 2022; França et al., 2012). Os fatores psicológicos ativam e retroalimentam o comportamento alimentar compulsivo e levam a pessoa a desenvolver sentimentos de autodesprezo, repulsa à forma corporal, preocupação e baixa qualidade de vida.

Como o açúcar é fonte de carboidratos, recomenda-se uma ingestão inferior a 10% do valor energético total (VET), pois tem alta densidade energética e rápida digestão no estômago. É pertinente desestimular o emprego do açúcar em preparações e orientar para o consumo moderado de doces em geral, biscoitos, coberturas de bolos e em bebidas açucaradas como refrigerantes e refrescos artificiais (Brasil, 2014a, p. 92), sendo recomendável consumir sucos naturais sem ou com quantidades mínimas de açúcar (Brasil 2016). A OMS considera como comprovado o efeito nocivo da ingestão elevada do açúcar na dieta, porque aumenta a densidade energética e o balanço energético positivo, reduz os mecanismos de controle do apetite, especialmente no caso de bebidas, e desenvolve possibilidades de cáries dentárias e diabetes (Brasil, 2014a). Em relação às orientações baseadas em evidências, uma das maiores dificuldades do controle da ingestão de açúcar recai na pressão externa promovida pela mídia e pelas grandes empresas alimentícias: “Promover uma alimentação saudável em uma sociedade que tem ampla oferta de produtos prejudiciais com forte apelo comercial é um grande desafio. Sua superação vai exigir de todos […] uma postura crítica e criativa” (França, 2016, p. 7).

Pelas recomendações de Brasil (2016. p. 109), o açúcar deve ser consumido com moderação devido ao seu alto valor calórico, tendo 5 a 10 vezes mais calorias por grama do que a maioria das frutas. Deve ser utilizado na culinária tendo por base alimentos in natura ou minimamente processados, já que, dessa forma, se pode diversificar e produzir uma alimentação mais saborosa, sem torná-la nutricionalmente desbalanceada. Caso sejam usados produtos processados, preferir aqueles com menor processamento, pois preservam melhor suas características e apresentam menores quantidades de aditivos químicos. Para diabéticos, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD, 2019) recomenda evitar açúcares refinados de rápida absorção, visto que elevam rapidamente a glicemia, embora a sacarose não aumente mais a glicemia do que outros carboidratos, caso seja ingerida na mesma quantidade. Uma dieta saudável, com glicemia controlada, não deve ultrapassar 10% das calorias ingeridas durante o dia. Uma das formas para diminuir a carga glicêmica é reduzir o consumo de carboidratos e associar seu consumo com a ingestão de alimentos fontes de fibras, proteínas ou gorduras de boa qualidade.

Para Lima (2015, p. 76), o trabalho do psicólogo diante de um portador de diabete consiste em manter uma boa relação médico-paciente. É normal a ocorrência de angústia e desespero diante do pouco controle de sua vida e de seus familiares, que tendem a enfrentar momentos de incerteza e descrença, entremeados por aceitação, perseverança, otimismo e esperança, que envolvem aspectos emocionais, afetivos, psicológicos, sociais, culturais e espirituais. O atendimento psicológico é prestado tanto ao doente quanto à sua família, com acompanhamento desde o diagnóstico e durante o tratamento, provendo assistência e suporte na evolução da doença, uma vez que é comum a presença de instabilidade emocional vivida pelo paciente com reflexos na família. O acompanhamento psicológico permitirá identificar e tratar a ansiedade, depressão, desajustes sociais, isolamento social e outros transtornos apresentados por alguns pacientes no curso do tratamento” do diabete.

Morais, Sperandio e Priore (2020, p. 41) advertem que, nos últimos anos tem aumentado o “consumo de alimentos ultraprocessados compostos predominantemente de açúcar, óleos, gorduras e sal, além de antioxidantes, estabilizantes e conservantes”, o que preocupa os defensores da alimentação saudável devido aos comprovados riscos que esses produtos trazem à saúde da população.

Neste sentido, o Brasil tem-se empenhado em deter o avanço do diabete por meio da conscientização de boas práticas alimentares, como redução e controle do consumo de bebidas açucaradas, diminuição do consumo de alimentos ultraprocessados, aumento do consumo de frutas e hortaliças e estímulo à prática de atividade física. Para realizar esse compromisso, o país tem-se dedicado a mudar suas políticas de alimentação adotando estratégias como: solicitar a adição de micronutrientes aos alimentos industrializados, taxar impostos sobre bebidas açucaradas, biscoitos recheados e outros alimentos ultraprocessados, exigir a colocação de rótulos advertindo sobre os efeitos nocivos do açúcar à saúde e restringir a publicidade a alimentos não saudáveis, em especial aqueles produzidos à base de açúcares (Ferreira et al., 2021).

A OMS sugere a formulação periódica de diretrizes nacionais sobre alimentação e nutrição, considerando possíveis mudanças nos hábitos alimentares e nas condições de saúde da população e o progresso no conhecimento científico da área. Propõe que tais diretrizes apoiem a educação alimentar e nutricional e subsidiem políticas e programas nacionais de alimentação e nutrição, gerando mudanças no padrão alimentar quanto ao consumo de preparações culinárias e à aquisição de produtos ultraprocessados e, em particular, bebidas açucaradas, doces, chocolates, sorvetes e refeições prontas; incentiva o aumento do consumo de alimentos in natura, como folhas, frutos, ovos, leite e feijão, ou minimamente processados nas preparações culinárias, como conservas de legumes, frutas em calda, queijos e pães feitos com farinha de trigo, água e sal (Martins et al., 2013).

Como o emprego excessivo de açúcar na composição alimentar pode ensejar o desenvolvimento de transtornos psicológicos, o indivíduo pode registrar comportamentos disfuncionais relacionados à alimentação, que prejudicam a saúde física e o funcionamento psicossocial. Diante de transtornos psicológicos, ao psicólogo cabe o papel de implementar técnicas que promovam adesão ao tratamento adequado prescrito pela equipe multidisciplinar que atende o paciente. É seu papel buscar proporcionar a melhora do distúrbio de imagem corporal, ensinar o controle dos episódios de compulsão alimentar e métodos compensatórios: incentivar aumento da autoestima, de forma a ampliar e melhorar suas relações interpessoais, lidar com emoções intensas e auxiliar a modificar o sistema de crenças associadas ao desenvolvimento e manutenção dos quadros clínicos adversos (Duchesne; Campos; Pereira, 2019).

Os transtornos mentais são marcados pela insônia, irritabilidade, fadiga, queixas somáticas (cefaleia), falta de apetite ou (contraditoriamente) compulsão alimentar, tremores, má digestão, dentre outros, e trazem impactos negativos nos relacionamento e na qualidade de vida (Sousa et al., 2021). Em geral, uma dieta desbalanceada, por foça de sugestões externas (mídia, exposição pontos de venda etc.), ou pelo consumo habitual, contempla refeições ricas em energia, açúcares de adição (e sódio), acrescidas de lanches contendo produtos ultraprocessados como fast foods, bolos, tortas e bebidas açucaradas, enquanto relega a ingestão de frutas e legumes in natura ou minimamente processados. Nesta circunstância, o psicólogo atua para estimular a redução da ingestão de açúcares, principalmente os livres – atitude que favorece a saúde dentária, a autoestima, reduz a ocorrência do diabete outras doenças, bem como protege contra a ansiedade, depressão, distorção da imagem corporal e outros distúrbios. A atuação do psicólogo se reveste de capital importância no apoio e orientação à família, em especial às crianças (o que pode ser feito pela equipe que atua na Estratégia Saúde da Família – ESF, escolas e creches), de forma a se adaptarem aos rituais alimentares funcionais e não se envolveram em dinâmicas que oportunizam transtornos (Jasmim; Queluci, 2018). Se a dieta alimentar se compuser de baixos teores de fibras, vitaminas e minerais, como magnésio e potássio, e, simultaneamente, aumentado o teor de gordura saturada, açúcares simples e sódio, é interessante que se estimule o consumo de alimentos in natura em detrimento do uso de uma dieta pobre de nutrientes (Brasil, 2016).

Brasil (2014b, p. 22) destaca, porém, que aos consumidores deve ser assegurada “autonomia para fazer melhores escolhas para sua vida, reflitam sobre as situações cotidianas, busquem mudanças em si próprios e no ambiente onde vivem, contribuam para a garantia da segurança alimentar e nutricional para todos e exijam o cumprimento do direito humano à alimentação adequada e saudável”. Carvalho (2006, p. 173) lembra, porém, que, se a “a humanidade quiser se livrar das vergonhosas epidemias de cárie dentária, obesidade, hipertensão, diabetes etc., terá que deter o avanço da ditadura do açúcar e jogar no lixo esse corpo estranho, doce e nocivo. Com açucareiro e tudo!”

REFERÊNCIAS
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* Nota: Originalmente, este artigo foi produzido para desvelar os malefícios que o consumo excessivo de açúcar, não controlado, produz ao organismo humano. Posterior e adicionalmente, o artigo buscou lembrar o dia 14 de novembro como o Dia Mundial do Combate a Diabetes.

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