domingo, 10 de novembro de 2024
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Acessibilidade para eleitores com deficiência é desafio

Desde os nove meses, após ter poliomielite, o paratleta da seleção de basquetebol em cadeira de rodas Glebe Cândido Alves da Silva, 40, tem a perna direita e parte da…

Desde os nove meses, após ter poliomielite, o paratleta da seleção de basquetebol em cadeira de rodas Glebe Cândido Alves da Silva, 40, tem a perna direita e parte da esquerda paralisadas.

Ele faz parte dos 940.630 mil eleitores com deficiência que vão às urnas neste domingo (7). Mais de um terço deles também tem deficiência de locomoção.

No dia a dia, diante de calçadas esburacadas, com obstáculos e postes, Glebe se locomove com muletas, mas para votar, vai de cadeira de rodas, porque percebe que assim é mais respeitado nos espaços públicos, especialmente no transporte.

Nascido em Recife, ele se mudou para São Paulo há seis anos e atualmente vive em Osasco, na região metropolitana. Se na terra natal ele votava em um clube acessível, em São Paulo, diz que ainda não achou um local ideal.

Por duas eleições, votava numa escola com escadas, em que cadeirantes eram carregados até a seção de votação. Neste ano, transferiu o título e vai votar numa escola mais próxima. Conta que está apreensivo, porque, embora tenha declarado ao cartório que é deficiente, não sabe como são as condições do novo local.

“O ambiente ideal tem que ser adaptado para ir e voltar sem nenhuma dificuldade. Não adianta nada fazer uma rampa que parece subir para o céu”, afirma.

Colega de seleção e também de Pernambuco, o paratleta Luciano Felipe da Silva, 39, se locomove com o auxílio de próteses depois de amputar parte das pernas devido a um câncer, diagnosticado quando tinha 19 anos. Desde então, passou a notar os obstáculos no caminho de idosos e cadeirantes.

“Quando você começa a fazer parte, vai vendo que é necessário ter políticas públicas que venham a beneficiar tanto as pessoas mais idosas, quanto o cadeirante em si”, conta.

Em São Paulo desde 2006, ele votará pela primeira vez na cidade, após transferir o título da terra natal, Cabo de Santo Agostinho. Nas vezes em que justificou o voto, o paratleta também se deparou com cadeirantes carregados para chegar à seção.

O aposentado Naziberto Lopes Oliveira,53, também se tornou sensível ao tema ao perder totalmente a visão nos anos 80, num acidente de carro.

Ele trabalhava como analista de sistemas e precisou de terapia para lidar a realidade que “o fez entrar em parafuso”. Conseguiu se aposentar por invalidez e quando decidiu retomar os estudos, nos anos 2000, se deparou com a falta de livros com áudio para deficientes visuais. No caso dele e de pessoas que perdem a visão com mais idade, o braile não é simples de aprender, explica.

Naziberto diz que sabe grosseiramente o idioma, o suficiente para identificar palavras, números e votar no dia das eleições. Para ele, o fato do teclado da urna eletrônica ser universal, com uma marcação na tecla 5, e com sistema de voz ajudam o eleitor que não sabe ler em braile. Fones de ouvido garantem o sigilo do voto.

Antes dos aprimoramentos, que vieram em 2002, nas primeiras vezes em que votou levava uma pessoa de confiança até a urna com ele para confirmar o voto.

Naziberto reclama apenas da falta a leitura do nome e partido do candidato que aparece na urna e da acessibilidade para chegar ao local de votação. “70% já chegamos. Agora falta 30% pra chegar lá”, afirma.

Para buscar um cenário de acessibilidade ideal, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) instituiu em 2012 o Programa de Acessibilidade da Justiça Eleitoral, que estabelece diretrizes gerais para que os 27 tribunais regionais orientem seus juízes a promover a remoção as barreiras físicas e de comunicação que existem nas mais de 454 mil seções eleitorais principais no país.

Presidente da Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão (CPAI), o juiz auxiliar do TSE Fernando Mello afirma que garantir a acessibilidade é mais fácil em estados menores e no Distrito Federal, enquanto na região norte, o grande desnível territorial dificulta até mesmo o transporte das urnas às zonas eleitorais.

Cada Tribunal Regional Eleitoral tem autonomia orçamentária e de planejamento para buscar a inclusão dos eleitores. Nessas eleições, haverá cerca de 46 mil seções adaptadas no país, cerca de 10% do total.

Em São Paulo, a assessora de planejamento estratégico e de eleições Regina Rufino diz que o primeiro esforço para garantir a inclusão no estado data de 1992, com a criação de seções especiais para os eleitores com deficiência. A partir de 2009, o TRE-SP passou a atuar para que todas as seções fossem adaptadas.

Nos anos sem eleições, o tribunal vistoria os locais de votação e aciona os governos sobre as adequações necessárias nos prédios, que devem ser concluídas até abril do ano eleitoral. Das mais de 90 mil sessões no estado, pouco mais de 12 mil estão adaptadas, o que corresponde a 12%. O estado com o maior percentual é Sergipe, com 39% das seções adaptadas.

“É um processo lento na remoção da barreira física, porque depende de licitação. No passado não havia uma legislação sobre isso, então temos escolas com escadarias. Em todo o estado há prédios tombados”, afirma.

Como não há adaptação em todos os locais, a Justiça Eleitoral permitiu ao eleitor com deficiência ou mobilidade reduzida solicitar transferência para outro local de votação até 23 de agosto. A medida, porém, ainda é desconhecida do eleitorado. No estado, apenas898 pessoas fizeram o pedido para o primeiro turno.

Além da remoção de barreiras físicas, o tribunal iniciou em 2010 um projeto de libras para auxiliar na comunicação com deficientes auditivos. Neste ano, haverá 563 tradutores de libras atuando nos municípios paulistas, além de 10 mil coordenadores de acessibilidade, um para cada local de votação, identificados com camiseta.

A equipe que atuará no atendimento aos eleitores recebe treinamento entre agosto e setembro. Foi nessa etapa que o cartório de Perus, na região noroeste de São Paulo, descobriu que entre os eleitores convocados para ser mesário havia um deficiente.

Steve Camilo Gomes de Azevedo, 26, é surdo e mudo desde que nasceu. A mãe dele, Francisca Rejane Gomes, 49, suspeita que pegou rubéola durante a gestação, mas não foi diagnosticada, porque, com duas crianças pequenas na época, ela não pode fazer o acompanhamento pré-natal.

Por meio de Libras (Língua Brasileira de Sinais), traduzida pela mãe, Steve conta que ficou surpreso quando recebeu a convocação, mas se recusou a desistir. “Por que não poderia?”, questionou, conta a mãe. Com o apoio da equipe do cartório, que simulou uma sessão de votação, Steve conta que superou o nervosismo inicial e percebeu que era capaz de desempenhar as tarefa de 2º mesário e secretário.

“É um desafio para quebrar o preconceito das pessoas. Ele é muito carismático e consegue se fazer entender”, conta a chefe de cartório Cintia Hiromi Nakasa.

No domingo, Steve terá o apoio de uma tradutora de libras para se comunicar na sessão de votação. Ele votou sem dificuldade apenas uma vez na Paraíba e neste ano transferiu o título para participar novamente.

Trabalhando num mercado e com o sonho de cursar turismo, Steve sinalizada com o rosto e as mãos que nunca imaginou que exerceria uma função durante as eleições. A notícia, que foi recebida com estranhamento pelos amigos com a mesma deficiência, se tornou motivação para atuar em eleições futuras.

O TRE-SP informa que além de Steve, nos municípios de Osasco e Tupã também haverá mesários com deficiência auditiva atuando nessas eleições.

ELEITORES COM DEFICIÊNCIA

940.630 mil eleitores com deficiência no Brasil, o que representa 0,6% do eleitorado

> 32% têm deficiência de locomoção, 12% deficiência visual, 6% deficiência auditiva, 5% dificuldade para o exercício do voto

> 44% têm outros tipos de deficiência

Estrutura para as eleições

> 2.645 zonas eleitorais em 5.570 municípios

> 454.499 seções eleitorais principais

>>46.130 seções eleitorais adaptadas

Acessibilidade no estado de São Paulo

> 12.115 seções adaptadas

> 563 colaboradores com conhecimento em Libras

> 10.535 coordenadores de Acessibilidade (1 em cada local de votação)

Quais são as orientações para o dia da votação?

> As informações sobre deficiência devem ser transmitidas ao cartório eleitoral, que indica uma seção adaptada para o voto. Eleitores com deficiência ou mobilidade reduzida puderam solicitar transferência para outro local de votação até 23 de março

> Caso não haja acessibilidade para chegar à seção eleitoral, o eleitor pode pedir ajuda para a equipe de apoio no local

> Em caso de ofensas ou problemas para votar, o eleitor pode entrar em contato com a ouvidoria do respectivo TRE. Com informações da Folhapress.

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