sexta-feira, 20 de setembro de 2024
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Almas Penadas

Faziam parte do imaginário popular, de nossos pesadelos, e das conversas com amigos e familiares nas noites frias, à volta de fogões de lenha.Era comum, quando passávamos à noite perto…

Faziam parte do imaginário popular, de nossos pesadelos, e das conversas com amigos e familiares nas noites frias, à volta de fogões de lenha.Era comum, quando passávamos à noite perto de cemitério ou de casarões vazios, logo o medo nos assaltava, aumentando nossos passos e palpitações.

Tais almas seriam de “mortos” que, sofredores pelo peso de seus pecados e/ou culpas, vagavam no Além, com eventuais aparições entre nós, os “vivos”,assombrando-nos…-Vade retro, satana!

Meu avô José era mestre em contar “causos” desse tipo. Ele era também criador de pássaros de raça: bicudo, curió, pintassilgo, patativa,canarinho etc.Alguns estão extintos por aqui, e a maioria quase desapareceu de nossos campos. Há alguns anos, por um aparente milagre, uns poucos começaram a ressurgir, só que nas cidades! Na verdade,esta “urbanização” das aves não foi por um “milagre”, e sim devido às “milagre”ssões que sofreram pela mutilação irracional de seu“Habitat”.

É sabido que a Natureza demorou alguns bilhões de anos para gerar e manter a Vida em sua plenitude e diversidade. Absurdamente, poucas décadas bastaram para que os únicos “almados” dos filhos da Mãe-Terra causassem o seu desequilíbrio, com a inconsequente tortura e mortandade dos supostos “desalmados”!

Vi um canarinho, tempos atrás, trinando no centro de Fernandópolis e, para minha tristeza, notei que ele estava tentando fazer um ninho em um semáforo!
Como ele, anuns preto e o branco( vulgo “ribita-rabo”), pombas-do-ar, o pica-pau chanchã, maritacas, papagaios e até araras, dentre outros, vivem ou tentam viver agora na selva de pedra, concreto e asfalto, pois dilapidaram seu Paraíso.

Contrariamente às atemorizantes Almas Penadas, que pagam por seus pecados e crimes,estas inocentes criaturas canoras, sem saber por que e por qual crime e justiça foram apenadas, perderam seu Éden silvestre e pagam duras penas apenas pela sua pureza e fragilidade, forçadas aperambular pelo purgatório urbano, à cata de migalhas e abrigo.

Será mesmo que as aves têm alma? As religiões divergem sobre isto. Só que, sem dúvida, uma coisa é certa: tem muito humano que não a possui, pois não têm pena delas.

Há um outro detalhe preocupante: era tradição entre os romanos o “avis spicium”, ou seja, através da observação e interpretação do canto e dos vôos de algumas aves eles faziam a predição de bons ou maus acontecimentos, bons ou maus agouros.

Será que estas avezinhas dos campos, hoje exiladas nos semáforos e telhados, pois roubaram seu Paraíso, não vieram nos avisar que logo logo perderemos o nosso também?

Jesiel Bruzadelli Macedo
jesielbruzadelli@gmail.com

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