domingo, 10 de novembro de 2024
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Seca histórica pode fazer preço do azeite subir ainda mais

A agricultora Francisco Elvira abre caminho pelo seu olival queimado, parando para ver os frutos atrofiados nas árvores praticamente secas. “Olhe para eles”, diz, desesperado. “Eles devem estar com azeitonas…

A agricultora Francisco Elvira abre caminho pelo seu olival queimado, parando para ver os frutos atrofiados nas árvores praticamente secas.

“Olhe para eles”, diz, desesperado. “Eles devem estar com azeitonas agora, perto da colheita. Mas estão vazias. E esta é a colheita para o azeite que vai chegar aos supermercados no próximo ano.”

As planícies férteis cheias de oliveiras que se estendem pelo sul da Espanha fizeram deste país o maior produtor mundial de azeite, respondendo por cerca de metade da produção global.

Mas, devastado pela seca já registrada na Europa, o chamado “ouro verde” da Espanha está se tornando mais raro. O rendimento deste ano já caiu cerca de um terço — e ainda não há sinal de chuvas que poderiam melhorar a situação.

Na fábrica da Interóleo em Jaén, província responsável por produzir metade de todo o azeite espanhol, bombas despejam o óleo em garrafas de vidro e plástico, que passam pela esteira para serem rotuladas como “produto da Espanha”.

Mas a fábrica, que exporta para países como o Reino Unido, está vendo a produção despencar e os preços dispararem, exacerbando a crise global de escassez e inflação do ramo de alimentos.

“Os consumidores já estão pagando um terço mais do que no ano passado, mas a seca vai aumentar o valor ainda mais”, diz Juan Gadeo, chefe da cooperativa, que acredita que este setor vital para a Espanha está em perigo.

“Com a crise, talvez tenhamos que demitir alguns trabalhadores. Há um sentimento de depressão e incerteza. Mais um ano como este seria uma catástrofe completa”, afirma.

Crise mais ampla
A situação do azeite espanhol é parte de um quadro que se repete em todo o setor agrícola. Pesquisas recentes apontaram que algumas partes da Península Ibérica enfrentam sua pior seca nos últimos 1.200 anos.

Agricultores do país estão plantando mais girassóis desde o início do ano, na tentativa de compensar a perda de óleo de girassol da Ucrânia — o maior produtor mundial, onde a guerra levou a uma queda drástica na produção.

Mas uma flor que precisa do sol também também necessita da chuva — e não há chuva na região, levando a uma colheita de plantas murchas que não produzem sementes nem óleo.

Enquanto arranca os girassóis mortos da sua plantação, Isabel Villegas diz estar refletindo se deve plantar novamente para a próxima safra.

“Se não chover até o final do ano, não faz sentido plantar mais”, diz. “Isso seria como jogar dinheiro fora. E não há previsão de chuva por enquanto.”

Um relatório recente do Observatório Global da Seca concluiu que a Europa está sofrendo sua pior seca em 500 anos.

Vários países do continente estão lutando contra incêndios florestais e ondas de calor — a Espanha é um dos mais atingidos.

Mais de 270 mil hectares foram queimados neste ano, de acordo com o Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais.

O calor extremo e a falta de chuvas levaram a uma queda dramática nos níveis das reservas naturais de água da Espanha. O reservatório de Vinuela, perto de Málaga, está com pouco mais de 10% de sua capacidade de armazenamento.

Em outros lugares, estruturas de aldeias da Idade Média construídas à beira-mar, há muito cobertas por rios, ficaram expostas à medida que os níveis da água caíram.

O governo da Espanha está agora expandindo e construindo usinas de dessalinização da água do mar, aproveitando o oceano para aliviar a escassez do recurso.

Fim do jardim da Europa?
Em Campo de Dalias, ao lado da cidade costeira de Almería, a reportagem da BBC News visitou uma instalação onde a água do mar é bombeada.

O sal de metade do volume é extraído para produzir água potável, enquanto a outra metade absorve o sal adicional e é então desviada para o oceano — o objetivo é não causar danos ambientais.

A usina produz 90 mil metros cúbicos de água potável por dia, mas recentemente foi obrigada a aumentar a produção para cerca de 130 mil metros cúbicos nos próximos quatro anos.

Ao redor da instalação, os campos estão cheios de folhas de plástico, atuando como estufas para as frutas e vegetais que crescem abaixo.

Metade da água produzida na usina de dessalinização é usada para regar as plantações. A Espanha produz mais frutas e legumes do que qualquer outro país da União Europeia.

Segundo alguns cientistas, isso é parte do problema: em uma era de escassez aguda de água, a Espanha simplesmente não pode mais ser “o jardim da Europa”, como é frequentemente chamada.

“A área total de terras irrigadas na Espanha vem aumentando nas últimas décadas, tanto legal quanto ilegalmente”, diz Julia Martinez, da New Water Culture Foundation.

Ela acredita que o atual modelo de gestão da água do país é insustentável.

“A terra irrigada consome 85% de todos os recursos hídricos. Com os 15% restantes, não é possível atender a todas as demandas de água, algumas das quais têm prioridades mais altas. A menos que mudemos esse equilíbrio, não vamos melhorar o estado de nossos rios ou nos adaptar às mudanças climáticas”, diz Martinez.

Solo rachado, rios secos, prejuízo nas colheitas: a terra fértil da Espanha está ficando empobrecida por uma emergência climática provocada pelo homem. O custo disso é cada vez mais alto.

E ainda não há previsão de chuva para as belas e secas planícies da Andaluzia.

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